São Paulo, terça-feira, 23 de maio de 2000


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JANIO DE FREITAS

Muito além do batismo

Muita coisa é republicação, alguma coisa é nova, mas dois aspectos precisam ficar claros ou, do contrário, resultarão conclusões equivocadas da massa de reportagens que vários jornais estão publicando a propósito da Operação Condor, na qual se coordenaram os serviços militares de repressão política do Brasil, Chile, Argentina, Uruguai, Paraguai e Bolívia.
A data em que o nome Operação Condor começa a ser usado é imprecisa, sendo aceito que isso ocorreu nos primeiros anos de 70, quando foi organizada a conspiração para a derrubada do presidente chileno Salvador Allende. Qualquer que seja a data, porém, é certo que foi apenas um batismo, provavelmente necessário aos planos dos altos comandos.
Os serviços militares de repressão já estavam interligados, na prática, desde muito antes. Os exilados brasileiros no Uruguai, na Argentina e no Chile foram objeto de vigilância e infiltração, tão logo lá chegaram, orientadas pelos serviços militares dos respectivos países, em trabalho conjunto com agentes e embaixadas do Brasil. E, claro, com a CIA, como tão bem relata o ex-agente americano Phillipe Agee em "Inside the CIA".
Estão documentados casos de brasileiros sequestrados e presos no Uruguai, em 69/70, e entregues ao Exército brasileiro, sem que ao menos fossem exilados. Quando envolvidas, as polícias locais estiveram sempre agindo como auxiliares (os que se expunham a possíveis riscos) dos serviços militares de repressão. Foi assim também o Brasil.
O nome Operação Condor caiu em desuso, provavelmente por ter chegado a conhecimento público, mas a interligação por ele batizada não cessou jamais. A queda das ditaduras nos países da operação não mudou, nos militares, a visão de segurança como um conceito ideológico - não só capitalista, mas também conservador. A doutrina militar elaborada para a América Latina não sofreu alteração essencial, razão bastante para que também seus mecanismos não se alterassem.
O retorno do SNI, sob o nome de Abin, e outros serviços de espionagem interna e repressão que o governo está implantando, como ainda os que está discutindo, são todos instrumentos da doutrina de segurança nacional, que deixou de ser citada, mas não de ser exercitada. Nem aqui nem nos outros da Operação Condor, que de efêmero teve só o nome.


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