São Paulo, domingo, 23 de setembro de 2007 |
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Invasão da PUC marcou a redemocratização
Há 30 anos, investida da Polícia Militar foi a última grande operação do regime militar contra o movimento estudantil
JOSÉ ALBERTO BOMBIG DA REPORTAGEM LOCAL Transcorridos 30 anos da invasão da PUC de São Paulo pela polícia, pesquisadores e personagens presentes na universidade na noite de 22 de setembro de 1977 consideram o confronto dos estudantes com as forças do regime militar (1964-1985) um marco no processo de redemocratização do país. A direção da Pontifícia Universidade Católica endossa a posição. Na semana passada, organizou exposições e debates para marcar a data. O próprio comandante da operação policial, o coronel reformado do Exército Erasmo Dias, diz que a invasão se converteu em bandeira do movimento estudantil e da sociedade contra o regime. "Eles [os estudantes] queriam transformar a reorganização da UNE [União Nacional dos Estudantes] em notícia. Conseguiram na PUC", diz. A investida da PM foi a última grande operação da ditadura militar contra o movimento estudantil -que tinha sido praticamente desmantelado em 1968, com a prisão de seus principais dirigentes no 30º Congresso da UNE, em Ibiúna (SP). Em 1974, o governo liquida os últimos focos de luta armada e o presidente Ernesto Geisel inicia a distensão. Desaparecem os grupos de esquerda que condenavam a opção por uma oposição institucional ao regime. Entidades da sociedade civil criticam a ditadura, e surgem movimentos em defesa da anistia e contra a carestia. A mobilização da sociedade civil ganha corpo com a reorganização do movimento estudantil, com a criação do DCE Livre da USP em 1976 e a reconstituição da UEE em 1977. Em 30 de março daquele ano, 5.000 estudantes da USP fazem uma marcha até o Largo de Pinheiros. Em maio, 10 mil caminham do Largo São Francisco até o Viaduto do Chá. Com o avanço das manifestações, o governo decide intervir: invade a Faculdade de Direito da USP em junho e, em seguida, a PUC. A invasão Por volta das 21h50 daquele dia, cerca de 2.000 estudantes participavam de um ato público em frente ao Tuca, o teatro da universidade, quando foram interrompidos por 3.000 policiais, militares e civis, apoiados por carros blindados. A tropa lançou bombas e investiu com violência contra os estudantes, que tentaram se refugiar dentro da universidade. Os policiais arrombaram as portas das salas, prendendo e espancando professores, funcionários e alunos. Seis estudantes sofreram queimaduras. "Há 30 anos testemunhei os atos de selvageria da invasão, com agressões físicas, gritarias de "abaixo os comunistas", xingamentos, prisões e bombas de gás. Apresentei-me como diretor da Faculdade de Ciências Sociais e recebi tapa na cara, chutes. Minha faculdade foi invadida, arquivos jogados para o ar, pichação das paredes com a sigla CCC [comando de caça aos comunistas]. Fui também preso e depois liberado", relata o professor Paulo Resende, 74. "As cicatrizes não deixam a gente se esquecer. Eu só lembro que caí descendo uma rampa. Imediatamente, o joelho esquerdo queimou, como se eu tivesse sobre o fogo. Acho que era uma bomba. No hospital, vi que tinha queimado até chegar no osso", conta Iria Visoná, 53, à época estudante da USP. Nos anos 90, ela e outras estudantes que sofreram queimaduras foram indenizadas após uma longa batalha jurídica. A ação policial resultou na detenção de 854 pessoas, levadas ao Batalhão Tobias de Aguiar, das quais 92 foram fichadas no Deops (Departamento de Ordem Política e Social) e 42 acabaram sendo processadas com base na Lei de Segurança Nacional, acusadas de subversão. "Era um ato para comemorar o Encontro Nacional do Estudantes, que havíamos conseguido realizar naquele mesmo dia na PUC", lembra o professor Valdir Mengardo, 57. Espécie de guardião da memória da invasão, o professor do departamento de teologia Jorge Claudio Ribeiro, autor do filme "Não Se Cala a Consciência de um Povo" sobre o episódio, aponta a importância que ele ganharia na luta pela redemocratização do país: "Naquele momento, a PUC estava na dianteira da luta pelo fim da ditadura, com dom Paulo Evaristo Arns [cardeal-arcebispo de São Paulo] participando ativamente dos movimentos pelos direitos humanos. Foi um ato que chocou a sociedade", diz. A violência da operação inibiu outras do mesmo gênero -tanto assim que, em maio de 1979, dez mil estudantes participaram em Salvador do Congresso de Reconstrução da UNE, sem represália da PM. O então governador Antonio Carlos Magalhães, da Arena, cedeu o Centro de Convenções para realizar o evento. Colaborou a Redação Texto Anterior: Frase Próximo Texto: Entrevista: "Não faria nada diferente", diz Erasmo Dias Índice |
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