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JANIO DE FREITAS
Atos sem omissão
Se o Congresso não aprovou a fidelidade partidária, não foi pelo simples ato de omissão, mas por vontade explícita
EM MEIO À VASTA confusão em
que os políticos caíram, a propósito das imprecisas e incompletas decisões judiciais que tomam ou tomariam os mandatos de
quem mudou de partido, consolida-se uma explicação embaraçosa para
essa novidade: ao estabelecerem a
fidelidade partidária, o Tribunal Superior Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal assumiram, legislando, a
função do Legislativo, mas o fizeram
por omissão do Congresso que jamais providenciou aquela medida.
Se os magistrados legislaram ou,
como entendem, interpretaram textos legais ou suas entrelinhas, é tema de polêmica, ao que se pode supor, sem solução satisfatória, porque a decisão caberia aos magistrados que integram uma das partes em
divergência. Já o argumento de
omissão do Congresso cai em plano
menos subjetivo e mais factual.
Omissão por quê? Desde o fim da
ditadura, e, portanto, antes mesmo
da Constituinte, a Câmara, o Senado
e, quando juntos, o Congresso puderam adotar todas as medidas que a
maioria dos seus parlamentares, no
número exigido para cada caso, quis
ver adotadas como lei. As que não foram propostas ou, se propostas, não
foram aprovadas, em todos os casos
refletiram mais do que uma vontade
da maioria de parlamentares: refletiram a finalidade para a qual existem a Câmara, o Senado e, sua soma,
o Congresso. Se o cumprimento dessa finalidade corresponde ou não às
aspirações majoritárias na população, é outro problema. O qual não é
só da fidelidade, ou não, da maioria
congressista aos desejos da maioria
do eleitorado, mas do sistema estrutural de sociedade e de poder, artífice do Brasil que aí está.
Dizia na semana passada o presidente do TSE, ministro Marco Aurélio Mello, que os políticos "deveriam ter feito isso" [a aprovação da
fidelidade partidária] já de início,
quando da promulgação da Constituição de 1988". Se não o fizeram nos
19 anos desde então, com toda a certeza não foi pelo simples ato de
omissão, mas por ato de vontade explícita, foi porque serem contra a fidelidade partidária. O que não é um
escamoteio, não é inércia ou fuga,
não é omissão: é atitude.
O mesmo se pode dizer de presidentes. Sarney deixou o assunto
com a Constituinte, como convinha,
e as dificuldades da presidência improvisada de Itamar não lhe facilitavam mais do que fez, nisso incluído o
Real. Mas Collor, que pôde até tomar o dinheiro alheio; Fernando
Henrique, que pôde até prorrogar-se na Presidência, tiveram como Lula plenas condições de propor ao
Congresso um projeto de reforma
política, ou ao menos algumas reformas políticas, e não quiseram fazê-lo. Favoráveis, os três, na discurseira
e contrários na prática, até para o
simples incentivo.
A crítica do ministro Marco Aurélio Mello aos constituintes, extensiva aos congressistas de 88 para cá,
tem ainda outro sentido: reconhece
que os constituintes e congressistas
não se dispuseram a incluir a fidelidade partidária na Constituição
nem legislação. E, no entanto, encontrada nas interpretações da
Constituição e da legislação feitas
pelo TSE e o STF. O ministro fortaleceu os que criticam os dois tribunais por legislar, como cabe ao Legislativo.
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