São Paulo, quarta-feira, 24 de março de 2004

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SOMBRA NO PLANALTO

Chefe da Casa Civil critica PSDB, desafia Ministério Público e causa efeito bumerangue

Dirceu faz ataques, provoca nova crise e pede desculpas

RAQUEL ULHÔA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Com novos ataques a senadores e governadores tucanos e ameaça de "acerto de contas" com o Ministério Público, o ministro José Dirceu (Casa Civil) provocou um efeito bumerangue, atraindo contra si uma saraivada de críticas.
Foi alvo de algumas das mais contundentes investidas da oposição desde o estouro do caso Waldomiro Diniz, no dia 13 de fevereiro, provocou nota de repúdio de procuradores e promotores e levou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva a repreendê-lo. À noite, em nota, o ministro pediu desculpas apenas aos governadores.
Tudo começou com declarações de Dirceu publicadas ontem no jornal "O Globo", nas quais criticou duramente o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), que em discurso na semana passada defendeu o ministro Antonio Palocci (Fazenda) e a condução da economia. Para Dirceu, no entanto, Tasso tentou desestabilizar o governo. De acordo com o ministro, no discurso, o tucano insinuou que a gestão do PT tem relações com o crime organizado.
O senador reagiu, dizendo que Dirceu aparenta "confusão mental", "falta de controle" e "total falta de serenidade". Recomendou autocrítica, humildade e férias. Jefferson Péres (PDT-AM) defendeu a sua demissão.
Da tribuna, o líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM), acusou o ministro de envolvimento direto no escândalo Waldomiro. Ex-assessor de Dirceu na Casa Civil, Waldomiro foi filmado pedindo propina ao empresário do jogo Carlos Cachoeira em 2002. Na época, presidia a Loterj (Loteria do Estado do Rio de Janeiro) no governo Benedita da Silva (PT). O caso é investigado pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal.
"Vamos acabar com a hipocrisia. Não há um caso Waldomiro. Ninguém faz aquilo tudo sozinho. Há, quem sabe, um caso José Dirceu, e é disso que ele tem medo. [...] O nome de uma CPI teria de ser outro. O nome do escândalo teria de ser outro", disse Virgílio.
"Não importa se cometeu dolo. Quando erra, tem de se afastar do cargo. Plantou um delinqüente, um escroque, a 20 metros do gabinete do presidente", disse Péres.
Segundo o texto publicado ontem em "O Globo", Dirceu avaliou que Tasso foi "fraco" por apoiar uma CPI sobre o caso Waldomiro e que Virgílio é "irresponsável". O PSDB divulgou nota ontem à noite criticando Dirceu.
Tasso disse ter ficado ""preocupado com o estado psicológico" de Dirceu, que teria demonstrado estar "fora de controle" em razão da pressão sofrida nas últimas semanas pelo caso Waldomiro.
Para o senador, a declaração "mais grave" de Dirceu foi a de que os governadores Geraldo Alckmin (SP) e Aécio Neves (MG) estão tendo um comportamento "equilibrado" nessa crise só porque não sobreviveriam um mês sem a ajuda do governo federal.
Em Minas, Aécio, reagiu afirmando que "ninguém uniu mais a oposição do que José Dirceu". Para Alckmin, a polêmica levantada pelo ministro da Casa Civil é "estéril" e não ajuda o Brasil.

Ministério Público
No texto, Dirceu também diz que "não vai deixar barato" o que chamou de "violências legais" do Ministério Público. "Dirceu está numa fase infeliz desde que assumiu o governo", afirmou José Carlos Cosenzo, presidente da Associação Paulista do Ministério Público. O ministro foi criticado ainda em nota de entidades de procuradores.
O presidente Lula não gostou da repercussão do episódio e chamou Dirceu para uma conversa.
"O atual governo não precisa de oposição. Nunca vi tão trapalhão. Tropeça nas próprias pernas. [...] Agora, quando o incêndio começava a amainar, vem Dirceu jogar gasolina na fogueira", disse Jefferson Péres. Segundo ele, o ministro reagiu "com arrogância" a um discurso que deveria ser "recebido com aplausos" pelo governo.
Tasso, que afirmou ter estranhado as declarações de Dirceu acusando-o de haver ligado o governo ao crime, disse que sempre tentou "preservar" o ministro ao falar sobre o caso. "Estou dizendo o que todos vimos pelos jornais: que existe uma comprovação de ligação de um assessor do sr. ministro com Carlos Cachoeira, tido como bicheiro. Portanto, ligado de uma maneira ou de outra ao crime organizado", afirmou.
Para Virgílio, Dirceu se irritou porque o discurso de Tasso de apoio a Palocci teria barrado "um plano macabro de alguns que queriam jogar a crise para a área econômica, na tentativa de livrar a área política". O senador Sérgio Guerra (PSDB-PE) disse que "há um viés autoritário do governo, no PT e no ministro em especial".
Na tentativa de defender Dirceu, a líder do PT no Senado, Ideli Salvatti (SC), disse que as declarações do ministro não coincidem com a prática do governo Lula.
A petista afirmou ficar "aborrecida" ao ver uma reportagem tentar "desmontar" todo o esforço que o governo Lula teria feito desde o início para construir acordos e alianças. Acabou criticando Tasso, a quem chamou de "pessoa absolutamente equilibrada", mas que também tem, de acordo com ela, "seus momentos de desequilíbrio" -referindo-se a um bate-boca recente no Senado entre o tucano e o líder do governo, Aloizio Mercadante (PT-SP).


Colaboraram a Reportagem Local e a Agência Folha

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