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CELSO PINTO
O fim do ciclo de
alta dos juros
A decisão ontem do Conselho de Política Monetária de
manter os juros em 26,5% e retirar
o viés de alta parece consagrar o
fim do ciclo de alta nas taxas de
juros iniciado em outubro e que
chegou a 8,5 pontos percentuais.
No entanto, o mercado está longe
de acreditar que a inflação deste
ano ficará, de fato, dentro da meta
de 8,5%. Ao contrário, a projeção
do mercado subiu para 12,44%,
apesar da melhora recente em alguns indicadores.
A decisão de ontem reforça, portanto, a suspeita cada vez mais
forte de que o Banco Central está
olhando, de fato, para um prazo
mais longo. Espera cumprir a meta de 5,5% para 2004 e acha razoável diluir em dois anos o choque recente do ajuste externo.
Sabe-se que, na conversa que o
secretário do Tesouro americano,
John Snow, teve com o presidente
do BC, Henrique Meirelles, terça-feira, sobre o sistema de metas inflacionárias, ouviu algo parecido.
O que, aliás, Snow também considerou razoável.
O ex-presidente do BC Affonso
Celso Pastore está convencido de
que talvez não seja factível nem
sequer repetir, neste ano, os 12,5%
de IPCA do ano passado. Melhor
seria o BC explicitar que quer reduzir a inflação em dois anos e calibrar a política monetária para
atingir a meta de 2004. No regime
de metas de inflação, o BC considera tanto a volatilidade dos preços quanto a do PIB. Ele acha que,
neste governo, o peso da perda do
PIB ficou maior. O BC, contudo,
tem mantido uma certa dubiedade nos sinais, admitindo uma possível revisão de metas por critérios
pouco claros. Com isso, diz, o BC
perde parte da capacidade de influenciar as expectativas.
O argumento pode soar muito
duro num momento em que não
faltam boas notícias. O real saiu
de R$ 3,60 por dólar para perto de
R$ 3,00, o que deve aliviar a pressão do câmbio sobre os preços nos
próximos meses. O preço internacional do petróleo caiu, e o fim da
guerra do Iraque elimina incertezas. O alívio do câmbio sobre o
IGP reduz um pouco o impacto do
ajuste dos preços administrados
em julho e agosto.
Pastore concorda que são boas
notícias e que podem ajudar a melhorar as expectativas inflacionárias. Contrapõe, contudo, alguns
indicadores preocupantes.
O IPCA vem caindo muito lentamente, o que indica que há um
grau forte de inércia no aumento
recente dos preços. Ele acha que
um dos melhores indicadores para
a inflação futura é o comportamento do núcleo da inflação. Em
março, o núcleo subiu para 1,23%,
o que, anualizado, dá 15,8%. No
primeiro trimestre, o núcleo,
anualizado, chegou a 15%, muito
acima dos 8,5% da meta.
Há três semanas, a curva de juros futura está negativa, ou seja,
os juros de prazos mais longos estão menores do que o juro básico
(Selic). Existe uma leitura otimista desse comportamento, ouvida
no BC, no passado, em situações
semelhantes. Curva futura negativa indicaria a confiança do mercado de que a inflação vai cair, levando a uma taxa nominal de juros menor. A projeção dos departamentos econômicos dos bancos,
compilada pelo BC, muda de forma mais lenta e cautelosa. Portanto, a mudança na curva poderia antecipar uma guinada nas
expectativas que acabaria aparecendo nas projeções formais.
Pastore acha que não é o caso
atual. Há uma forte correlação
histórica entre juros futuros internos e risco Brasil, pela arbitragem
possível para os investidores. O recuo dos juros internos futuros
acompanhou a queda do risco
Brasil, desde outubro, mas, desta
vez, com menos intensidade. A razão: como espera-se uma inflação
alta, parte do juro nominal embute esta projeção.
Outra correlação estatística
muito forte, diz, é a que liga as taxas de juros futuras e o comportamento da economia (PIB ou produto industrial). As séries mostram que a taxa real de juro futuro tem um impacto forte e rápido
sobre o crescimento. O fato de, nas
últimas três semanas, as taxas de
seis e 12 meses estarem abaixo da
Selic indicaria, portanto, uma política monetária frouxa, especialmente se a taxa futura (em torno
de 24,5% a 25%) é comparada
com o núcleo da inflação anualizado. Os indicadores recentes
mais confiáveis do ritmo da economia, como produção industrial,
mostram mais estabilidade do
que queda. Como ele identifica
uma clara pressão dos preços não
afetados pelo câmbio, acha que o
correto teria sido um aperto adicional nos juros que provocasse
uma elevação na curva dos juros.
Vários outros economistas no
mercado têm uma visão muito
mais otimista. Mas ninguém imagina que a inflação ficará, de fato,
em 8,5% neste ano. E poucos supõem que ficará em 5,5% em 2004.
E-mail: CelPinto@uol.com.br
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