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CORRUPÇÃO NO GOVERNO/ENTREVISTA
Fiona Macaulay diz que Brasil não pode tolerar fraudes porque falta recurso para política social
Especialista vê Lula protegido e corrupção do PT como tragédia
DO ENVIADO A OXFORD
O presidencialismo possui uma
imagem forte do presidente isolado no palácio, desconectado de
partidos políticos -por isso,
muitos não o ligam à corrupção.
Essa é a avaliação da brasilianista
Fiona Macaulay, professora de
Estudos do Desenvolvimento da
Universidade de Bradford, que
estuda o Brasil há 13 anos.
Para ela, que foi professora do
Centro de Estudos Brasileiros de
Oxford entre 2000 e 2005, a corrupção do PT "é uma tragédia".
A brasilianista foi uma das participantes de seminário realizado
no Reino Unido pela Ditchley
Foundation, organização que debate grandes temas mundiais.
Pela primeira vez, um país latino-americano foi tema desses encontros. Em um palácio do século
18, em Oxford, onde Winston
Churchill passava seus finais de
semana, cerca de 40 convidados,
entre diplomatas, brasilianistas e
empresários, discutiram o país.
Várias análises sobre a economia, a corrupção, o ambiente e as
políticas sociais do Brasil surgiram nesse encontro.
A Folha foi convidada a participar do seminário, ocorrido há
duas semanas, onde conversou
com Macaulay, que também é autora de livros e ensaios sobre reforma judiciária e políticas de segurança e de gênero no Brasil.
Leia a entrevista seguir.
(RAUL JUSTE LORES)
Folha - Como tantas denúncias
contra o PT afetaram tão pouco a
popularidade do presidente Lula?
Fiona Macaulay - Lula é um ícone. As pessoas ainda vêem seu carisma. E os escândalos de corrupção são cada vez mais complicados, envolvem transações muito
complexas. É abstrato. Quando a
corrupção é perto de casa, o hospital que não foi construído porque o prefeito roubou o dinheiro,
eles percebem o que perderam.
Folha - Por isso Lula ainda é tão
popular?
Macaulay - No Brasil, há falta de
opções. Muitas alternativas de
mudança foram testadas. Vocês
tiveram o velho estilo no Sarney,
um jovem carismático no Collor,
o tecnocrata e intelectual no Fernando Henrique. Agora, o "trabalhador honesto". Quantos outros
tipos sobram? O PT e o PSDB
eram os partidos de onde se esperava a modernização da política
brasileira. Saber de corrupção no
PT é uma tragédia terrível.
Os mais bem informados dizem
que Lula sabia de tudo. Mas a
imagem típica do presidencialismo mostra o presidente sozinho
no palácio, longe do congresso,
do partido. No parlamentarismo,
nenhum primeiro-ministro convenceria de que não sabe o que
acontece no partido. Essa ignorância seria absurda.
Folha - A sucessão de escândalos
de corrupção pode fazer que os
brasileiros achem que é normal?
Macaulay - Há uma enorme decepção com o comportamento do
partido que passou 25 anos em
oposição às velhas práticas de
clientelismo. No Brasil, com tanta
pobreza e desigualdade, a corrupção não é apenas problema ético,
é um problema de fonte de recursos -que não serão investidos
em políticas sociais urgentes. O
Brasil não pode dar ao luxo de ser
tolerante com a corrupção.
Folha - A senhora acha que a corrupção é maior no governo do PT?
Macaulay - É muito difícil dizer
que um governo é mais corrupto
que outro. Depende do nível de
investigação. Com escândalos de
corrupção sucessivos, várias instituições cresceram, dos tribunais
de contas ao Ministério Público.
Há vários órgãos encarregados
de investigar lavagem de dinheiro, finanças de estatais. Por que
essas instituições não descobriram antes? Pelo menos nos estágios iniciais? A investigação chega
tarde. É como trancar o estábulo
depois que os cavalos fugiram.
Folha - A Justiça também tem sua
culpa nessa frustração?
Macaulay - Antes de chegar aos
juízes e aos tribunais, há trabalho
preventivo que não foi bem-feito.
Quem investiga? A Polícia Federal
não tem pessoal suficiente. Os
membros do STF freqüentemente
não parecem muito entusiasmados para contrariar o Executivo.
Por que ainda existe foro privilegiado e imunidade para membros
eleitos do Legislativo e ministros?
Folha - O que o Judiciário deveria
fazer?
Macaulay - Uma das coisas que o
mais alto escalão do Judiciário deveria insistir é no princípio de que
todos são iguais perante a lei.
Imunidade só contra processos
por ações inerentes ao ato de governar. Não processar um deputado pelo que fala. Mas, para um
ato criminoso, eles não poderiam
ter imunidade. Muitos concorrem só para se proteger da lei.
Folha - O PT inchou a máquina pública. A possibilidade de um serviço
público profissionalizado ficou
mais distante?
Macaulay - Essa é uma tragédia
terrível. O PT foi um partido que
entendeu isso quando assumiu
prefeituras no final dos anos 80,
viu o fisiologismo. No passado, os
petistas tinham mais interesse de
promover o "modo petista de governar". Agora isso é uma frase
vazia. O PT é um partido de massa, com milhares de afiliados que
esperavam uma recompensa por
seu trabalho interno ganhando
cargos. Para o PSDB, que não é de
massa, é mais fácil trazer gente de
fora sem filiação aparente.
O PT se destacou por defender
políticas novas, coerentes. Parece
que jogou fora todo esse conhecimento. Na área social, é um governo constrangido, que corta
gastos sociais em nome do superávit.
O jornalista Raul Juste Lores viajou a
convite da organização do evento
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