São Paulo, domingo, 24 de junho de 2001

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

RÉPLICA

Críticas se fazem compreender sem agressividade verbal

PAULO DANIEL FARAH
DA REDAÇÃO

Construir um argumento com base em sensações, no "tom", no que não se escreveu mas quer-se ver, leva em geral à discriminação e à ofensa. Não podia ser diferente na crítica do domingo passado à entrevista com Iasser Arafat publicada uma semana antes.
Em crítica interna, o ombudsman afirmara que o furo teve um custo. Após contestação, pediu desculpas. No domingo, apesar de defender "contraditórios", não me ouviu antes de fazer insinuações graves como a de que as questões a Arafat foram encomendadas, procedimento que não faz parte de meus métodos de trabalho. A entrevista é uma conquista profissional, feita em condições desfavoráveis e fruto de um investimento de ao menos dois anos. Arafat rejeitava entrevistas desde o início da Intifada.
Quanto ao diário "Le Figaro", que, como vários jornais estrangeiros, apreciou a reportagem e negocia sua compra, o entrevistado era outro e havia 36 perguntas. Seria simplista escolher 11 questões novas e desenvolver uma tese oposta à do ombudsman.
Em resposta à crítica interna, explicara o porquê das perguntas. Por exemplo: "Israel o acusa de voltar à luta armada". Isso pressupõe que o entrevistado tenha sido adepto da luta armada, o que não parece positivo. A agressividade verbal nem sempre é a melhor estratégia, como revelam entrevistas com Arafat. Críticas se fazem compreender sem violência.
O material de apoio descreve o cotidiano do líder palestino objetivamente. Depois de ir ao Oriente Médio dezenas de vezes e ali viver alguns anos, parece-me clara a importância de não perpetuar mitos que um lado tem sobre o outro -não faltam obras de ficção.
Texto à parte trouxe não apenas a posição do governo mas também a da sociedade israelense. A afirmação de Israel de que Arafat provocou a Intifada para obter concessões no processo de paz vem em destaque aí e no segundo parágrafo da entrevista ["...rechaça a acusação de Israel de que ele organizou o levante"".
A cronologia destacou fatos negativos como o de que, em 1967, "o Fatah [fundado por Arafat" intensifica ataques contra Israel, apoiado por grupos palestinos".
"Por que não mencionar, então, o fato conhecido de que Arafat, antes de abraçar a causa palestina, foi um rico especulador imobiliário no Kuait?", perguntara o ombudsman na crítica interna. Porque nas cinco biografias de Arafat (uma israelense, uma árabe, uma norte-americana e duas européias) que consulto para o livro que estou a escrever, não há menção sobre isso. De qualquer modo, ainda que tivesse sido especulador, Arafat "abraçou a causa" bem antes de ir, em 1957, ao Kuait. Em 1948, com 16 anos, apresentou-se como voluntário para os confrontos israelo-árabes.
As declarações de Arafat causam incômodo a alguns, mas são parte do diálogo. Como diz o pacifista israelense Yehezkel Landau, o respeito à diferença passa pelo fim do estranhamento.



Texto Anterior: Forças armadas: Militares vão destruir hoje cerca de 115 mil armas
Próximo Texto: No planalto: BC começa a apalpar contas bancárias do M$T
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.