São Paulo, domingo, 24 de junho de 2001

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NO PLANALTO

BC começa a apalpar contas bancárias do M$T

JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A s arcas do M$T estão prestes a tomar uma lufada de ar fresco. Por ordem do juiz Nilton José Falcão, da Justiça Federal de Teodoro Sampaio (SP), arrombaram-se as porteiras das contas bancárias da Cocamp, a cooperativa dos assentados da região do Pontal do Paranapanema. Trata-se de uma das principais vitrines dos sem-terra no país.
Rompeu-se também o sigilo das contas dos dirigentes da Cocamp, entre eles José Rainha Jr., a silhueta mais festejada do M$T depois da de João Pedro Stedile. O Banco Central já apalpou alguns extratos, colhidos na rede bancária. Aguarda-se o fim da colheita para os próximos 15 dias.
Os frutos serão remetidos a quem os solicitou, o juiz José Falcão. Ele os semeará no inquérito civil aberto para apurar suspeitas de desvio de dinheiro público do programa de reforma agrária.
Até aqui, a principal peça do processo é uma auditoria que aponta a prática de malfeitorias variadas na Cocamp. A inspeção foi feita no ano passado por técnicos da mesma repartição que ajudou a iluminar os porões da $udam de Jader Barbalho, a Secretaria Federal de Controle, do Ministério da Fazenda.
A Polícia Federal conduz as investigações, a pedido do Ministério Público. Os agentes não vêem a hora de deslizar os olhos pelo papelório. Tiveram a curiosidade aguçada no último mês de março, ao invadir extratos bancários de Miriam Farias de Oliveira, militante do M$T filiada à Cocamp.
A PF recebeu os segredos bancários de Miriam de fonte anônima. Verificou-se que a conta da misteriosa militante, aberta na agência 2.718 do Banco do Brasil, sob número 07345, exibia extraordinários índices de produtividade. Em escassos 20 dias (de 1º a 21 de novembro de 2000), foi irrigada com R$ 96.753,60. Uma cifra que não costuma roçar as mãos de um sem-terra nem em sonho.
Na terminologia do submundo das transações financeiras duvidosas, Miriam seria uma laranja do M$T. A PF desconfia que o movimento dos sem-terra mantenha um laranjal no quintal de algumas cooperativas, adubado com dinheiro da Viúva. Só na Cocamp, Brasília já enterrou mais de R$ 4 milhões.
Se confirmadas, as suspeitas não mancharão apenas a reputação do M$T. Levarão de cambulhada o Incra e o Banco do Brasil, responsáveis pelo repasse e pela fiscalização do dinheiro que sustenta as cooperativas.
A quebra de sigilo determinada pelo juiz José Falcão alcança todo o período de funcionamento da Cocamp, desde a sua fundação, em 28 de dezembro de 1994. Quanto aos dirigentes, serão perscrutadas as contas não apenas dos atuais, mas também dos ex-administradores, todos eles vinculados ao M$T.
De mansinho, sem grande alarido, os porões do M$T vêm sendo expostos à inclemência do sol desde meados do ano passado. Descobriram-se algumas coisas do arco-da-velha -da utilização de títulos podres para encobrir fendas no orçamento de uma cooperativa à extorsão de assentados.
Chamados a dar explicações, os líderes do movimento ora calam, ora enriquecem a história da mais importante organização social do país com um palanfrório oco. Acham-se vítimas de uma "orquestração" urdida para enxovalhar-lhes a reputação. A quem se juntam? A personagens como Jader Barbalho e Eduardo Jorge, que costumam esgrimir lorotas semelhantes para explicar o casulo pegajoso de suspeitas que orna as suas biografias.
São muitos os méritos do M$T. Enumerá-los seria cansativo e desnecessário. Seu histórico justifica à saciedade a tese segundo a qual, não fosse por sua sacrossanta rebeldia, o problema agrário brasileiro ainda seria um drama sem rosto. Mas os emee$$etistas, tão habituados a cobrar dos outros gestos com transparência de cristal tcheco, ainda hão de se dar conta de que a boa causa não oferece salvo-conduto para o erro.
  Intrigar para não entregar: ao dar posse ao novo titular da pasta da Integração Nacional, FHC disse que a escolha do senador Ramez Tebet (PMDB-MS) foi um aceno à integração partidária. Integrou-se de novo a fome do PMDB com a vontade que certos "empresários" têm de comer incentivos fiscais do Norte e do Nordeste. Integração assim já produziu desvios de cerca de R$ 4 bilhões na $udam e na $udene. Às vésperas de assumir o novo posto, Tebet, el integrado, mandou para o arquivo do Conselho de Ética do Senado pedido de rastreamento do cheque que teria remunerado estripulias de uma época em que, sob Sarney, Jader Barbalho mandava na reforma agrária. O esforço no sentido de evitar uma crise entre FHC e o PMDB deveria ser urgentemente contrabalançado por uma campanha para intrigar os dois, afastando-os ainda mais. Não há de ser difícil. A intriga é, como se sabe, uma especialidade de Brasília.
  Engavetamento Independência dependente: sensibilizado com um abaixo-assinado de 57 senadores, FHC acaba de reconduzir Geraldo Brindeiro, el engavetador, a um novo mandato de dois anos no posto de procurador-geral da República. Do cruzamento da independência do Ministério Público com a conveniência das assinaturas que pendem do inusitado documento, nascerão 57 potenciais gavetinhas. Somadas às gavetonas já marmanjas, comporão uma prole e tanto. É mesmo dura a rotina de um soberano obrigado a zelar pela própria biografia ao mesmo tempo em que luta para conservar no fundo dos armários de Brasília tantos esqueletos colecionados. Quando a posteridade puder falar livremente sobre os dias que correm, o veredito há de ser denso e implacável.



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