São Paulo, domingo, 24 de junho de 2007

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JANIO DE FREITAS

Os diferentes apagões


O Senado não se deu à obrigação de produzir um regimento para as atividades do seu Conselho de Ética

A MELHOR medida da situação em que se encontra o senador Renan Calheiros está às suas costas: aí, tanto faz se a conversa é de governistas ou oposicionistas, o diálogo sempre se recheia de sondagens manhosas das tendências para a substituição de Calheiros, uma escolha complicada. Mas o esperado decorrer dos fatos não assegura ainda o afastamento de Calheiros. Ou, no mínimo, não indica que flua, seja em que direção for, sem surpresas, depois das tantas em tão poucos dias.
As imprecisões formais do Conselho de Ética do Senado, quanto a definições tão importantes como os limites do seu poder e dos seus modos de ação, por exemplo, contêm armadilhas capazes de neutralizar até a mais clara decisão contrária a Renan Calheiros. Ainda na linha do exemplo: está aí a repentina afirmação, por senadores e jornalistas, de que o caso Renan no conselho já é processo, o que parece uma afirmação inofensiva e, no entanto, é mais do que problemática.
A tarefa incumbida ao Conselho de Ética, por iniciativa do PSOL, foi acolher ou recusar uma representação que aponta quebra de decoro parlamentar de Renan Calheiros. A abertura do processo depende do acolhimento da representação pelo conselho. Caso esse acolhimento não seja manifesto e claro, torna-se possível a contestação judicial da legalidade do processo e, se for o caso, da cassação. Recurso judicial que Renan Calheiros não dispensaria. Assim como será com certas coletas de informações, já que o Senado não se deu à obrigação de produzir um regimento para as atividades do seu Conselho de Ética.
A depender do que apresentou como provas materiais em sua defesa, Renan Calheiros não precisaria dar mais trabalho ao conselho. Apenas preliminar, sem investigações propriamente ditas, o relatório da Polícia Federal já é devastador. Daí que mereça certa cautela a preferência, entre políticos e na imprensa, por atribuir ao vigor da opinião pública a reversão, no conselho, do amparo a Renan Calheiros. Sem negar efeitos da opinião pública, é bom notar que os ares do conselho só mudaram na terça-feira, segunda reunião da semana, depois que o relatório preliminar da PF chegou aos senadores.

No céu e na terra
Só a nostálgica reverência aos militares não viu, em seguida à derrubada do avião da Gol pelo Legacy, que os comandos da FAB cuidavam de empurrar para os subalternos, sem poupar prepotência, qualquer possível responsabilidade do sistema de controle aéreo no desastre. A reação exacerbada dos controladores levou a constatações que logo permitiram a certeza geral, à margem do desastre, de que o serviço não estava longe do descaso da FAB. De lá para cá, o que se pensava ser incompetência provou ter sido só amostra.
As lideranças dos controladores dilapidaram a oportunidade extraordinária que lhes foi doada por 154 mortes. Há todas as razões para serem vistos, hoje, como irresponsáveis em cujos argumentos não se pode acreditar. Se houver alguma porção verdadeira nas alegações para sua atitude da última semana, nem importa, porque o estopim é inaceitável: como sargento, o líder dos controladores sabe que militar não pode dar entrevista sem autorização expressa, logo, a prisão disciplinar que lhe foi aplicada amparou-se em normas conhecidas e reconhecidas. Os pretendentes a passageiros foram transformados pelos controladores em massa de manobra das suas pretensões.
Nesta semana faz nove meses que a FAB vê a escalada do problema no transporte aéreo. Nove dias já bastariam para que houvesse mais medidas preventivas e soluções emergenciais do que se viu. Por seu lado, a Anac, a tal agência encarregada da aviação civil, é um caso de falência antes de provar a existência. O caos da aviação não está só nos aeroportos.
Mas o Aerolula e os aviões da FAB para viagens de Marta Suplicy não encontram dificuldades, e isso é quanto basta para que tudo vá bem no céu e na terra.


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