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São Paulo, quinta-feira, 24 de julho de 2003

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"Quero dar uma sepultura digna para eles", diz mãe de desaparecidos

JOSÉ ALBERTO BOMBIG
DA REPORTAGEM LOCAL

Mãe de três guerrilheiros mortos no Araguaia, Julieta Petit da Silva, 83, disse que comprou, em meados dos anos 90, o jazigo da família onde espera sepultá-los.
Quase 30 anos após o final da guerrilha, apenas os restos mortais da professora Maria Lúcia Petit da Silva, que havia desaparecido em 1972, aos 22 anos, estão sepultados no local, após terem sido reconhecidos pela Unicamp.
Faltam ainda Jaime, desaparecido aos 29 anos, e Lúcio Petit da Silva, desaparecido aos 31 anos.
"Já tenho a Maria Lúcia, mas ainda faltam o Lúcio e o Jaime. Só quero dar uma sepultura digna para eles. É o mínimo que posso fazer. Eu já comprei o jazigo dos dois no cemitério, em Bauru, junto da Maria Lúcia", disse.
Segundo ela, à dor da perda dos três filhos se soma a angústia pela falta de informações sobre as circunstâncias, datas e locais em que as mortes ocorreram, especialmente no caso de Lúcio.
"Agora, finalmente, eles vão nos informar onde estão meus filhos? Que bom que seria. Eles têm que explicar como foi que eles morreram, onde, quando, qual o motivo. Essas dúvidas não me saem da cabeça."
A mãe dos irmãos Petit é uma das autoras da ação que motivou a quebra do sigilo das informações militares e que pode obrigar a União localizar os restos mortais dos desaparecidos.
Informada da decisão da Justiça pela Folha, Julieta Petit da Silva ficou emocionada. A entrevista teve que ser interrompida porque ela chorou ao falar dos filhos mortos e da possibilidade de sepultá-los.
Ela falou à Folha ontem, por telefone, de sua casa, em Presidente Prudente (SP).
 

Folha - A decisão da Justiça Federal quebra o sigilo militar sobre as operações do Exército...
Petit da Silva -
Agora, finalmente, eles vão nos informar onde estão meus filhos? Que bom que seria. Eles têm que explicar como foi que eles morreram, onde, quando, qual o motivo. Essas dúvidas não me saem da cabeça.

Folha - Há quantos anos a senhora aguarda?
Petit da Silva -
Até 1975 eu mantive as esperanças de encontrar meus filhos vivos. Depois, me disseram que não adiantava mais, que eles estavam mortos.

Folha - E luta pelos corpos...
Petit da Silva -
Já tenho a Maria Lúcia, mas ainda faltam o Lúcio e o Jaime. Só quero dar uma sepultura digna para eles. É o mínimo que posso fazer. Eu já comprei o jazigo dos dois no cemitério, em Bauru, junto da Maria Lúcia. Minha filha Laura tem ido para o Araguaia em busca de informações, mas eu não estou muito satisfeita de ela ficar indo para lá. Quem sabe isso acabe agora.

Folha - A senhora se lembra de quando a luta começou?
Petit da Silva -
Acho que já faz muito tempo. O Genoino [José Genoino, presidente nacional do PT e ex-guerrilheiro do Araguaia] ainda era moço.

Folha - Como foi a emoção quando a sra. pôde sepultar sua filha Maria Lúcia?
Petit da Silva -
Foi uma alegria muito grande. Reconforta a gente. Mas o que aconteceu é muito triste. Nunca mais terei eles comigo de novo. Ontem [anteontem] foi meu aniversário de 83 anos...


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