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JANIO DE FREITAS
Na zona de perigo
A crise entrou na fase em
que cada documento novo,
cada acréscimo verbal para afirmar ou negar, é como um lance
de roleta russa. Uma situação
particularmente perigosa: as evidências comprometedoras chegaram à porta do Palácio, o presidente assume ares paranóides
de descontrole pessoal e, por precipitação de alguns e má-fé de
outros, já se confundem a busca
das verdades e a passagem da crise política à crise institucional.
Até meado da semana, a crise
chegava ao Planalto pela via indireta das denúncias e suspeitas
que atingiram a Casa Civil de José Dirceu e a Secretaria de Comunicação de Luiz Gushiken. Problema quase que apenas individualizado. Duas novas revelações documentais dirigem-se, porém, à Presidência mesmo. Uma,
o uso do dinheiro sujo de Marcos
Valério para pagar meio milhão
a uma das empresas de Duda
Mendonça, por intermédio da sócia Zilmar Fernandes da Silveira.
Outra, a quitação de cerca de R$
30 mil de empréstimo do PT a
Lula.
Às duas revelações falta nitidez, o que pode esconder sua legitimidade, mas também sua gravidade. Os dois fatos são de 2003.
O primeiro, no início do governo
Lula e, por isso, suspeito de ligar-se à campanha que elegeu o presidente: o dinheiro sujo de Valério deslegitimando o resultado
eleitoral. O segundo, suspeito de
benefício financeiro pessoal ao
presidente, por intermédio da tesouraria petista onde Delúbio
Soares traçava os fins do dinheiro açambarcado por Valério.
Diante dos canhonaços que
destroçam o PT, Lula não tem o
que fazer. Mas o que atinge o governo deveria receber resposta
objetiva, imediata e convincente.
Do escapismo inicial, Lula passou, no entanto, à atitude mais
inconveniente ao Estado de Direito: apela aos setores operários,
como se viu na sexta-feira, com a
contraposição de classes. Não por
um motivo social e justo, mas por
motivo falso: as elites a que Lula
atribui a intenção de fazê-lo
"abaixar a cabeça" são seu
maior aliado e a classe socioeconômica beneficiada de verdade, e
quanto, pelo seu governo palocciano.
Do perseguido, Lula passa à
fanfarronice do nascido pobre
com quem, por isso, "ninguém
pode discutir ética". Raia a gaiatice, esse monopólio da pobreza e
da ética pretendidos por Lula, em
meio aos luxos palacianos ou no
Aerolula, enquanto seus atos presidenciais confirmam a confissão
de que tudo o que falou nos 20
anos anteriores eram "bravatas".
Programam-se vários eventos
populares, dos que Lula transforma em comícios, para a agenda
presidencial dos próximos dias.
No Congresso e na CPI, esperam-se mais discursos irresponsáveis,
como as referências do deputado
José Carlos Aleluia a impeachment, discursos quase sempre de
quem não está autorizado pela
biografia a falar de moralidade
na vida pública.
A crise entrou em zona de
perigo.
Concorrência
A propósito de referência feita
aqui, e não só aqui, a uma concorrência nos Correios, correspondência de Luiz Gushiken (já
não sei se, nas obscuridades planaltinas, ainda ministro, ou já
secretário, ou que designação
tem) diz o seguinte: "É absolutamente improcedente a afirmação
de que "a redução de R$ 3 milhões para R$ 1,8 milhão, do capital exigido das empresas concorrentes (...) permitiu a inclusão de
Marcos Valério na licitação". O
edital previa que poderiam participar da licitação empresas que
atendessem a requisitos de liquidez geral, solvência geral e liquidez corrente superiores a um"
(segundo equações constantes do
edital remetido também, em cópia, por Luiz Gushiken).
Bastará dizer, a propósito da
referência aqui feita à redução
imposta pela secretaria do então
ministro Luiz Gushiken, que
Marcos Valério deu a seguinte
resposta na CPI, quando perguntado se sua empresa (com patrimônio de R$ 2,2 milhões) foi beneficiada nos Correios pela redução do patrimônio exigido: foi,
mas outras também foram.
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