São Paulo, sexta-feira, 24 de setembro de 2004

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MEA-CULPA

Presidente promete, em entrevista a emissoras de rádio, ser mais comedido

Lula se desculpa por pedir votos para reeleger Marta

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu ontem desculpas por ter declarado apoio à reeleição da prefeita de São Paulo, Marta Suplicy (PT). Ainda prometeu ser mais comedido em suas falas improvisadas e disse que a manifestação pública de seu voto em campanha eleitoral pode não ter sido um bom exemplo.
"Se isso foi errado, eu só tenho de pedir desculpas, se eu machuquei alguém, se eu feri alguém. Vou ser mais comedido daqui para a frente. Vou evitar que, durante esse processo de campanha, faça os meus improvisos falando de eleição. Pode ajudar o meu candidato, mas não é um exemplo que pode ser bom para a Justiça", afirmou Lula, no Planalto, em entrevista a 13 emissoras de rádio.
Aproveitou o tema e atacou indiretamente o governador paulista Geraldo Alckmin (PSDB), um dos maiores críticos de seu apoio à reeleição de Marta. "Eu gostaria que os governadores não estivessem em campanha, mas estão. Estão fazendo publicidade como se fossem eles os candidatos."
E ironizou a oposição: "Eles começaram dizendo que iam fazer uma campanha federalizada que ia destruir o governo federal, ou seja, os números da economia fizeram com que eles fechassem a boca, não falassem".
Na entrevista, que durou cerca de 1 hora e 45 minutos, Lula disse que a decisão de elevar a meta de superávit primário deste ano de 4,25% para 4,5% do PIB foi uma medida "correta, acertada e da maior responsabilidade". Segundo o presidente, "não tem farra do boi" para distribuir o dinheiro.
 

SÃO PAULO - "Depois do discurso, recebi documento por escrito que mostrava que nos sete anos o governo passado investiu na capital paulista R$ 590 milhões [em habitação e saneamento], e eu, em 19 meses, já tinha colocado quase R$ 400 milhões. E por que o grande investimento em São Paulo? Porque São Paulo não é dos paulistas. Aquilo é uma megalópole que atende o Brasil e o mundo."

APOIO A MARTA - "Fiz o pronunciamento. Depois, quando fui falar de improviso, eu fui tomado por uma emoção muito grande, como todo orador é, e falei da campanha eleitoral. Falei. Se cometi um erro, sou presidente da República e não gostaria de dar exemplo de transgredir qualquer lei. Portanto, como criaram a palavra desculpa, peço desculpa se isso causou algum mal a alguém.
Não entendo por que os nossos adversários que estão na campanha todos os dias ficaram tão nervosos. Começaram dizendo que fariam uma campanha federalizada que iria destruir o governo federal. Os números da economia fizeram com que eles fechassem a boca, não falassem. Só faltam pedir voto para mim em palanque. Agora, se isso foi errado, só tenho de pedir desculpas, se machuquei alguém, se feri alguém. Vou ser mais comedido daqui para a frente. Vou evitar que, durante esse processo de campanha, faça os meus improvisos falando de eleição. Pode ajudar o meu candidato, mas não é um exemplo que pode ser bom para a Justiça."

DISCURSO NO SITE - "Eu não estava aqui, quando teve esse problema do site. Eu disse ao Ricardo Kotscho [secretário de Imprensa], ontem [anteontem], para colocar no site esse negócio, porque o discurso está por escrito, eu não tenho como dizer que eu não fiz o discurso, porque está por escrito."

SUPERÁVIT PRIMÁRIO - "Quando você faz uma discussão da Junta Orçamentária, percebe que vamos ter algum dinheiro de folga. Estamos chegando ao final do ano e não tem um grande projeto para chegar e dizer: "vamos aplicar na construção de uma grande coisa que vai dar tempo de acabar".
Então, em vez de você ficar jogando dinheiro pelos ladrões, como habitualmente se faz atendendo emenda, fazendo qualquer coisa, o que nós fizemos? Se temos essa folga, e se ela vem surgindo do mês de junho para cá, em vez de jogar dinheiro fora, vamos aumentar o superávit, ao menos nós diminuímos a dívida. Sobrou um pouquinho e vamos fazer o quê? Gastar? Vamos fazer política com esse dinheiro? Vamos pegar esse dinheiro e vamos distribuir como se fez a farra do boi neste país? Então vamos assumir a nossa responsabilidade. Vamos então dizer que nós vamos pagar uma parte do que devemos a mais."

REELEIÇÃO NO CONGRESSO - "Num país que tem reeleição para presidente da República, para prefeito e para governador, dizer que uma casa legislativa não pode ter a sua própria reeleição interna é no mínimo uma contradição.
Isso é um problema deles, eu já disse ao presidente [da Câmara] João Paulo, disse ao presidente [do Senado, José] Sarney, é um problema que eles têm de coordenar lá dentro. Se acontecer a reeleição, o que eu não sei se vai acontecer, vou ter um candidato obviamente na Câmara e um candidato no Senado. Mas, por enquanto, espero que eles decidam o que fazer, sem que haja qualquer ingerência do Executivo."

ECONOMIA E FUTEBOL - "Economia no Brasil está virando futebol. Têm três coisas no Brasil que todo mundo pensa que conhece e se dá ao luxo de falar a respeito com a maior desenvoltura. Uma delas é futebol. Todo mundo acha que marcaria o gol que o jogador não marcou, ou que marcaria o pênalti que o rapaz do Flamengo perdeu ontem [anteontem]. A outra coisa é saúde. Você não pode chegar a uma reunião e dizer que está com dor, porque aparecem dez oferecendo um remédio. E a outra é economia. Todo mundo acha que entende de economia. Em economia, não tem aventura. Um salto fora do propósito, e você quebra a cara. E depois quem fica com o prejuízo? O povo."

ALIADOS - "É um absurdo imaginar que você pode montar um governo sem levar em conta seus aliados. Como se pudesse ganhar uma eleição, montar um time puro sangue, esquecer as pessoas que te ajudaram, e que vai dar tudo certo. Se aqui fosse uma ditadura, até poderia dar, mas aqui é uma democracia."

NAÇÕES UNIDAS - "[A reunião na segunda-feira em Nova York] foi uma coisa extraordinária. É só conversar com os presidentes para saber quantas vezes aconteceu aquilo. E uma coisa importante: convocada pelo Brasil. E por uma razão simples: só eu posso falar da fome com todos eles. Não apenas porque o meu país é pobre, porque muitos são mais pobres do que nós, mas porque eu conheço o problema dentro da minha alma, dentro do meu estômago."
Acho que se, não fosse a minha passagem pela Presidência, possivelmente esse tema fosse tratado de forma "en passant"."

TRANSGÊNICOS - "Se for importante e tiver acordo, posso fazer isso, assinar [MP]. Não quero entrar em detalhes sobre o que vai ficar ou não porque não conheço e, ao falar antes de conhecer, posso estar dando um tiro no pé. Não quero ser suicida, do ponto de vista político, neste momento."

REFORMA TRIBUTÁRIA - "Todo mundo fala em reduzir imposto, mas ninguém quer reduzir. Fizemos a parte federal, tem a parte estadual para ser feita. Os governadores não se entendem. Alguns querem perpetuar guerra fiscal, outros não. Conversei com alguns governadores nesses dias e disse a eles que é importante juntar aqueles que não querem a guerra fiscal para que o Senado vote a parte da reforma tributária que é pertinente aos governadores."

SEGURANÇA PÚBLICA - "O problema da segurança pública é um problema do Estado. O governo federal pode e está tendo uma boa política de tentar unificar os procedimentos para que sejamos mais eficazes. Me orgulha ter uma das pessoas mais extraordinárias do país como ministro da Justiça, que é o ministro Márcio Thomaz Bastos. Inatacável do ponto de vista da sua competência profissional, da sua história, da sua dedicação. E o Márcio sempre conta até dez. Você não o vê falar uma heresia, falar pelos cotovelos."

MST - "De vez em quando tem radicalização, mas isso é normal no meio dos sem-terra, no meio dos jornalistas, no meio de tantos lugares. Quem tem poder tem a obrigação de ter mais tranqüilidade do que os outros, de ter mais responsabilidade do que os outros. Então, quando vejo um setor da sociedade mais nervoso, eu é que tenho que tentar fazer o papel do companheiro mais velho. Acho que o movimento sem terra percebe que as chances que eles tem de termos uma boa política de reforma agrária e agrícola, pacífica, sem radicalismo, é agora."


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