São Paulo, Domingo, 24 de Outubro de 1999
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CPI DO NARCOTRÁFICO
Nova Olinda está próxima ao que seria o "quartel-general" de grupo que atua no Estado
Cidade do MA vive sob "lei do silêncio"

O Imparcial
Maranhão: Altamiro Cardoso da Silva, gerente da fazenda "Flor de Santana", que pertence a Rogério Farias


IRINEU MACHADO
da Agência Folha, em São Luís


Nova Olinda, pacata cidade com menos de 10 mil habitantes no interior do Maranhão, vive sob o império de uma "lei do silêncio" depois que a região, próxima da divisa com o Pará, se tornou o alvo principal de uma megainvestigação policial sobre uma rede de crime organizado que envolveria figurões da política regional.
Às margens da rodovia BR-316, Nova Olinda (365 km de São Luís) sediaria o "quartel-general" do grupo no Maranhão, uma fazenda de 3.000 hectares de José Rogério Cavalcante Farias, irmão do deputado federal Augusto Farias (PFL-AL) e do empresário Paulo César Farias, o PC.
Na cidade, as pessoas conhecem ou já ouviram falar da fazenda, e, com raras exceções, sabem que é dos Farias. Mas os moradores evitam falar sobre o assunto.
Se comprovadas as informações que a polícia e as CPIs do Narcotráfico (do Congresso) e do Crime Organizado (na Assembléia Legislativa do Maranhão) coletaram, estarão unidas todas as peças do quebra-cabeça levantado desde o depoimento do motorista Jorge Meres de Almeida.
Preso no início do ano no Maranhão, o ex-integrante da quadrilha denunciou uma conexão entre Hildebrando Pascoal (ex-deputado federal do Acre, acusado de liderar um "esquadrão da morte"), o deputado federal Augusto Farias, o deputado estadual José Gerardo (PPB-MA) e o empresário William Sozza (veja quadro ao lado).
Os quatro seriam os líderes da organização acusada de roubar carretas, vender a carga para prefeituras, trocar os veículos por drogas na Bolívia, tudo isso com ajuda de policiais e, suspeita-se,de juízes. Integrantes da CPI do Narcotráfico chegarão amanhã a São Luís para ouvir 12 pessoas e cruzar informações com a comissão da Assembléia Legislativa.
Nova Olinda está na rota do maior foco de roubo de carretas na região. O número de ocorrências nem a polícia sabe com precisão. Do final de setembro até a última sexta-feira, 14 pessoas de Nova Olinda e de cidades vizinhas em conexão com o grupo foram presas pela Gerência de Segurança do Estado.
Cinco dessas pessoas eram policiais. Um deles, o ex-sargento da Polícia Militar Antônio Lisboa Corrêa, confirmou a versão do motorista Almeida. Ex-delegado na cidade, Corrêa está preso.
"Muita gente sabe de muita coisa aqui, mas todos sabem que quem fala demais pode sofrer as consequências", diz Bajara (ele não quis revelar o nome completo), ex-assistente de Almeida, escrivão de polícia da cidade.
Bajara, com a voz trêmula, pediu à reportagem que parasse de lhe fazer perguntas sobre roubo de carretas porque "temia ser assassinado" e não tinha nenhuma segurança. Epitácio Farias, ex-gerente da fazenda Flor de Santana, que fica a 10 km da cidade, era uma personalidade na cidade.
"Todo mundo aqui o conhecia. Ele era quase uma figura pública. Trabalhava na fazenda de Augusto Farias", disse à Agência Folha Epitácio Oliveira, morador de Nova Olinda.
Epitácio Farias é apontado em depoimentos como o homem que organizava reuniões da quadrilha na sede da fazenda.
Há seis meses, segundo Rogério Farias, ele saiu da fazenda para trabalhar em outro lugar. Quem o conhecia em Nova Olinda diz que ele "se envolveu em confusões" e foi demitido da fazenda.
O novo gerente, Altamiro Cardoso da Silva, 51, diz que assumiu o posto há três meses. "O Augusto (Farias) nunca esteve aqui. O Rogério veio duas vezes desde que eu cheguei", disse. "Eu tive a oportunidade de conhecer o senhor Augusto Farias. Ele esteve aqui numa festa depois das eleições", disse P., uma mulher que pediu para não ser identificada. Augusto Farias nega que tenha ido à cidade. Seu irmão, Rogério Farias, diz que vai ao local eventualmente.
Rogério Farias confirmou que hospedava políticos locais em sua fazenda.
O deputado estadual Camilo Figueiredo (PSD), que já se hospedou na casa quando fazia campanha em Nova Olinda nas últimas eleições, disse que "isso é comum nas cidades do interior onde não há hotéis".
A polícia está cruzando informações com um depoimento de Epitácio Farias, que, em sigilo, foi ouvido na quarta-feira pela polícia do Maranhão e confirmou várias das suspeitas.
A fazenda, visitada pela Agência Folha, tem hoje uma criação de gado e apenas três funcionários, segundo o gerente Altamiro Cardoso da Silva.

Piauí
O deputado federal Paulo Marinho (PFL-MA) deverá ser ouvido pela Polícia Federal do Piauí. Ele é suspeito de envolvimento no esquema de desvio de verbas públicas federais que seria coordenado pelo coronel da reserva da PM do Piauí Viriato Correia Lima, com o uso de notas fiscais "frias".
O superintendente da Polícia Federal no Piauí, Robert Rios Magalhães, recebeu anteontem 280 notas fiscais "frias" que teriam sido obtidas por Correia Lima e repassadas à Prefeitura de Caxias (MA) quando Paulo Marinho era o prefeito. Ele deixou a prefeitura para se candidatar a deputado federal na campanha de 98.
Marinho não foi localizado pela reportagem da Agência Folha anteontem à noite.


Texto Anterior: Elio Gaspari: A atualidade do Riocentro chama-se impunidade
Próximo Texto: Polícia Federal tem 2 delegado s para cerca de 1.200 inquéritos
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.