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ELIO GASPARI
O Brasil do conde vai acabar em 2073
Para quem acredita em previsões de nobres franceses
ou sábios americanos e aborreceu-se com a futurologia dos videntes do governo dos Estados
Unidos para o Brasil, aqui vão
outras duas, das boas.
Faltam 70 anos para o Brasil
acabar. Em 2073, os brasileiros
"terão desaparecido completamente, até o último homem".
Esse será o resultado da miscigenação racial num país onde a
imperatriz tinha três damas de
honra: "uma marrom, outra
chocolate-claro, e a terceira, violeta".
A previsão veio do conde Arthur de Gobineau, autor do
"Ensaio sobre a Desigualdade
das Raças", embaixador francês
na Corte do Rio de Janeiro entre
1869 e 1870 e bom amigo de D.
Pedro 2º. Pelas contas de Gobineau, o Brasil deveria ter hoje
uma população de algo como
dois milhões de habitantes.
O outro lote de previsões veio
de Herman Kahn. Era um gordão odiado porque simbolizava
a escalada americana na Guerra do Vietnã. Mesmo assim, sua
fé no progresso fez dele o primeiro futurólogo a ganhar ares de
santidade. Em 1967 ele publicou
um livro intitulado "O Ano
2000".
Em algumas coisas, errou feio:
antecipava um futuro no qual
Ásia (sem a China) chegaria ao
novo século com um PIB superior ao da Comunidade Européia. As fronteiras dos países latino-americanos talvez fossem
redesenhadas.
Apesar disso, as previsões
científicas de Herman Kahn
surpreendem. Ele entendeu o futuro dos computadores, a globalização financeira e a ação de
dispositivos microeletrônicos no
cérebro. Seu livro foi traduzido
no Brasil em pleno Milagre Econômico. Ele previa que Pindorama levaria 130 anos para atingir uma renda per capita de US$
3600. Num país que crescia 10%
ao ano esse número foi considerado um insulto. De 1965 até hoje, em dólares constantes, a renda do brasileiro passou de US$
1060 para US$ 2590 em 2002.
Nesse ritmo, chega-se à marca
de Herman Kahn antes que o
Brasil do conde Gobineau se
acabe.
A comunidade de informações
do governo americano apareceu
com uma previsão para 2020.
Ela acredita que até lá o Brasil
se tornará uma potência exportadora de produtos agrícolas,
perderá importância política na
América Latina e continuará
sendo uma ameaça à estabilidade do sistema financeiro internacional. Essas profecias estão
no documento de 12 páginas divulgado em Washington, que
tocou os brios de alguns parlamentares.
É um trabalho pedestre, com
momentos de brilho. Num deles,
expõe a bomba demográfica
que os governos da região começaram a montar nos anos 90: "A
América Latina corre o risco de
envelhecer sem ter crescido". O
Brasil está entre os países onde o
povo fica mais velho ao mesmo
tempo em que a taxa de natalidade cai e um pedaço da população economicamente ativa vive na informalidade, sem pagar
impostos, esperando receber serviços do governo. (Os últimos
números do IBGE mostram que,
de cada 100 trabalhadores, 43
não têm carteira assinada. Na
herança maldita de FFHH eram
41. Dois são produção do PT Federal.)
O melhor momento da futurologia americana ocorre precisamente quando os sábios condenam o futuro nacional. Segundo
eles, em 2020 o Brasil ainda não
terá terminado de fazer as reformas necessárias para comprar
ingresso no clube do futuro.
Ainda bem. Graças ao povo brasileiro, o tucanato não conseguiu fazer as reformas que o
mercado pedia. Nem Lula conseguiu fazer tudo o que o comissário José Dirceu gostaria de ter
feito. Felizmente, quando o FMI
desceu em Brasília para arrancar de FFHH a dolarização da
economia, o professor Cardoso
mandou-o passear.
Se a futurologia americana
ensina alguma coisa, talvez seja
algo que já se aprendeu com o
conde francês. No século 19, o
que o Brasil precisava era de
mais mulatos. Talvez hoje precise de menos reformas.
Serviço: O estudo do National
Intelligence Council, em inglês,
está listado no seguinte endereço:
http://www.cia.gov/nic/NIC-2020-project.html
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