São Paulo, domingo, 25 de janeiro de 1998.



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'Banheira' tem casco dos anos 40 e 'recheio' dos 90

especial para a Folha

Se insultos afundassem um navio, o navio aeródromo ligeiro "Minas Gerais" já estaria faz tempo no fundo da baía da Guanabara. O xingamento mais caridoso é tachá-lo de obsoleto. "Lata velha", "banheira", "sucata" são outras opções frequentes. Nada disso é correto, embora possa parecer, pois esse navio foi construído no distante 1945.
O que os críticos ignoram é que a idade de um equipamento é apenas um dos parâmetros na sua avaliação. O casco do "Minas Gerais" é do final da Segunda Guerra, mas está em boas condições de manutenção. E, ainda mais importante, o "recheio" do navio, notadamente sua eletrônica de bordo, é da década de 90.
As reformas pelas quais o navio passou tornaram-no capaz de operar com eficiência por mais uma década. Elas incluem a instalação de um moderno sistema de dados de combate computadorizado, capaz de permitir o acompanhamento de 96 "alvos" diferentes ("alvo" é qualquer navio ou avião captado pelos radares).
A mesma equivocada acusação de obsolescência está sendo feita agora contra os caças-bombardeiros americanos A-4 Skyhawk. O equívoco vem também da idade do aparelho -cuja fabricação terminou em 1979, depois de 27 anos e 2.960 aviões produzidos. Os EUA usaram o Skyhawk até 1994.
Trata-se de um avião clássico, extremamente manobrável e fácil de pilotar, tanto que chegou a ser usado pelo esquadrão de treinamento de combate aéreo conhecido como "Top Gun".
E, assim como o navio, o que importa é o "recheio". Os A-4 kuaitianos (designados A-4KU) são baseados no modelo A-4M, uma das versões mais modernas.
De qualquer modo, a Marinha vê o A-4 como um modelo intermediário, capaz de alicerçar a aviação naval de asa fixa, de modo que no futuro possam ser empregados aviões mais modernos.
No passado, a oposição da FAB era o maior obstáculo para a criação da aviação naval de asa fixa. Os tempos mudaram, e hoje só uma minoria de oficiais (muitos deles na reserva) acha que o poder aéreo é "indivisível".
Ao contrário, se livrar de operações embarcadas proporcionará economia à FAB, em um momento delicado, quando muitos de seus aviões estão ficando obsoletos ao mesmo tempo.
A FAB desativou e não substituiu os aviões anti-submarinos Tracker que embarcava no "Minas" -dando com isso mais um argumento à Marinha, que hoje tem um porta-aviões que na prática é só porta-helicópteros.
Entre as prioridades da FAB está a modernização de sua aviação de caça, equipada principalmente com jatos F-5, que precisam com urgência de um "recheio" eletrônico novo (como fizeram os chilenos). Junte-se a isso projetos caros como o Sivam (Sistema de Vigilância da Amazônia), e se nota que para a FAB faz sentido deixar a Marinha se ocupar da aviação naval.
A Marinha argumenta também que a legislação não é mais um obstáculo, pois a lei complementar 69/91, sobre a organização e meios das Forças Armadas, estabelece que cada força tem de contar com os meios adequados para cumprir sua função -e um avião é um simples mas essencial meio, do mesmo modo como um míssil, um canhão ou o arroz e feijão do rancho. (RBN)



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