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ELIO GASPARI
Com vocês, Fernando
Campos Rodrigues
Deve-se agradecer ao professor
Fernando Henrique Cardoso a
sua curta observação de que se vê
como uma mistura de dois presidentes, o paulista Campos Salles
(1898-1902) e o mineiro Juscelino
Kubitschek (1955-1961).
Comentários desse tipo estimulam o interesse pela bela história
do Brasil e elevam o debate político, permitindo que no choque
das opiniões prevaleça o conhecimento sobre a preferência.
FFHH misturou Campos Salles
com JK para facilitar o entendimento de seu projeto. Uma mistura dos dois talvez dê um Inocêncio Oliveira, seja ele o que for.
(Noves fora o fato de JK ter industrializado o país, e FFHH até
agora estar desindustrializando.)
Seu negócio é ter dois mandatos,
um como Campos Salles e outro
como Rodrigues Alves, seu sucessor. O primeiro recebeu o governo
com as finanças em pandarecos.
Seu ministro da Fazenda, Joaquim Murtinho, segurou o crédito, quebrou bancos (com o primeiro Proer da República), cortou dois terços dos investimentos
públicos e estabilizou a economia. O segundo inaugurou um
período de prosperidade que duraria até o fim da Primeira Guerra Mundial.
Assim como JK fez Brasília, Rodrigues Alves abriu a avenida Rio
Branco. O professor Cardoso é
autor de um ensaio de 35 páginas
intitulado "Dos Governos Militares a Prudente-Campos Salles",
publicado no terceiro volume do
período republicano da "História
Geral da Civilização Brasileira".
Não é nenhuma Brastemp, apenas um bom panorama. Deu pouca importância à estabilização
da economia e não citou Joaquim
Murtinho, o que é uma pena. Indiretamente, chamou-o de tecnocrata, numa época em que isso
era insulto e tucano era bicho.
Mesmo reconhecendo virtudes
na administração de Campos Salles, FFHH fixou-se na armação
política que marcou seu governo:
o pacto oligárquico baseado nas
chefias políticas dos Estados. Sua
conclusão foi de que a ossatura
desse pacto era um pobre esqueleto. FFHH ainda não é um Campos Salles. Ambos regularizaram
o crédito externo, ambos apertaram a banca (sem que daí surgisse banqueiro empobrecido). Ambos reduziram a interferência do
governo na economia e venderam
ativos do Estado, mas Campos
Salles mandou a Marinha vender
alguns de seus navios, coisa que
não passa pela praia de FFHH.
Assim como não passa aumentar
tributos, e Campos Salles criou o
primeiro imposto sobre a circulação de mercadorias. Um desvalorizou a moeda (na média) e governou com superávits comerciais, e o outro está fazendo o
contrário. A estabilidade do pai
do pacto oligárquico significou
uma queda na renda "per capita" do brasileiro, mas resultou
no completo controle do déficit
público. Em suma: pisou fundo,
até porque a Constituição lhe
proibia a reeleição.
Olhado pelo desempenho econômico, Campos Salles pode ser
visto como um sucesso, mas,
quando o professor Cardoso escreveu sobre esse período da história republicana concentrou-se
na pobreza elitista do pacto oligárquico. Sem ter feito tanto
quanto seu remoto antecessor,
FFHH sonha com a hora em que
poderá virar Rodrigues Alves,
mandando erguer o Teatro Municipal e trocando Caruaru por
um novo Oswaldo Cruz.
Todas essas recordações podem
parecer inúteis, mas talvez se possa ver melhor o futuro olhando
para o passado. Assim como em
1900, a retórica econômica do governo tem um forte sotaque de
darwinismo social. Joaquim
Murtinho dizia que o destino do
mais fraco é ser comido pelo mais
forte, porque, apesar de toda a
sua dureza, essa é a lei por excelência do progresso.
Hoje estão dizendo coisas parecidas. E é aí que a porca torce o
rabo. Se Campos Salles e Rodrigues Alves foram tão bons, por
que a República Velha deu em
nada? Felizmente, está nas livrarias o trabalho "A Crise Financeira da Abolição", de John
Schulz, formado em história pelas universidades de Yale e Princeton, e instruído na vida do dinheiro nacional como representante de bancos internacionais
no Brasil, entre eles o National
Westminster.
Não é um livro divertido, mas é
uma maravilha de pesquisa e severidade. Além do mais, tem só
158 páginas. Para quem quiser
ficar só com uma de suas conclusões, lá vai:
"Infelizmente, os benefícios derivados do sucesso de Campos Salles foram quase exclusivamente
para a elite. Para os proprietários
de terras, os comerciantes, os industriais e os políticos, o período
1900-1914 pareceu ser uma época
áurea de crescimento. Por outro
lado, não se deve esquecer que a
vasta maioria dos brasileiros
continuou a sofrer os efeitos de
uma lei da terra hostil, da indiferença do governo em relação à
educação e de uma corrupção generalizada. Para o futuro do Brasil se esperaria que as vantagens
surgidas com a estabilidade financeira pudessem ser divididas
mais igualitariamente por todos
os grupos da população".
Foi por isso que o professor Cardoso chamou de pobre esqueleto
a ossatura do pacto oligárquico.
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