São Paulo, quarta-feira, 25 de dezembro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

JUSTIÇA

Procurador-geral pede arquivamento de processos que apontam envolvimento de políticos em importação superfaturada

Brindeiro livra Fleury de inquérito criminal

FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL

O procurador-geral da República, Geraldo Brindeiro, pediu ao STF (Supremo Tribunal Federal) o arquivamento de processo criminal sobre as importações superfaturadas de equipamentos de Israel realizadas -sem licitação- no final do governo de Orestes Quércia (1987-1991).
O arquivamento definitivo do caso foi facilitado pelo foro privilegiado assegurado ao deputado federal Luiz Antônio Fleury Filho (PTB-SP), secretário paulista de Segurança Pública na época das operações fraudulentas. O sucessor de Quércia no governo foi indiciado em inquérito que também será arquivado pelo STF.
O arquivamento foi possível graças a expediente referendado por Brindeiro, que entendeu haver semelhança e conexão entre inquéritos sobre atos distintos de diferentes administrações.
A decisão extingue a acusação de estelionato contra os ex-secretários Luiz Gonzaga Belluzzo (Ciência e Tecnologia) e José Machado de Campos Filho (Fazenda). Também beneficia os intermediários da operação, acusados ainda de falsificação de documentos e evasão de divisas: Arie Halpern, José Carlos Coimbra, Mário Ungar, Avner Schemesh e Yechiel Sharabi, da Sealbrent Limited e da Trace Trading Company.
Em junho de 1991, a Folha revelou que o governo Orestes Quércia firmara oito contratos, no total de US$ 315 milhões, para a importação de equipamentos israelenses para universidades e para as polícias de São Paulo, por meio de operação triangular orquestrada por uma "empresa de papel" (Sealbrent) com sede no paraíso fiscal de Dublin, na Irlanda.
Perícia realizada pelo Serviço de Criminalística da Polícia Federal, com assistência de professores universitários convocados pela Justiça, comprovou o superfaturamento de 343% em um robô importado para a universidade.
Em 1994, o Superior Tribunal de Justiça rejeitou denúncia de estelionato contra Quércia (em maio último, o STF retificou a autuação e emitiu certidão excluindo o nome do ex-governador).
Designado por Brindeiro, o subprocurador-geral Raimundo Francisco Ribeiro de Bonis viu "conexão" entre o inquérito envolvendo Fleury e uma ação penal alcançando os outros dois ex-secretários de Quércia. Bonis reclassificou os crimes para ilícitos de penas menores e opinou pelo arquivamento, por prescrição.
A prescrição é a extinção da punibilidade dos acusados, quando uma ação perde o prazo -o período é calculado com base nos anos da eventual condenação.
O subprocurador-geral Bonis assinou o pedido de arquivamento em 27 de novembro último. Na mesma data, os autos do processo, com oito volumes e 41 anexos, foram entregues ao STF. Dias depois, o subprocurador se aposentaria ao completar 70 anos.
A manifestação de Bonis foi dirigida ao ministro Maurício Correa, relator do inquérito no STF. A decisão foi aprovada pelo procurador-geral da República e não pode ser recusada pelo STF.
O caso exemplifica os expedientes permitidos pelo foro privilegiado. Com base apenas na interpretação daquele representante do Ministério Público Federal, referendada por Brindeiro, será arquivada uma ação criminal cuja denúncia, de 255 páginas, havia sido recebida em 1999 por 15 desembargadores, em votação unânime no Órgão Especial do Tribunal Regional Federal de São Paulo, em sessão que durou 12 horas.
Fleury também se livra de inquérito criminal que se arrastava, sem investigações, desde o início dos anos 90. Ao contrário das compras de equipamentos para as universidades, área de Belluzzo, onde uma perícia judicial comprovou o superfaturamento, não houve empenho para a realização de perícias no material adquirido para a Segurança Pública.
Durante a apuração dos fatos, Belluzzo afirmou que os procedimentos foram regulares e que os contratos foram aprovados pela Cacex e pelo Tribunal de Contas do Estado. Fleury alegou ter feito apenas "despachos interlocutórios" nos processos de importação vinculados à sua pasta.
Na semana passada, a Folha solicitou, sem sucesso, entrevistas ao ministro Maurício Correia, ao procurador Geraldo Brindeiro e ao sub-procurador Raimundo Bonis, por meio das respectivas assessorias. O juiz João Carlos da Rocha Mattos, da 4ª Vara Criminal, que enviou a ação penal para o STF, afirmou que só se manifesta nos autos.


Texto Anterior: Elio Gaspari: Só falta dizer como funcionará a quitanda
Próximo Texto: Investigação rendeu ameaças e afastamentos
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.