|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Fórum Social/Fórum Econômico
DIÁLOGO POSSÍVEL?
Durante encontro com economistas em Davos, presidente do BC reitera intenção de dar autonomia operacional à instituição
Superávit será superior a 4%, diz Meirelles
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A DAVOS
O superávit fiscal primário (receitas menos despesas do governo, excluídos os juros) será neste
ano superior a 4% do PIB (a produção econômica do país) e, portanto, acima da meta de 3,75%
acertada pelo governo de Fernando Henrique Cardoso com o Fundo Monetário Internacional.
O anúncio será feito na próxima
semana, mas foi antecipado ontem aos dez mais renomados economistas que participam do encontro anual 2003 do Fórum Econômico Mundial e tomaram café
da manhã com o presidente do
Banco Central, Henrique Meirelles, e com o assessor internacional da Fazenda, Otaviano Canuto.
O número preciso não foi dito
aos economistas, mas a Folha.
apurou que ele será superior ao
do ano passado, que, por sua vez,
ficou aproximadamente em 4%.
Aos jornalistas, Canuto disse
apenas, como já vem sendo reiteradamente informado, que será
superior à meta originalmente
combinada com o Fundo.
O economista da Fazenda acha
"razoável" chegar a esse número,
porque os fatores que atuaram a
favor de um elevado superávit no
ano passado continuam presentes. Entre eles, a arrecadação tributária em níveis recordes. Embora algumas receitas tenham expirado no ano passado, Canuto
conta com outras tributações extraordinárias para manter uma
receita elevada.
Conta também com "a racionalização de vários gastos". A Folha
observou que racionalização de
gastos é promessa de governo
após governo, sem jamais ocorrer
de fato. "Este governo é diferente", responde Canuto.
Os dois funcionários brasileiros
também comentaram com os
economistas as reformas estruturais que serão feitas, "ainda neste
ano", como a da Previdência e a
tributária. Reiteraram igualmente
que será concedida "autonomia
operacional" para o BC.
Canuto fez questão de explicar
que, embora essas reformas levem algum tempo para produzir
resultados em matéria de redução
de gastos, o governo Lula "não
precisa de resultados imediatos,
porque com o arcabouço de hoje
podemos garantir o superávit primário (deste ano)".
As reformas se destinam a dar,
sempre segundo Canuto, "sustentabilidade" às contas públicas.
Os anúncios dos funcionários
brasileiros soaram como música
aos ouvidos de economistas ortodoxos como os que com eles se
reuniram. Mas todos querem
mais que palavras.
Otimismo
O espírito geral dos interlocutores de Meirelles/Canuto é resumido assim por Alan Blinder, uma
espécie de decano deles, por ser
um acadêmico brilhante e, além
disso, ter sido membro do Conselho de Assessores Econômicos da
Casa Branca e vice-presidente do
Banco Central dos EUA:
"Eles disseram uma porção de
coisas corretas. Mas é preciso ver
a implementação. Eu estou otimista", disse.
Canuto concorda plenamente
que promessas só não resolvem.
"A credibilidade não vai depender apenas de promessas. Terá
que ser construída ao longo deste
ano, que é crucial".
Crucial exatamente porque o
governo Lula está convencido de
que tem força suficiente para tocar de saída as reformas estruturais (previdenciária e tributária).
"O atual governo tem a legitimidade política para fazer as reformas estruturais logo no início da
gestão, porque tem um respaldo
popular que o governo anterior
talvez tenha perdido a partir do
fim do primeiro mandato", acredita o assessor internacional da
Fazenda.
O "timing" da operação credibilidade combina à perfeição com a
avaliação feita pelo anfitrião do
café da manhã, o economista espanhol Guillermo de la Dehesa,
que já foi ministro (no governo
socialista de Felipe González), assessora a firma de investimentos
Goldman Sachs e preside agora o
Centro para Pesquisa de Política
Econômica (Reino Unido).
"De momento, a sustentabilidade da dívida brasileira está conquistada. Agora, vamos ver se as
reformas são de fato feitas, para
que a sustentabilidade se torne
permanente", diz De la Dehesa.
O superávit primário alto se
destina, exatamente, a pagar a dívida, para evitar que a relação entre ela e a produção da economia
(o PIB) se torne excessiva e leve os
credores a suspeitar de um calote.
Foi com essa hipótese que os
mercados financeiros trabalharam durante parte da campanha
eleitoral de 2002, por desconfiar
que um governo Lula adotaria políticas populistas e não a austeridade ontem reiterada.
A percepção mudou tanto que
Martin Wolf, outros dos comensais de ontem, chega a dizer que se
tratou de "maior mudança no humor dos agentes financeiros em
um mês de que me lembre".
Wolf é o principal colunista econômico do jornal britânico "Financial Times" e, como tal, uma
espécie de oráculo dos homens de
negócio e investidores.
Texto Anterior: Policial expulsa reportagem da cidade Próximo Texto: Lei de falências deve baixar juro, diz governo Índice
|