São Paulo, domingo, 26 de março de 2000


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CELSO PINTO
As espertezas e o novo mínimo

A solução para o salário mínimo fechou com uma esperteza política, a de repassar a pressão por aumentos para governos estaduais, uma discussão que havia começado com uma esperteza política do PFL: tentar repassar para o presidente o ônus de vetar um aumento irreal. Mais uma vez, contudo, perdeu-se uma boa oportunidade de discutir a questão social ligada ao mínimo.
O ministro da Fazenda, Pedro Malan, ficou satisfeito com a solução. Para o governo federal, o custo fiscal adicional, de R$ 1 bilhão, é facilmente absorvível.
Os Estados, por sua vez, lembra Malan, terão quatro freios sobre tentações de aumentos excessivos: 1) a Lei de Responsabilidade Fiscal; 2) a Lei Camata (que fixa um teto para gastos com salários); 3) os compromissos dos acordos de renegociação das dívidas com o governo federal; e 4) a pressão dos municípios (em seis Estados, por exemplo, mais de 40% dos funcionários municipais ganham o mínimo e um aumento mais forte seria desastroso).
Existe, contudo, um lado social que continuou intocado. Uma grande parcela dos gastos federais atrelados ao salário mínimo, classificados como pagamentos de inativos, na verdade tem um caráter de renda mínima ou assistência social. É o caso dos 6 milhões de aposentados rurais, que consomem R$ 10 bilhões do déficit de R$ 11 bilhões do INSS. É também o caso do 1,7 milhão de beneficiários do Loas (Lei Orgânica de Assistência Social), que levam R$ 1 bilhão. E os quase 1 milhão que estão no programa de renda mensal vitalícia (R$ 870 milhões).
Quer dizer, para quase 8 milhões de brasileiros, que vivem na franja da pobreza absoluta, aumentos no mínimo têm um impacto direto e positivo. Atingem o público-alvo sem desvios e não desperdiçam dinheiro na intermediação. Malan questiona se programas desse tipo são os mais eficazes na área social. Lembra o argumento de economistas de que faz muito mais sentido dirigir os gastos sociais para programas como a bolsa-escola, que geram soluções a longo prazo, via educação. Para que uma discussão desse tipo decolasse, contudo, seria preciso, primeiro, que o governo deixasse de engordar o déficit indevido dos inativos do INSS e chamasse os gastos pelo novo devido, como o ministro Waldeck Ornélas, da Previdência, prometeu, no ano passado, que faria. Além disso, seria preciso ter vontade política, no Congresso, para discutir fontes fiscais permanentes para cobrir estes gastos.

Sobras fiscais
O que menos preocupa a Fazenda é descobrir como financiar o R$ 1 bilhão adicional com o mínimo a R$ 151,00. A proposta do Congresso para o Orçamento se apropria de ganhos reais e outros irreais, mas a verdade é que um simples decreto do Executivo pode mudar o que tiver sido aprovado pelo Legislativo.
De outro lado, não faltam margens de manobra. Um exemplo: o fato de o PIB ter sido calculado, provisoriamente, usando o IGP-DI, maior do que será o deflator implícito (calcula-se a diferença em 3 pontos percentuais) vai reduzir o PIB nominal de 99.
Como a meta no orçamento da União deste ano é ter um superávit primário de 2,65% do PIB, mas supondo um PIB nominal maior (a partir de uma base nominal maior), pode-se chegar ao mesmo resultado relativo com um gasto menor. Só aí, a Fazenda estima um ganho de R$ 1 bilhão em relação ao estimado.
A Fazenda está cada vez mais convencida, também, de que o PIB pode crescer mais perto de 5% do que de 4% este ano, o que ajudaria pelo lado das receitas. Não se quer mudar a previsão oficial, por enquanto, porque isso implicaria em rediscutir metas nominais de superávit com o FMI. Por falar em FMI, acertou-se com a missão deixar as metas trimestrais de inflação como estão. Com a queda recente da inflação, considerando as previsões de mercado, sumiu o risco de um estouro no segundo trimestre. No terceiro trimestre, o risco é de um estouro de 1,2%, apenas 0,2% acima do limite que exigiria uma conversa com o FMI. Os dois lados concluíram que não valia a pena mexer nas metas por tão pouco.
Para o ano que vem, além das metas trimestrais de inflação passada, serão levados em consideração indicadores antecedentes de inflação futura, dando uma pitada a mais de racionalidade para as metas.

Fazenda X BC
Não fez nenhum sucesso na Fazenda o superconservadorismo do Banco Central no Copom ao não mexer nos juros. Com um enorme superávit primário de R$ 4 bilhões em janeiro; déficit nominal anual caindo para 4,6% do PIB; deflação; petróleo a US$ 26 o barril; câmbio querendo bater em R$ 1,70; nenhuma ameaça no mínimo (o presidente sempre pode vetar qualquer solução indesejada); e nenhum sinal de vida na demanda; por que não baixar os juros? Um corte de 0,5% no juro, se mantido por 12 meses, daria uma economia de R$ 2,5 bilhões, ou 2,5 vezes a conta adicional do mínimo.









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