São Paulo, terça, 26 de maio de 1998

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NORDESTE
Relatório contraria tese do governo de que haveria motivação política em ações realizadas na região
MST agiu em 9 de 46 saques do NE, diz PF

MARTA SALOMON
da Sucursal de Brasília

Relatório da Coordenação de Inteligência da Polícia Federal contraria a tese do governo Fernando Henrique Cardoso que atribui ao MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) a autoria da maioria dos saques ocorridos no Nordeste.
O relatório -levado ao ministro da Justiça, Renan Calheiros, no final de semana, e obtido pela Folha- relaciona 46 saques em oito Estados no período de pouco mais de dez semanas, entre 10 de março e 22 de maio. Apenas 9 deles aparecem vinculados a líderes do MST.
No Ceará, Estado em que foi computado o maior número de ocorrências, a inteligência da Polícia Federal atribui os saques a "agricultores famintos", "homens", "agricultores", "pessoas", "flagelados".
Apenas num dos saques, ocorrido no dia 12 de maio no município de Santa Quitéria, aparece a participação de um membro do MST: o petista Hermelino Paiva Paulino.
Junto com Paulino, teriam sido presas outras cinco pessoas. O grupo, acusado de liderar 1.000 agricultores que promoviam saques na cidade, incluiu um vereador do PSDB , Raimundo Nonato Araújo Moura. A Folha não conseguiu localizar o vereador.
Em outro dos 17 saques ocorridos no Ceará, a Polícia Federal relata que 300 flagelados levaram cinco toneladas de alimentos de um depósito municipal em Cedros. "Segundo a polícia, não houve a participação do MST", afirma o relatório.
Os termos "agricultores famintos" se repetem na autoria de 3 dos 12 saques ocorridos na Paraíba. Uma coincidência: todos os saques no Estado atingiram depósitos de alimentos destinados à merenda escolar. Não há nenhuma menção ao MST nesse capítulo.
Entre os responsáveis por um dos saques, aparece no relatório o nome de dom Marcelo Pinto Carvalheira, arcebispo da Paraíba, ao lado dos nomes de frei Anastácio Ribeiro, coordenador da Pastoral da Terra, e do padre Luiz Albuquerque Couto, deputado estadual pelo PT.
Pernambuco, o Estado que mais preocupa as autoridades federais, aparece em terceiro lugar em número de ocorrências registradas pela Polícia Federal. A autoria de 3 dos 10 saques é atribuída diretamente a líderes locais do MST.
A ação do movimento dos trabalhadores sem terra se mostra mais forte, proporcionalmente, na Bahia e no Rio Grande do Norte.
Os dois saques registrados na Bahia são atribuídos à ação do MST. Esse capítulo do relatório da Polícia Federal afirma que novos saques a supermercados, armazéns e depósitos do governo vão ocorrer na Bahia, segundo teria sido combinado em reunião com dirigentes do MST presidida por Ademar Bogo, membro da coordenação nacional do movimento.
No Rio Grande do Norte, 2 dos 3 saques teriam sido coordenados pelo MST.

Ministério
Ouvido pela Folha no início da noite de ontem, o ministro Renan Calheiros disse que, apesar do relatório da Polícia Federal, o governo mantém a avaliação de que todos os saques foram organizados "pelo MST ou por sindicatos instrumentalizados pelo MST".
O ministro disse que não pode revelar a origem da informação sobre a motivação política dos saques, que contraria o relatório feito por um órgão vinculado ao próprio Ministério da Justiça.
Os relatórios da PF são assinados pelo coordenador de inteligência, delegado Bernardino Ayer Fortes de Matos.



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