|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
"Quero de volta o dinheiro confiscado do meu avô"
da Reportagem Local
Em 1942, mal soube que Getúlio
Vargas aderira à guerra contra o
Eixo, Fritz Johannes Friedrich
comprou uma bandeira verde-amarela para comemorar.
Mesmo morando na Suíça, cultivava íntimas relações com o Brasil.
Entre 1904 e 1906, trabalhou como
comerciante em São Paulo, onde
aprendeu português.
Retornou à cidade durante a década de 20. Vislumbrou um mercado emergente e, com o amigo
alemão Ricardo Buchholtz, abriu
uma loja de tecidos na rua Direita
(centro). Da Europa, administrava
o negócio.
Depois que o sócio morreu, em
1933, fundou outra loja, na rua Barão de Itapetininga, desta vez com
o brasileiro Antonio Furtado
Äque, detendo 60% das ações,
emprestou o nome para o estabelecimento.
Foi, portanto, uma enorme decepção descobrir, em 1944, que o
Estado Novo iria expropriá-lo.
Friedrich nunca entendeu direito
o motivo.
Reinvestia no Brasil boa parte do
lucro que tirava da A. Furtado &
Cia. Ägesto pouco provável para
um inimigo do país, como agora o
decreto 4.166 o qualificava.
"Súdito do Eixo" lhe parecia
um rótulo ainda mais absurdo.
Não vivia na Alemanha desde
1915. Trocou-a por Zurique quando, convocado pelo Exército, se
negou a participar da Primeira
Guerra.
Com a ascensão nazista, rejeitou
definitivamente a nacionalidade
alemã. Tornou-se refugiado israelita porque as leis do Terceiro
Reich o consideravam judeu
Äembora, àquela altura, ele já tivesse abandonado as tradições de
seus antepassados e professasse o
cristianismo. Tentou se naturalizar suíço, sem sucesso.
Até morrer, em dezembro de
1957, acreditou que poderia resgatar a quantia sequestrada pela ditadura de Vargas.
Chegou a se comunicar, por carta, com advogados de São Paulo.
Enviou a primeira em 1947 e uma
outra, seis anos depois. Não conseguiu nem sequer saber onde o
governo depositara o dinheiro.
Apenas em 1964 é que o mistério
se esclareceu. O advogado e consultor financeiro Hansjurg Brumann, neto de Friedrich, retomou
a procura e recebeu uma correspondência do Banco do Brasil.
Descobriu, então, que a renda
confiscada se encontrava lá. E que
somava, na época do sequestro,
Cr$ 202.668,20 Äo que equivaleria atualmente a cerca de US$ 85
mil, levando-se em conta a inflação norte-americana.
Brumann tenta recuperá-la há 34
anos. Já contatou o Consulado da
Alemanha em São Paulo, a Embaixada da Suíça e o Banco Central.
Desde novembro de 1997, o caso
está na Comissão de Apuração de
Patrimônios Nazistas, subordinada à Secretaria Nacional de Direitos Humanos, mas ainda não entrou em discussão.
O que ninguém informou a Brumann é que, por duas ocasiões, o
Brasil determinou regras para devolver os bens confiscados.
Um decreto presidencial de 1956
previa a restituição dentro de dois
anos Äprazo que acabou prorrogado diversas vezes.
Em 1974, a lei 6.122 estabeleceu
que os interessados teriam mais
cinco anos para exercer o direito
do resgate.
Os bens não recuperados naquele período passaram a pertencer à
União. Hoje, permanecem sob a
guarda do Banco do Brasil, só que
estão em processo de transferência para o Tesouro Nacional. Não
há um cálculo preciso de quanto
valem.
Por telefone, de Zurique, Brumann, 61, disse que continuará
brigando pelo dinheiro Äe que
não descarta a possibilidade de
reivindicá-lo judicialmente.
"Já ficaria satisfeito se conseguisse reaver a quantia original,
sem reajustes. Quero apenas reparar a injustiça contra meu avô."
(AA)
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
|