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São Paulo, quinta-feira, 26 de junho de 2003

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DESIGUALDADE

Representante no Brasil em órgão da ONU ataca a eficácia dos programas de transferência de renda no país

Falta política social ao governo, afirma Unicef

GABRIELA ATHIAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A representante do Unicef (fundo da ONU para a infância) no Brasil, Reiko Nimi, fez ontem críticas aos programas sociais do governo federal e afirmou que o país não tem mecanismos suficientes para erradicar a pobreza.
A japonesa Nimi, 45, deu entrevista à Folha ontem, dia em que o Unicef lançou estudo sobre os efeitos da desigualdade no país sobre a infância.
Nimi, que chefia a representação do órgão há quatro anos, criticou a eficácia de programas de transferência de renda, base da política social aplicada nos mandatos de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) e por enquanto a principal ferramenta do setor no governo Luiz Inácio Lula da Silva.
A seguir, trechos da entrevista.
 

Folha - O governo brasileiro vem trabalhando para reduzir a exclusão social por meio de programas de transferência de renda, como o Bolsa-Escola. Isso é suficiente?
Reiko Nimi -
É um bom início, mas não é o suficiente. Nós definimos pobreza e desigualdade com indicadores que ultrapassam o indicador financeiro. Falamos de indicadores sociais que requerem investimento de longo prazo. Não é uma transferência de R$ 15 que vai mudar a situação das famílias, o nível de educação da mãe, dos filhos e nem assegurar saúde.

Folha - Aumentar o valor repassado às famílias, como quer o governo, não vai resolver o problema?
Nimi -
Com base na transferência de renda podem ser construídas outras ações. O Bolsa-Escola dá mais certo, e isso se traduz na melhoria do desempenho escolar dos alunos, em municípios onde há ações complementares que estimulam a permanência na escola. Quem recebe bolsa também precisa de serviços sanitários e odontológicos gratuitos. Esse é um exemplo de complementaridade que vai além da transferência de renda.

Folha - Como a senhora avalia a decisão do governo de unificar os programas sociais?
Nimi
- Melhora a eficiência dos programas, mas estamos preocupados porque enquanto estão rearrumando as coisas, crianças que estavam recebendo bolsas em anos anteriores para deixar de trabalhar nos lixões, por exemplo, não estão mais.

Folha - O Brasil tem conseguido reduzir a pobreza de forma estrutural?
Nimi
- O conceito de pobreza é difícil. Indicadores como a mortalidade infantil estão melhorando. Mas isso não é igual à redução de pobreza porque teríamos de pensar além da sobrevivência diária das famílias. Os programas de transferência de renda impedem que as pessoas morram de fome. Mas só com ações complementares dá para investir no desenvolvimento humano.

Folha - Como a senhora avalia o Fome Zero?
Nimi
- Temos a logomarca do Fome Zero na campanha do aleitamento materno. O Unicef não entra no Brasil com distribuição de comida. Um aspecto importante do programa é a valorização do registro de nascimento.

Folha - As ações que a senhora chama de complementares estão sendo feitas?
Nimi
- Os esforços estão sendo feitos, mas não é sistemático e não chegou a ser uma política pública. Este novo governo ainda não se posicionou sobre isso, ainda está tentando entender a situação. Ainda não colocou um novo programa dizendo: vai ser assim. Está estudando, pesquisando, examinando, ouvindo.

Folha - O governo é lento?
Nimi
- A expectativa é grande para que o presidente Lula tome atitude.


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