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INVESTIGAÇÃO
Marivonne Caillibotte afirma em entrevista à BBC que a Justiça francesa investiga se houve "lavagem de dinheiro"
Juíza diz que conta de Maluf foi bloqueada
ROBERTO COSSO
ENVIADO ESPECIAL A PARIS
O saldo da conta bancária do ex-prefeito paulistano Paulo Maluf
na agência do Crédit Agricole, em
Paris, ficará bloqueado durante
todo o processo de investigação
da Justiça francesa, afirmou ontem a juíza Marivonne Caillibotte,
responsável pelo serviço de comunicação do Tribunal de Grande Instância de Paris, durante entrevista à BBC.
Caillibotte afirmou que o saldo
da conta é de US$ 1,8 milhão e que
o valor poderá ficar bloqueado
"durante meses e até mesmo vários anos, dependendo do desenrolar das investigações".
De acordo com Caillibotte, o
Tribunal de Paris considerou importante bloquear imediatamente
o dinheiro de Maluf, para evitar
que o montante, eventualmente,
deixe o território francês.
A juíza afirmou que a Justiça
francesa investiga a possibilidade
de ter havido "lavagem de dinheiro em bando organizado" nas
operações financeiras realizadas
pelo ex-prefeito e ex-governador.
A juíza diz ainda que a utilização da expressão "bando organizado" decorre da possibilidade de
outras pessoas estarem envolvidas em uma eventual operação de
lavagem de dinheiro.
Transações financeiras feitas
pelo ex-prefeito no banco Crédit
Agricole são objeto de investigações da Justiça francesa desde
maio deste ano. É um procedimento de averiguação preliminar.
A informação é da agência de
inteligência financeira da França,
chamada Tracfin (Traitement du
Renseignement et Action contre
les Circuits Financiers Clandestins), órgão responsável pelo
combate à lavagem de dinheiro.
Depósito
Conforme a Folha revelou na
edição de 28 de junho, Maluf
abriu uma conta em janeiro deste
ano em uma agência do Crédit
Agricole, em Paris. Em 16 de abril,
a conta recebeu um depósito no
valor de US$ 1.455.321,50, proveniente da Fundação Blackbird.
Na época, Maluf confirmou a
existência da conta e o recebimento do depósito originário da
Fundação Blackbird, sem justificar a origem dos recursos da empresa. Ele disse também que enviou legalmente do Brasil cerca de
US$ 350 mil para a conta, dinheiro proveniente da venda de terrenos com prédios em São Paulo,
cujas remessas estão registradas
no Banco Central do Brasil.
Segundo documento enviado
ao Brasil pelo Tracfin, a Fundação
Blackbird é uma empresa "offshore" em Liechtenstein (paraíso
fiscal na Europa). Esse tipo de empresa tem ações ao portador e os
nomes de seus donos não ficam
registrados em nenhum lugar.
Mas, de acordo com o documento, o serviço de inteligência
francês identificou que Flávio
Maluf, filho do ex-prefeito, seria o
beneficiário da empresa. O advogado Ricardo Tosto, que representa Maluf e Flávio, confirmou
que a empresa "offshore" pertence a Flávio Maluf. Apesar disso,
ela não está declarada no Imposto
de Renda do filho do ex-prefeito.
A Fundação Blackbird possui
uma conta no banco Barings, em
Genebra (Suíça). Dessa conta saiu
o depósito de US$ 1,4 milhão recebido por Maluf. Mas a origem dos
recursos da Fundação Blackbird
jamais foi esclarecida pela família
de Maluf. Esse foi o tema do depoimento prestado por Maluf na
quinta-feira em Paris, quando ele
foi detido pelas autoridades de
combate à lavagem de dinheiro.
Maluf nega ter sido detido. Ele
diz que apenas aceitou um convite para prestar esclarecimentos, o
que fez espontaneamente. O
Tracfin informou porém que Maluf prestou depoimento "por
obrigação legal" e que não o fez
espontaneamente. A informação
foi confirmada pela Direção Geral
da Polícia Nacional, órgão do Ministério do Interior francês.
Maluf foi interrogado por cerca
de quatro horas, mas ficou à disposição das autoridades francesas
por quase 11 horas. Foi detido às
10h40 e somente conseguiu ser liberado por volta das 21h. Ao ser
interpelado pela polícia fazendária, Maluf exibiu dois passaportes
brasileiros diplomáticos (concedidos em razão de sua condição
de ex-governador, ex-prefeito e,
na época, presidente do PPB).
Os policiais consultaram o Ministério das Relações Exteriores
francês, que contactou a embaixada brasileira para saber se Maluf
estava na França em missão diplomática ou viagem oficial.
Diante da negativa, o governo
francês informou aos policiais
que não havia impedimento para
que o casal fosse detido.
Investigação
O caso começou quando o banco Crédit Agricole suspeitou do
depósito de US$ 1,4 milhão recebido por Maluf e informou o fato
ao Tracfin. A legislação francesa
obriga que os bancos notifiquem
as autoridades sobre operações
suspeitas. O banco destacou ontem essa obrigação em nota.
A partir da comunicação do
banco, o Tracfin iniciou a investigação, em colaboração com o juízo de instrução de cuida dos casos
de lavagem de dinheiro. Justamente por estar acompanhando o
caso, o juiz de instrução Henri
Pons determinou que Maluf fosse
detido anteontem. Por ter cumprido a determinação judicial, o
Crédit Agricole afirmou que "se
limitou a seguir as instruções das
autoridades judiciárias".
Nessa fase, o procedimento de
averiguação preliminar investiga
fatos, não pessoas. Por isso Maluf
foi liberado após prestar depoimento. Ao longo das investigações, o juiz Pons poderá atribuir
responsabilidades a pessoas determinadas e, então, transformar
o procedimento em um inquérito.
Colaboraram FERNANDO EICHENBERG,
free-lance para a Folha, em Paris, e
JOÃO NOVAES, free-lance para a Folha
Online, em Paris
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