São Paulo, domingo, 26 de julho de 2009

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Pela 4ª vez, irmã de desaparecido procura ossada

PEDRO DIAS LEITE
ENVIADO ESPECIAL A SÃO GERALDO DO ARAGUAIA (PA)

É num pequeno pedaço de terra entre uma limeira, uma touceira de açaí e uma taboca, como o bambu é conhecido na região, que descansa a paz de Mercê de Castro, 49. Depois de quase 30 anos de busca, ela diz ter certeza que é ali que está enterrado o corpo de seu irmão Antônio Teodoro de Castro, o Raul da guerrilha do Araguaia.
A certeza vem do testemunho do guia que estava com os militares na hora em que seu irmão foi executado, em 1974, um senhor chamado Isaías, que jamais havia contado a história.
Isaías acompanhava Sebastião Curió Rodrigues de Moura, o major Curió, quando Raul, então com 28 anos, foi executado, ao lado de outro guerrilheiro, Cilon da Cunha Brun, o Simão, da mesma idade.
A narrativa bate com a versão dos moradores, de que eles foram executados juntos. A história militar diz que eles teriam sido mortos com outros guerrilheiros. A escavação, que deve começar no mês que vem, pode elucidar a questão: o general que comanda a logística da operação, Mário Lúcio de Araújo, disse que a clareza e a precisão das indicações tornam esse um "ponto quente".
É a quarta vez que Mercê visita a região. Na primeira, em 1980, saiu frustrada. Agora, com revelações recentes do major Curió, ela deixou sua casa, em Curitiba, e viajou de carro, com o marido e a filha, os 3.000 km até São Geraldo do Araguaia, no Pará.
Quando chegou, não foi falar com o grupo de busca que acabara de chegar à região. Bateu de porta em porta até chegar a Isaías, que só falou depois de muita insistência. Com a ajuda da Associação dos Torturados na Guerrilha do Araguaia, conseguiu que a comissão de buscas escavasse o local onde ela diz que o irmão está enterrado.
A reconstituição das últimas horas de Raul emocionou Mercê. Ao meio-dia de uma quarta-feira, o irmão, abatido pela malária, era conduzido, junto com o guerrilheiro Simão, por Curió, o sargento do Exército Joaquim Arthur, conhecido como sargento Ivan, e o guia Isaías.
No caminho Raul xingava muito Simão, que, preso, torturado e com esperança de ser libertado, havia levado os militares a um ponto de encontro. Ainda cuspiu em Curió, o que foi o estopim, segundo Isaías, para um tiro de fuzil na cabeça.
Mercê agora trata o tema como encerrado. "Limpei o nome do meu irmão." Em 1993, Raul apareceu numa lista de justiçados pela guerrilha, o que hoje é descartado por estudiosos.


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