São Paulo, terça-feira, 26 de setembro de 2000

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QUESTÃO AGRÁRIA
Estudo da FAO aponta que assistência e infra-estrutura são fatores que também determinam o sucesso do projeto
Falta de recursos atrapalha assentamentos

LISANDRA PARAGUASSÚ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O principal item das negociações entre o governo e o MST -a concessão de crédito mais barato a um grupo de 110 mil assentados- é um dos nós do modelo de reforma agrária brasileiro. O dinheiro é pouco e os assentados que esperam por ele, muitos. Mas a falta de recursos não é o único ingrediente a determinar o sucesso ou o fracasso dos projetos.
As 110 mil famílias que protestam hoje são as que, entre quase 600 mil assentadas, receberam os recursos do Pronaf A (Programa Nacional de Agricultura Familiar) -em que os assentados têm desconto de 40% na hora de pagar, três anos de carência e juros de 1,15% ao ano.
Agora, não querem passar para o Pronaf C, com desconto menor e juros de 3% ao ano -principalmente porque os bancos que emprestam esses recursos exigem avalistas ou garantias, coisa que poucos assentados têm para dar.
Do outro lado, cerca de 300 mil famílias ainda não receberam nem mesmo o Pronaf A.
O acesso à assistência e aos financiamentos -dois pontos que ainda não foram resolvidos- são apontados em uma pesquisa da FAO (Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação) como essenciais para que um assentamento tenha chances de se desenvolver.
Principalmente porque nem sempre a terra é fértil ou tem água suficiente -fator que aparece como o mais importante para o sucesso.
No estudo "Fatores que Afetam o Desenvolvimento dos Assentamentos", a FAO visitou 20 projetos, dez considerados bons pelo Incra, e os outros, ruins. Entre os últimos, em seis o problema era a terra.
"Em casos como esses, um plano de desenvolvimento é essencial, porque, às vezes a terra não é boa para plantar, mas pode ser para piscicultura. É preciso descobrir a sua vocação", afirma Marcelo Silva, diretor de desenvolvimento do Ministério do Desenvolvimento Agrário.

Plano
Desde 1998, o ministério exige dos assentados um plano para que se defina o que pode ser feito no assentamento.
Porém, para colocar em prática o plano é necessário esperar pelos recursos de investimento -que nem sempre chegam com regularidade.
Terra boa, recurso, assistência, infra-estrutura, organização dos assentados e acesso a um mercado consumidor foram apontados no estudo como os pontos principais do sucesso de um projeto. Até hoje, dos 1.561 projetos que poderiam estar emancipados, apenas 147, com 74 mil famílias, já receberam os títulos.
"O nosso dinheiro é escasso", afirma Silva. "Precisamos que alguns assentados avancem para o Pronaf C para que possamos dar o A para os que faltam."
O Pronaf A entrou no lugar do antigo Procera (Programa de Crédito Especial para a Reforma Agrária), em que o assentado recebia recursos para implantação e mais R$ 2.000 para custeio, com juros de 3% e um desconto de 50%.
A principal diferença é que o Pronaf A pode ser recebido apenas uma vez, e os recursos para custeio do Procera poderiam ser retirados todos os anos.
Um estudo feito pela FAO mostra que, criado em 1985 para ajudar os assentamentos a se emanciparem, o Procera não funcionou.
As razões: o alto desconto para pagamento, a falta de punição para os que não pagavam, a indiferença dos bancos quanto à qualidade dos projetos, a ausência de assistência técnica e a total falta de fiscalização.
As dificuldades do programa, no entanto, não estavam apenas no lado dos agricultores. A falta de assistência técnica prejudicava o avanço dos assentamentos.
"O assentado não conseguia fazer um bom plano, não recebia o dinheiro, ou recebia e investia mal por desconhecimento e acabava perdendo tudo", diz Carlos Guanziroli, da FAO.



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