São Paulo, segunda-feira, 26 de dezembro de 2005

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SÃO PAULO

Nossa Caixa fez propaganda com duas agências sem contrato; Promotoria apura suposto favorecimento a deputados

Publicidade de banco estadual é investigada

FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL

O Ministério Público do Estado de São Paulo vai investigar a suspeita de favorecimento, por meio da veiculação de publicidade da Nossa Caixa, a deputados estaduais alinhados com o governador tucano Geraldo Alckmin.
O suposto esquema foi apontado em denúncia anônima ao procurador-geral de Justiça, Rodrigo César Rebello Pinho, sobre irregularidades na publicidade do único banco público estadual.
Durante um ano e nove meses, a Nossa Caixa operou com duas agências de publicidade sem contrato firmado. Uma sindicância interna -aberta há cinco meses pela direção do banco- ainda não apontou os responsáveis pela situação irregular dos contratos com as agências Colucci & Associados Propaganda Ltda. e a Full Jazz Comunicação e Propaganda Ltda. Juntas, elas respondiam por uma conta de R$ 28 milhões.
A denúncia recebida pelo Ministério Público sugere a investigação de dois pontos: a) as agências sacariam dinheiro adiantado da verba de publicidade do Estado; b) deputados alinhados com o governo paulista, ligados a revistas e a emissoras de rádio e de TV, teriam sido beneficiados na distribuição de recursos para publicidade do banco.
A instituição nega as práticas apontadas e refuta a suspeita de favorecimento a parlamentares para reforçar o apoio a Alckmin. Mas não permitiu o acesso aos documentos da sindicância.
O presidente da Nossa Caixa, Carlos Eduardo Monteiro, diz que não recebeu nenhuma solicitação do Palácio dos Bandeirantes para beneficiar parlamentares. "Eu recebo muitos deputados e prefeitos, mas a interferência do governador aqui é zero", afirmou.
"Houve um desarranjo administrativo, isso não poderia acontecer. É uma irregularidade formal séria", disse Monteiro, ao comentar a questão dos contratos. Ele afirmou que, ao tomar conhecimento da distorção, em junho, pediu imediatamente uma auditoria interna para levantar os gastos de publicidade: "Não há despesas não justificadas nem despesas acima dos padrões."
Os contratos com as duas agências venceram em setembro de 2003. Até julho último, quando suspendeu os serviços, o banco promoveu seus produtos, com a Full Jazz, e sua imagem institucional, com a Colucci, sem a prorrogação formal dos contratos e sem realizar uma nova licitação. Em junho, os serviços da Full Jazz totalizaram R$ 1,5 milhão e os da Colucci, R$1,4 milhão.
A Colucci questiona na Justiça o rompimento e nega as acusações da denúncia. A Full Jazz, procurada pela Folha, não se manifestou.
O procurador-geral Rebello Pinho confirmou que a denúncia foi distribuída à Promotoria da Cidadania. O Ministério Público vai pedir informações à Nossa Caixa e requisitar cópia da sindicância interna. "Ainda não dá para fazer nenhum juízo de valor", disse Rebello Pinho.
O Ministério Público Estadual foi alertado para a circunstância de que Monteiro poderia estar agindo como investigador e investigado, pois foi diretor-jurídico do banco, de janeiro a outubro de 2004, antes de assumir a presidência. A informação anônima aos procuradores relata que o gerente de Marketing da Nossa Caixa, Jaime de Castro Júnior, afastado do cargo por Monteiro, teria avisado várias vezes o atual presidente e seu antecessor, Valderi Frota de Albuquerque, de que os contratos estavam vencidos, circunstância que teria sido ignorada por ambos.
"Eu tento não interferir na sindicância, até porque ele [Castro Júnior] é vinculado a mim", diz Monteiro. A denúncia ao Ministério Público Estadual sugere que o gerente de marketing poderá ser apontado como único responsável, espécie de "bode expiatório". O presidente da Nossa Caixa diz que aguarda o resultado da sindicância. "Mas, aparentemente, a responsabilidade é dele, pois ele era o gestor do contrato."
Castro Júnior foi procurado pela Folha e se recusou a informar os argumentos da defesa que ofereceu à comissão de sindicância. Albuquerque não foi localizado.
Em 29 de junho, Monteiro distribuiu à diretoria circular sobre "fato grave que está acontecendo em contratos de prestação de serviços cuja alçada é de nossa diretoria". No documento, relatou que recebera pedido para encontro com Castro Júnior em um hotel. Disse que o gerente, acompanhado de uma funcionária, estava "transtornado" quando lhe informou que os contratos estavam vencidos e que, "apesar das iniciativas para para sua prorrogação antes do vencimento", os atos formais não haviam sido adotados ("submissão às alçadas competentes para aprovação, formalização dos respectivos instrumentos, publicação, encaminhamento ao TCE etc.", revela o documento).
Monteiro pediu a presença no local de um diretor da Nossa Caixa. Dias depois, afastou Castro Júnior e a funcionária, instituiu comissão de inquérito e determinou suspender a prestação de serviços pelas agências e o pagamento de serviços já prestados, até a realização de estudos. E mandou providenciar a elaboração de edital para contratar novas agências, com recursos ampliados para R$ 40 milhões (R$ 23 milhões para a publicidade comercial e R$ 17 milhões para a publicidade institucional e legal).


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