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Diálogos interceptados pela PF indicam doações ilegais
Executivos da Camargo Corrêa falam sobre repasses "por fora"; empresa não comentou
Segundo a interpretação
dos investigadores, nomes
de animais eram usados em
referência aos países das
remessas internacionais
MARIO CESAR CARVALHO
LILIAN CHRISTOFOLETTI
DA REPORTAGEM LOCAL
A transcrição de conversas
telefônicas de diretores da Camargo Corrêa aponta que a empreiteira fez doações ilegais a
partidos políticos, segundo interpretação da Polícia Federal
e do Ministério Público Federal. Há mais de 30 conversas
em que os executivos falam de
contribuições a partidos "por
dentro" e "por fora" e de entrega de dinheiro "em espécie".
Em setembro do ano passado, às vésperas das eleições municipais, um diretor da empreiteira, Pietro Giavina Bianchi,
trava o seguinte diálogo com
uma pessoa chamada Marcelo:
Pietro: "Sim... mas o que que
é, campanha política?"
Marcelo: "É..."
Pietro: "Por dentro?"
Marcelo: "Não...".
Noutra conversa, de janeiro
deste ano, o mesmo Pietro conversa com um diretor da empreiteira chamado Fernando
Dias Gomes. Ele explica que a
lista com as doações está "numa pasta de eleições": "E lá tem
todos os caras que foram pagos" (...), "inclusive a colaboração oficial". E conclui: "Tem as
duas, né? Tem as duas, tá?".
A procuradora Karen Kahn
diz que as conversas revelam
"indícios robustos" da existência de doações legais e ilegais.
Quatro diretores da Camargo
Corrêa foram presos anteontem pela PF na Operação Castelo de Areia, sob a suspeita de
terem praticado os seguintes
crimes: remessa ilegal de dólares, superfaturamento de obras
públicas e lavagem de dinheiro.
A PF encontrou menções de
doações a PSDB, DEM, PPS,
PSB, PDT, PP e PMDB.
No diálogo sobre as duas listas, o diretor Dias Gomes diz
que ligou porque o deputado federal José Carlos Aleluia
(DEM-BA) quer "saber se foi
pago alguma coisa no passado".
"Mas pagamos, não?", pergunta
Pietro. Não há doação oficial da
empreiteira para Aleluia. O deputado diz jamais ter recebido
qualquer doação ilegal.
A Camargo Corrêa não quis
comentar os diálogos ontem.
Pietro é o mais frequente interlocutor nas conversas sobre
doações. Em janeiro deste ano,
ele diz a Dias Gomes: "(...) porque tudo isso é por dentro, né,
não tem nenhum problema de
poder falar isso no telefone".
O grupo não prima pela organização, como nota o próprio
Pietro. Ao relatar para Dárcio
Brunato, também diretor da
Camargo Corrêa, que o presidente da Fiesp (Federação das
Indústrias do Estado de São
Paulo), Paulo Skaf, teria afirmado "que não recebeu dinheiro nenhum", Pietro desabafa:
"(...) puta zona tá isso lá".
Pietro detalha a Fernando
Arruda Botelho, diretor da empreiteira, a doação via Fiesp:
"Foi dado o dinheiro"?, pergunta Arruda Botelho. "Foi... foi
passado lá pro pessoal de Brasília... contataram com o menino
lá da Fiesp... e eles dividiram
lá... mandaram uma parte para
o PSDB, outra parte para o PS...
tem uma distribuição que fizeram em Brasília..."
A Fiesp diz que é uma entidade apolítica, que não intermedeia doações a políticos.
Num diálogo sobre o envio de
dinheiro para Recife, onde a
empreiteira integra o consórcio que constrói a Refinaria do
Nordeste para a Petrobras, os
executivos reclamam da dificuldade de mandar "dinheiro
em espécie" para lá. O Tribunal
de Contas da União apontou
superfaturamento na obra.
Segurança com as conversas
é uma obsessão entre os diretores da Camargo Corrêa. Eles recorrem a telefones públicos,
usam Skype (telefonia via internet), telefone criptografado
(com códigos que impediria escutas), associado a "roaming"
(fora da área original).
Os códigos usados para as remessas internacionais remetem a um zoológico. Em vez de
citar nomes dos que vão receber as remessas, os executivos e
doleiros falam em nomes de
animais. Arruda Botelho pergunta, em setembro, ao suposto
doleiro Kurt Paul Pickel: "Tá
bom, e você recebeu o negócio
do canguru?". Noutra conversa,
falam de "Austrália" e "1.200
milhas" -possível referência a
valores. Também são citados
camelo, cachorro e vaca.
Kurt parece brincar com o
código numa conversa com
Pietro em que parece pedir dinheiro à empreiteira: "Professor, o canarinho aqui está precisando de alpiste".
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