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DISPUTA FEDERATIVA
Nota divulgada após reunião e assinada por 24 dos 27 governadores trata indiretamente da dívida
Planalto manobra, e Estados aliviam pressão
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O Palácio do Planalto não conseguiu evitar que os governadores, reunidos ontem em Brasília,
abordassem a proposta de renegociação das dívidas de R$ 271 bilhões dos Estados com a União.
Em uma operação de bastidores,
no entanto, o governo manobrou
para que a nota oficial do encontro não trouxesse uma cobrança
direta pela medida.
Embora tenha sido uma promessa de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a renegociação das dívidas estaduais
é hoje vetada por sua equipe econômica. Desde a vitória eleitoral
de Lula, o tema tem sido motivo
de conflito com os governadores.
Eles divulgaram ontem um documento com oito pontos, todos
de reivindicações ao presidente.
Pediram a "urgente retomada do
crescimento com elevação dos níveis de emprego e renda".
Depois de acirradas discussões
entre os governadores, a dívida
mereceu apenas uma breve menção na nota, ao final do terceiro
item: "Recomposição das receitas
estaduais e municipais, que ao
longo dos últimos governos se deterioram [...], agravada pela interpretação vigente no que diz respeito ao conceito de receita líquida real. Esse assunto será aprofundado em futura reunião com o
presidente da República".
Trata-se de uma referência à
reunião da semana passada dos
governadores do PMDB, na qual
foi pedida a revisão do cálculo da
receita líquida real -hoje, os pagamentos de juros à União são
definidos em percentuais dessa
receita líquida; na maioria dos casos, é de 11% a 15%.
A nota é assinada por 24 dos 27
governadores presentes ao encontro, além de dois vices (do
Distrito Federal e do Rio Grande
do Norte). Fora o problema da dívida, o texto limitou-se a tratar de
pleitos antigos dos Estados, como
o aumento dos repasses federais e
uma maior participação no bolo
tributário nacional.
Tucanos ajudam Lula
Segundo a Folha apurou, a discussão sobre a renegociação da
dívida dividiu os Estados e levou a
reunião, iniciada às 14h30, a se arrastar até por volta das 18h30. O
governo contou com apoio decisivo dos governadores tucanos, em
especial de Aécio Neves (MG) e
Geraldo Alckmin (SP).
Os peemedebistas Rosinha Matheus (RJ) e Roberto Requião
(PR) foram os mais enfáticos defensores de novas regras para reduzir os pagamentos à União.
Os mais alinhados ao governo
argumentaram que a medida poderia abalar o mercado e provocar uma turbulência financeira,
por ameaçar as metas fiscais negociadas com o FMI (Fundo Monetário Internacional).
Os interlocutores do Planalto
no encontro -liderados por Jorge Vianna (PT-AC), Paulo Hartung (PSB-ES) e Ronaldo Lessa
(PSB-AL), que haviam se reunido
pela manhã com o ministro José
Dirceu (Casa Civil)- tentaram
convencer os demais a não fazer
nenhuma referência ao tema.
Acabaram, no entanto, optando
por um meio-termo, diante da
possibilidade de a inclusão ou não
ir a voto. Pesou também na decisão o corpo-a-corpo feito por ministros e pelo próprio Lula para
que não houvesse uma nota de
confronto ao governo.
Aécio, responsável pela redação
final da nota, acabou suprimindo
do texto o adjetivo "equivocado",
que deveria qualificar o "conceito
de renda líquida" mencionado
pelos governadores. Os tucanos
preferem usar a discussão da renegociação da dívida apenas como instrumento de pressão sobre
o Planalto por mais verbas.
"Venceu a estabilidade econômica do Brasil", disse, depois da
reunião, o tucano Cássio Cunha
Lima (PB), que engrossou as fileiras governistas na discussão.
Tensão
O clima era de alguma tensão na
saída do encontro. "Não tenha
medo do Zé Dirceu", afirmou Requião para seu colega de Alagoas,
Ronaldo Lessa (PSB), um dos
mais afinados com o discurso do
Palácio do Planalto. Abraçaram-se. Antes, a portas fechadas, Lessa
chegou a gritar contra o governador paranaense, que insistia em
incluir no texto final, de forma direta, a renegociação da dívida dos
Estados. "Ele quer ganhar tudo no
grito", reagiu Lessa.
O documento dos governadores é aberta com a exigência de
que o país retome o desenvolvimento. O superávit primário
(economia para pagamento de juros) recorde obtido no mês passado pelo governo federal foi bastante criticado pelos presentes.
"Superávit de R$ 1 bilhão é pornográfico, um desaforo, é imoral",
afirmou Requião.
Outra crítica bastante repisada
pelos governadores foi a de que
teria caído muito, nos últimos
anos, o volume de receitas da
União que são compartilhadas
com os Estados e municípios.
Os governadores exigem mais
recursos relativos aos fundos de
compensação com a desoneração
das exportações (que reduziu receitas de Estados exportadores) e
do desenvolvimento regional.
Não foram à reunião, mas mandaram representante, os governadores Joaquim Roriz (PMDB-DF)
e Wilma Faria (PSB-RN). O único
que não compareceu nem enviou
um representante foi o governador Zeca do PT (MS).
(GUSTAVO PATU, RANIER BRAGON, FERNANDO
RODRIGUES e EDUARDO SCOLESE)
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