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São Paulo, sexta-feira, 27 de junho de 2003

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LÍNGUA SOLTA

A metalúrgicos no ABC, presidente diz que reforma não afeta "peão"

Espetáculo do crescimento começa em julho, diz Lula

Caio Guatelli/Folha Imagem
Ao lado de Vicentinho, Lula acena para a platéia durante abertura do 4º Congresso do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC


PLÍNIO FRAGA
JULIA DUAILIBI
DA REPORTAGEM LOCAL

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva marcou data para sua promessa de uma virada na política econômica brasileira. "Esperem que o mês de julho será o do espetáculo do crescimento. É o mês em que a gente vai começar a fazer a curva que deve ser feita. Por que não fizemos antes? Porque não podíamos fazer antes", afirmou em discurso ontem à noite em São Bernardo do Campo.
Para corroborar sua promessa, afirmou que a expectativa de inflação quando assumiu era de 40% ao ano e hoje está em 5,5%. Disse que não havia US$ 1 para financiar as exportações brasileiros, cujos créditos internacionais foram agora normalizados.
"Nunca tivemos a credibilidade internacional que temos agora, com apenas cinco meses de governo. Isso em razão da competência da equipe de governo."
O presidente criticou indiretamente a gestão de Fernando Henrique Cardoso. "O governo anterior não teve condição de fazer a manutenção nem sequer das estradas. Todo mundo sabe que as estradas estão esburacadas."
Lula voltava, pela primeira vez como presidente da República, à sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, que o projetou como líder sindical e abriu a possibilidade de tornar-se político.
O presidente discursou para cerca de 500 pessoas por 30 minutos. Insistiu na necessidade das reformas constitucionais e disse que elas são questão de justiça social. Contou que pediu ao presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, a criação de um fundo internacional financiado pelos países ricos para obras de infra-estrutura nos países pobres e em desenvolvimento.
De improviso, fez piadas, insinuações maliciosas e chegou a soltar um palavrão. Afirmou preferir fazer discursos simples para que seja compreendido.
"Todo mundo aqui já tomou Benzetacil [antibiótico injetável à base de penicilina]. Dói, mas cura. O nego fica um dia mancando. Não pode sentar. Senta só com a metade...", afirmou Lula, provocando risos entre os sindicalistas.
O presidente relacionou o Benzetacil às reformas tributária e previdenciária. "São os remédios de que o Brasil precisa. A reforma da Previdência não mexe com peão, não. Mexe com o setor público, para harmonizar e fazer justiça social. Com gente que se aposenta com R$ 30 mil por mês na flor de sua vida intelectual."
Em tom memorialístico, o petista se disse mais tranquilo na Presidência da República do que quando assumiu o Sindicato dos Metalúrgicos em 24 de abril de 1975. "Porque estou mais consciente, mais maduro e mais calejado. Cheguei à presidência do sindicato quase por acaso. Cheguei à Presidência da República porque briguei muito por ela."
Citou assembléia em 1979 em que fez um acordo com o patronato para acabar com a greve de quase 60 dias, mas a categoria resistia a aceitá-lo.
Disse que os metalúrgicos lhe deram um voto de confiança, mas voltaram ao trabalho insatisfeitos, "bufando" como "um filho que ouve um não do pai e sai batendo a porta do quarto". "Vocês fizeram isso. Voltaram para dentro da fábrica putos comigo."
Lula lembrou à época em que participou da criação do PT, em 1980, e a forma como os fundadores se referiam à legenda então. "Naquele tempo, a gente nem falava Partido dos Trabalhadores. Aqui a gente aprendia a comer o "s". A gente falava Partido dos Trabalhadô, que é mais charmoso, forte, mais gostoso."
Declarou que, para ele, política se faz com relação de confiança. "Para mim, o olho no olho vale mais do que qualquer documento escrito. Política se faz por telepatia." Então, sorrindo, disse que política é como um processo de cortejamento no namoro. "Pode ter mil caras bonitos como eu no bairro. Mas a Nilza bate o olho no [Luiz] Marinho e pronto: é o Marinho", disse em referência ao presidente da CUT e sua mulher.
Lula justificou os pronunciamentos pouco cerimoniosos que adota normalmente. "Gosto de dar a família como exemplo. Todo mundo tem experiência de família. E, como falar palavra difícil nem todo mundo entende, prefiro usar as coisas do dia-a-dia."
Em seguida, deu o exemplo de promessas que namorados fazem a namorados. "O cara [quando namorava] dizia: faço isso, faço aquilo. Vocês casaram e... [gesticula como quem diz "nada']. O isso e aquilo não era o que a gente queria. Não era a casa na praia, o carro. É isso a que estou me referindo, Vicentinho. Não seja maldoso, malicioso. Estou me referindo a coisas práticas", disse o presidente, atribuindo conotação sexual às expressões feitas pelo atual deputado federal do PT.
Citando as dificuldades para aprovar as reformas e as demandas com as quais se comprometeu na campanha eleitoral, Lula disse que um não sincero é melhor do que um sim com falsidade. "Muitas vezes, um pai é melhor para um filho quando dá uma chinelada no bumbum dele."
Para uma platéia que incluía metalúrgicos de fábrica de caminhões, disse que está em estudo um financiamento para a renovação da frota de motoristas autônomos e crédito nos bancos para trabalhadores tendo como contrapartida unicamente os seus contracheques.


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