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São Paulo, domingo, 27 de julho de 2003

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Deterioração começou em 1998

DA SUCURSAL DO RIO

O Brasil está sendo varrido por uma onda de desemprego e de precarização do mercado de trabalho sem precedentes. Não é a mais intensa, mas sim a mais duradoura das duas décadas passadas, segundo a análise de especialistas ouvidos pela Folha.
A atual crise difere das do início dos anos 80 e do começo dos 90, que foram até mais fortes. Isso porque, passado o pico do desemprego, elas foram seguidas por planos de estabilização -como o Cruzado e Real- que fizeram o país crescer e, consequentemente, aumentaram a oferta de trabalho.
Para Marcelo Neri, chefe do Centro de Políticas Sociais da FGV (Fundação Getúlio Vargas), desde 1998 o mercado de trabalho vem se deteriorando gradativamente. O motivo é a sucessão de crises internas e externas que assolou o país: a asiática, a russa, a da desvalorização do real, a argentina, o apagão e, por fim, a provocada pelas eleições de 2002.
Francisco Pessoa, da consultoria LCA, concorda. Diz que os três últimos anos são de crescimento muito baixo, com um média de cerca de 1,5% ao ano, o que provocou uma paralisia no mercado de trabalho. "Nos últimos anos, o mercado de trabalho sofreu uma série de choques sucessivos, sem ter tempo de se recuperar."
Já Sônia Rocha, economista da FGV, tem uma opinião diferente. Considera o aumento do desemprego conjuntural e passageiro, fruto apenas do choque de 2002 e da menor atividade econômica.
Nos seis primeiros meses do governo Lula, a taxa de desemprego subiu 2,5 pontos percentuais. Na média semestral, ficou em 12,2%. São 443 mil pessoas a mais sem trabalho no período. Há seis meses contraída, a renda recuou 3,8% no semestre. Atingiu quedas históricas em maio e junho: 13,4% e 14,7%, respectivamente.
É justamente a retração forte e contínua do rendimento o mais importante fenômeno da mais recente crise do mercado de trabalho, segundo o gerente da Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE, Cimar Azeredo. Na visão dele, o rendimento em queda faz com que mais pessoas de uma mesma família procurem emprego para recompor o orçamento familiar, pressionando o mercado de trabalho. Com o aumento da procura, sobe a taxa de desemprego.
"A ocupação [oferta de vagas] tem crescido. Ela não chegou a cair. O problema é que não num ritmo suficiente para absorver o contingente que está ingressando ou voltando para o mercado", disse Azeredo. "Estamos vivendo num contrapé: baixo nível de atividade, renda em queda e criação de empregos insuficiente. Naturalmente, mais gente entra no mercado para compensar a queda na renda, como os filhos e a mulher", concorda Sônia Rocha.
Sônia Rocha afirma que "uma mudança estrutural" de patamar do desemprego aconteceu em 1998 e ficou para trás. Foi quando as taxas saltaram da casa de 5% para 8% ao ano, como resultado de um forte processo de alteração do processo produtivo. As mudanças ocorrem em razão da abertura comercial dos anos 90, que obrigou as empresas a ganhar produtividade, muitas vezes com demissões, e das privatizações.
Tanto Rocha como Neri avaliam que essas mudanças foram mais sentidas nas regiões metropolitanas, que se adaptam mais rapidamente às novas formas de produção e mecanização. Por isso, a crise é mais intensa nessas áreas. O fato de agricultura ter crescido muito nos últimos anos melhorou a renda e o emprego no campo. (PS)


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