São Paulo, sexta-feira, 27 de setembro de 2002

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PRESIDENTE

Gafe de Lula e crítica de Serra ao Mercosul trazem discussão sobre o futuro da relação com a Argentina para a disputa presidencial

Tango eleitoral

JOÃO SANDRINI
DE BUENOS AIRES

LÚCIO VAZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Depois das promessas de emprego, da discussão sobre o diploma e do fogo cruzado entre candidatos, chegou a vez da Argentina.
A depreciação do real, que passou a ter valor nominal inferior ao do peso argentino, trouxe de volta as comparações entre os dois países -e a discussão tomou conta da campanha eleitoral brasileira bem em sua reta final.
Ontem, enquanto o presidente argentino, Eduardo Duhalde, visitava em Brasília seu colega Fernando Henrique Cardoso, em Buenos Aires reverberavam discussões sobre o relacionamento entre os dois países com o próximo governante brasileiro.
O candidato do PT à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, escreveu um artigo para o jornal "Clarín" para tentar abafar a péssima repercussão que sua declaração de que o Brasil "não era uma republiqueta qualquer, uma Argentina" teve no país vizinho.
Lula afirmou que o Mercosul será sua "prioridade número um em política externa" caso vença a eleição. A decisão de utilizar o jornal para reverter o mal-estar criado no país vizinho foi tomada pela própria cúpula do PT.
Além disso, Lula também já havia enviado uma carta para o senador argentino Rodolfo Terragno (UCR), presidente da Comissão de Assuntos Internacionais do Senado, para tentar desfazer o que foi chamado de uma "má interpretação" de suas declarações.
Assim como o petista, o candidato do PSDB, José Serra, também criou descontentamento na Argentina. Anteontem, ele disse que a forte desvalorização do real nos últimos dias deve-se à avaliação "daqueles que crêem que a capital do Brasil é Buenos Aires".
Além disso, o candidato tucano afirmou que "o Mercosul não deu certo" porque, mesmo com as "concessões incríveis" feitas pelo Brasil aos parceiros, a "Argentina pula para trás" sempre que se vai discutir o livre comércio.
Em Brasília, Duhalde, não quis comentar as declarações de Serra. Anteontem, ele já havia minimizado a afirmação de Lula ao considerar que não era correto "engrandecer esse tipo de coisa".
Já o chanceler argentino Carlos Ruckauf, que estava em Brasília, disse que os candidatos brasileiros deveriam evitar "declarações altissonantes" e considerou que "essa é uma velha visão de Serra".
"Nossa posição é que temos que seguir adiante, que Brasil e Argentina têm um caminho comum a transitar", disse Ruckauf.
Reação mais indignada veio do jornal "La Nación". Em editorial denominado "Declarações Imprudentes", o diário criticou duramente Lula e Serra.
Ontem, os dois amenizaram suas frases. No "Jornal Nacional", Lula disse: "O jornalista que fez a matéria não sabe diferenciar a vírgula. Eu disse que o Brasil não pode ser tratado como uma republiqueta e nem como a Argentina. Porque são economias diferentes. O Brasil tem mais base industrial. Eu sou defensor da Argentina."
Já Serra, em Uberaba (MG), afirmou: "É uma frustração em relação às metas, que eram ambiciosas e irreais", disse ele, que ressalvou: "Eu nunca disse que não concordava com o Mercosul."
Se Lula e Serra ficaram marcados pelas críticas ao Mercosul, Ciro Gomes (PPS), por sua vez, partiu ontem em defesa do mercado comum. "Esse é um erro estratégico mortal de quem está fazendo o jogo das potências do Norte."
Ciro lembrou que o Mercosul foi decidido pelos presidentes que antecederam ao atual com o objetivo de integrar os países do Cone Sul. "Foi feito para nos apresentarmos juntos nas negociações multilaterais. Os norte-americanos perceberam isso, ofereceram vantagens bilaterais ao Chile, manipularam o câmbio na Argentina, até destruir aquele grande país e levá-lo à ingovernabilidade. Hoje fazem o mesmo com o Brasil."
Segundo o candidato, "quem se põe contra um esforço de restauração do Mercosul tem que tirar a máscara e dizer de fato o que está fazendo: está prestando um serviço a esse esforço de desagregação da América Latina que é feito pelos potências no norte".


Colaboraram a Folha Ribeirão e a Reportagem Local



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