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ELIO GASPARI
Esculacharam Duda Mendonça
Na segunda-feira um dos filhos de Duda Mendonça,
de nove anos, não foi ao colégio.
Seus amiguinhos brincaram: ele
foi visitar o pai na cadeia. Duda
Mendonça é um dos maiores
publicitários brasileiros, com 40
anos de carreira, vitórias, derrotas e um tremendo astral. Sua
contribuição aos costumes políticos, como a de toda a espécie
dos marqueteiros, é um exercício de mistificação às vezes ególatra, quase sempre mitômana,
mas isso não vem ao caso.
Esse homem foi esmigalhado
por causa de uma briga de galos. Foi mais uma vítima do
chavão segundo o qual a polícia
junta acusações de pouca monta e cobre um bolo de fubá com
o creme da "formação de quadrilha".
Acaba-se numa situação mais
ou menos assim: Lee e sua mulher Marina, com Olga e Igor,
armam um esquema para roubar sistematicamente toca-fitas
no estacionamento da Dealey
Plaza, em Dallas. Como são
quatro e houve conluio, o delegado enche as bochechas e diz
aos jornalistas que, entre outras
acusações, eles responderão por
"formação de quadrilha". Lee
Oswald separa-se de Marina, livra-se de Olga e Igor, compra
um rifle, sobe ao sexto andar do
depósito de livros que há na praça, dispara dois tiros e estoura a
cabeça de John Kennedy, o presidente dos Estados Unidos. Podem acusá-lo de tudo, menos de
formação de quadrilha.
Faltou pouco para que Duda
Mendonça fosse exibido com algemas. Em muitos casos, as algemas são exemplares, mas parece difícil sustentar a necessidade de amarrar o publicitário.
Pela maneira que foi exposto
enquanto esteve detido, não lhe
foi dado o respeito concedido a
Elias Maluco, que pediu à polícia: "Prende, mas não esculacha". Duda cometeu um crime
federal e subiu no salto de seu
altíssimo caderno de telefones
ligando para o ministro da Justiça. Esculachá-lo foi um desrespeito. Quando os jornais e emissoras viram sua atenção atraída
para o detalhe de que ele poderia dormir num presídio, algo
acontecia de errado. Um cidadão com domicílio certo e atividade sabida deve dormir num
presídio porque estava assistindo a uma briga de galos?
A linha que separa a divulgação da ação policial e o esculacho do cidadão pode ser tênue,
mas quem a ultrapassa percebe
o que faz. O andar de cima não
vê nada de estranho quando um
negro de comunidade pobre é
obrigado a entrar agachado
num fundo de viatura policial.
Afinal, o esculacho do andar de
baixo faz parte da rotina policial brasileira.
É lastimável que se reclame do
esculacho de Duda (como está
acontecendo neste artigo),
quando se convive com misérias
muito piores. Se o que aconteceu
a Duda servir para evitar que
um negro pobre seja esculachado, os galos do Privê terão prestado um serviço aos bípedes de
Pindorama. São muitas as pessoas que tiveram um prazer especial ao ver o marqueteiro de
Lula, Maluf, Marta Suplicy e
Celso Pitta em cana. É compreensível, mas não é justo, sobretudo porque o picadeiro onde foi atirado Duda Mendonça
continuará funcionando, à espera de novas vítimas.
A atividade profissional de
Duda Mendonça já atraiu contra ele e sua empresa toda sorte
de xeretagens. Passou por todas
sem reprovação. Nunca o acusaram de má conduta em relação
a coisa alguma. Mesmo no
mundo de fantasia das marquetagens e de fuxicos do Palácio do
Planalto, Duda Mendonça mostrou-se como um profissional
que não joga com a brutalidade
do comissariado petista. Sem
que houvesse justificativa para
tanto ressentimento, esculacharam-no como se houvesse um
sabor especial na sua desdita.
Astúcias políticas, exibicionismos, vaidades e voracidades
profissionais são parte da vida,
mas a destruição de uma personalidade pública por conta de
uma briga de galo é coisa de rinha.
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