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ELIO GASPARI
Cuidado, o povo quer festa
Incomoda um pouco saber
que um governo eleito que
vem batendo cabeças em questões como as alíquotas do Imposto de Renda e os critérios do
projeto Fome Zero só se acerta
numa coisa: a preparação da
grande festa da posse de Lula.
Não se sabe o nome de um só
ministro, mas já se conhece o
carnavalesco da República. Sabendo-se que a festa ficará nas
mãos de Duda Mendonça.
Ruim não será. Essa sensação de
desconforto desaparece quando
se vê que há itamaratecas e planaltontos preocupados com a
hipótese de a choldra aparecer
na praça dos Três Poderes.,
À primeira vista, o povo na
rua pode colocar em risco a segurança dos convidados. Falso.
Ele só quer sorrir, cantar e alegrar a cidade. Quem coloca em
risco os convidados são os especialistas dos cerimoniais. Na
posse do general Costa e Silva
caiu embaixador no lago e algumas convidadas, tendo saltado
de seus carros presos num engarrafamento, ficaram espetadas com seus saltos altos no gramado do Alvorada. Festa boa só
a dos generais, quando havia
mais gente dentro do palácio do
que do lado de fora.
Na primeira posse de FFHH,
conseguir comida foi tão difícil
que teria caído bem um projeto
de Fome Zero. Em ambas, o presidente desfilou numa velha
Rolls Royce de ecos coloniais. Isso num país que tem um dos
grandes parques automobilísticos do mundo. A ekipekonômica colocou essa indústria a produzir desempregados, mas ainda assim ela merece respeito.
Quando a perspectiva de haver povo na rua ameaça a ordem das cerimônias, percebe-se
que há algo de novo e de bom na
posse e na festa de Lula.
Parece que onde quer que ele
vá, atrai a patuléia. Não é bem
isso. Onde quer que Lula esteja,
a choldra tem a sensação de que
pode vê-lo, tocá-lo, sem ser
mantida a dois quarteirões de
distância ou tomar um empurrão. Quando JK morreu, havia
um ingrediente intrigante na
lembrança que deixara no andar de baixo. As pessoas o haviam visto e quase sempre viram-no rindo, saudando-as.
A dificuldade da burocracia
das cerimônias nacionais para
botar o povo na fotografia é tão
grande que se temem transtornos se ele for à Esplanada e cair
na gandaia por conta da eleição
de um sujeito que teve só duas
posições na vida: ou era candidato derrotado à Presidência,
ou tinha que ver a cerimônia pela televisão, porque não fazia
parte daquele pedaço do Brasil
que recebe convite para esse tipo
de festa oficial.
Nesse Brasil em que fica difícil
arrumar um lugar para o povo
numa Esplanada capaz de engolir até multidões papalinas,
deu-se o inesperado: um pernambucano desceu do pau de
arara e saiu andando, andou
meio século e no dia 1º de janeiro ele estará na boca da rampa
do Palácio do Planalto. Atrás
dele, estarão outros como ele.
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