São Paulo, domingo, 28 de janeiro de 2001

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Acampamento reúne várias "tribos"

THOMAS TRAUMANN
ENVIADO ESPECIAL A PORTO ALEGRE

Cauã Basali, de oito meses, está na sua segunda manifestação. Filho de dois estudantes de filosofia da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), o bebê já participou de uma passeata pela paz em Campinas e já na quinta-feira estava instalado em uma barraca do Acampamento Intercontinental da Juventude - o lado woodstock do Fórum Mundial Social.
"O engajamento vem de berço. Ele nasceu num dia de protestos dos professores estaduais", disse o pai, Rogério Basali, 26, coordenador de um grupo que faz trabalhos educativos na periferia de Campinas. A mãe, Lise Mielnik Basali, 27, acredita que é ótimo para o filho estar ao lado dos pais.
O bebê é o mais novo dos 1.200 jovens inscritos no Acampamento Intercontinental, um camping de cerca de 500 barracas instaladas no parque da Harmonia, uma área verde na orla do rio Guaíba, na zona oeste de Porto Alegre.
Outros 500 jovens tentaram se inscrever, mas não conseguiram, por falta de espaço para montar barracas, e ficaram em pensões.
O acampamento é uma geléia geral. A grande maioria é estudante e tem entre 16 e 26 anos. Há militantes petistas que colocam a bandeira do partido ao lado da barraca. Anarquistas vizinhos de trotskistas do PSTU (Partido Socialista Trabalhista Unificado) e estalinistas do PC do B. Punks a cem metros de adolescentes vestidas com jeans da marca Zoomp.
Há sem-terra erguendo bandeira da Palestina, hippies tocando no violão músicas de Raul Seixas, militantes da UNE (União Nacional dos Estudantes) distribuindo panfletos contra o governo FHC e gaúchos com roupas típicas fazendo faixas em defesa dos guerrilheiros zapatistas do México e das Farc (Forças Armadas Revolucionárias Colombianas).
Junto ao Acampamento da Juventude, estão 30 barracas com 120 índios das tribos kaigang, pataxó e guarani, que participarão de debates sobre a questão indígena na América Latina.
"Aqui é uma mistura de academia, geração shopping center e Woodstock. Somos a geração que cresceu sob o neoliberalismo, temos a nossa contribuição a dar nesse Fórum, mesmo que seja pela diversidade", disse Luciano Rios, 25, da coordenação do Acampamento da Juventude.
"E daí que a maioria que está aqui pensa diferente de mim? Eu vim porque esse é o lugar para quem quer marcar posição contra a globalização", disse Janaína Lachmann, "punk por escolha pessoal", camiseta preta e coleira no pescoço.

Preservativos
A estrutura do acampamento é superior à de camping tradicional. São 36 banheiros, 35 duchas, seis calhas para lavar roupas e pratos, 11 telefones públicos e 2.000 seguranças. Embora ostensiva, a segurança é liberal. Nenhum guarda tentou, pelo menos na quinta-feira, descobrir a origem do cheiro de maconha.
Estão programados shows todas as noites até o final do Fórum, no dia 30. Os jovens planejam criar uma rádio pirata, usando os equipamentos de uma emissora comunitária. A Secretaria da Saúde do Rio Grande do Sul prometeu distribuir entre 10 mil e 15 mil preservativos entre os jovens.
As atividades para os jovens começaram na sexta. Na pauta, temas como universidade pública, protesto contra a proposta de redução da idade mínima no Código Penal, fim da obrigatoriedade do serviço militar e repressão sexual das adolescentes.
É provável que juntem mais público do que as palestras promovidas pelo Fórum e recomendadas para os jovens como "O rastreamento das culturas não transgênicas como instrumento de comercialização direta de camponês a camponês".


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