São Paulo, Domingo, 28 de Fevereiro de 1999
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Funai teme aumento de suicídio de índios

RUBENS VALENTE
da Agência Folha, em Campo Grande

A possibilidade de corte dos recursos para distribuição de cestas básicas do programa Comunidade Solidária alarmou indigenistas de Mato Grosso do Sul, onde as aldeias guaranis vivem uma onda de suicídios desde o início da década de 90 e a comida é vista como atenuante para o fenômeno.
O programa fornece mensalmente 9.600 cestas básicas nas aldeias de Mato Grosso do Sul, que é o segundo Estado em população indígena do Brasil, com cerca de 50 mil índios.
""Se cortarem as cestas, vão ocorrer mais mortes", disse ontem o assessor jurídico do Cimi (Conselho Indigenista Missionário), Maucir Pauletti. ""Não há dúvida de que uma das razões dos suicídios é o desespero trazido pela fome, pela miséria", disse Pauletti.

336 mortes
Desde 1981, 336 guaranis-nhandevas e guaranis-caiuás se mataram no Estado. Há 25 mil guaranis em Mato Grosso do Sul.
No ano passado, 26 índios cometeram suicídio, mais de um a cada 15 dias. Neste ano, duas crianças caiuás morreram.
O último caso foi registrado no dia 20: Junair Oliveira, 12, foi encontrada enforcada numa árvore em Amambai (351 km de Campo Grande), uma semana depois de sumir da casa dos pais.
Os dados mostram que não houve redução no número de suicídios após a inclusão das aldeias no programa de distribuição de cestas básicas, no ano passado.
Em 97, 26 índios se mataram, o mesmo número de 98, segundo a Funai. Mas, para Maucir Pauletti, 1999 será um ano ""atípico, de profunda crise" nas aldeias, e a presença da comida pode ser determinante para conter os suicídios.
Neste ano, pela primeira vez nas últimas duas décadas, cerca de 4.000 índios deixarão de ser empregados pelas usinas de álcool do Estado, porque o Ministério Público exigiu que os usineiros assinem as carteiras de trabalho dos índios.
Os caciques se recusam a adotar a carteira. ""O desemprego está terrível nas aldeias", disse o assessor jurídico do Cimi.

Falidos
O administrador regional da Funai em Amambai, Antônio Martins Gonçalves, que saiu da assessoria da presidência do órgão, em Brasília, para assumir o cargo no local, há 30 dias, disse que sem as cestas básicas os índios e a Funai ""estão falidos". ""Os índios se sentem aqui desprezados, sem assistência social".
O superintendente da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), Antônio Dotta, disse que não recebeu nenhuma informação oficial sobre corte de cestas básicas. ""Só sabemos o que saiu na imprensa. De oficial, nada."


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