São Paulo, quinta, 28 de maio de 1998

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CELSO PINTO
O produto certo pelo preço errado

O problema das exportações brasileiras não é tentar vender o produto errado. É falta de competitividade generalizada, ou seja, é vender o produto certo pelo preço errado.
Essa é uma das conclusões principais de um estudo recém-concluído pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) sobre as exportações, a que teve acesso esta coluna. Assinado por Renato Fonseca e Edson Velloso, o estudo faz um diagnóstico interessante e detalhado do setor exportador e sugere alternativas.
O trabalho analisa as exportações de manufaturados de 85 países, de 1989 a 1995, para os países mais ricos reunidos na OCDE. A OCDE representa 72% das importações mundiais de manufaturados, o que a torna quase equivalente a um "mercado mundial".
Nenhum país cujo sucesso futuro dependa crucialmente do aumento das exportações, como o Brasil, pode ter um desempenho medíocre nas exportações para a OCDE. A análise se restringe aos manufaturados, porque eles respondem pela maior parte do comércio mundial (80% em 95/96), e os produtos primários são mais afetados por distorções como subsídios.
O Brasil consegue exportar um conjunto expressivo de produtos manufaturados. Definindo como "dinâmicos" os 63 produtos que cresceram acima da média no período e "superdinâmicos" os 30 produtos que cresceram mais de 10% acima da média, o Brasil exportou todos eles.
No entanto, tem uma presença ínfima nesses mercados e um crescimento irrisório, embora no período mais recente da análise, de 1992 a 1995, os indicadores tenham melhorado. Entre os 85 países, o Brasil ficou no número 26, com apenas 0,57% do mercado de produtos "dinâmicos" e número 31 nos "superdinâmicos" em 89. Em 95, a participação caiu para 0,39% e a posição no ranking caiu para 67.
O Brasil, portanto, conseguiu vender os produtos mais dinâmicos na OCDE, mas muito pouco, por falta de competitividade. Olhando o desempenho comparativo, considerando os 62 países fora da OCDE, isso fica ainda mais claro.
O estudo mede em quantos produtos "dinâmicos" os países conseguiram ampliar em 5% suas vendas, caracterizando-se, desta forma, como competitivos. A China conseguiu em 59 dos 63 produtos dinâmicos, a Índia em 58, seguida da Indonésia, Malásia, Tailândia e Polônia.

Falta Competitividade
O Brasil é competitivo em apenas 17 dos 63 produtos (equivalentes a 13% das exportações brasileiras), o que o coloca no número 47 do ranking de 62 países. No caso dos produtos "superdinâmicos", é competitivo em apenas 4 dos 30 produtos (1,1% das exportações), colocando o país no número 55 do ranking.
Considerando os produtos de maior demanda da OCDE, o Brasil só foi competitivo em 9 dos 44 produtos, ficando na posição 58. A China, por exemplo, foi competitiva em 43 dos 44 produtos, e a Índia, em 42. Os principais concorrentes dos 20 produtos que o Brasil mais vendeu para a OCDE foram Polônia, Bulgária, China, Irã e Índia.
Quando a análise se concentra no período mais recente, de 1992 a 1995, o desempenho brasileiro melhora. O Brasil salta do posto 47 para 28 entre os 62 países que têm mais produtos competitivos entre os dinâmicos e de 55 para 38 nos superdinâmicos. Na venda de produtos com maior demanda na OCDE, o salto é da posição 58 para 35.
Ainda assim, mantém-se a conclusão geral. O desempenho geral é medíocre, comparado a outros países, e a falta de competitividade é generalizada.
Portanto, o que mais ajudaria as exportações seriam políticas "horizontais" de estímulo, ou seja, que melhorassem a competitividade geral das exportações. O estudo não diz quais políticas, mas elas são óbvias: redução do "custo Brasil" (infra-estrutura, juros, impostos etc.), melhor educação, câmbio mais competitivo etc.

As oportunidades
O estudo, contudo, vai um passo além. Examina os produtos nos quais o Brasil tem uma vantagem comparativa em relação a outros países, definida como produtos cuja participação nas exportações brasileiras é maior do que a participação dele no total das exportações dos demais países. Chega-se a 47 produtos, que respondiam por 78,5% das exportações de manufaturados em 95.
Entre esses 47 produtos, o Brasil ganhou mercado em 26, dos quais 14 produtos "dinâmicos", como madeira, peças forjadas de ferro e aço e bombas para líquidos.
As maiores oportunidades de ganhos, contudo, estão no grupo de produtos nos quais o mercado cresceu acima da média (foi "dinâmico"), mas a participação das vendas brasileiras tem crescido menos do que a média, embora haja vantagens comparativas. Em 95, seis produtos se enquadravam neste caso, entre eles produtos siderúrgicos, motores a combustão, receptores de radiodifusão e têxteis.
Existem oportunidades também nos produtos que, mesmo sem ter um crescimento de demanda expressivo na OCDE, são importantes em volume importado. Aí se enquadram móveis, bombas, compressores, pneus e máquinas-ferramentas.
O trabalho sugere que, nos setores nos quais o Brasil tem vantagens comparativas, valeria a pena examinar estímulos setoriais, caso a caso, para maximizar ganhos rápidos de exportação. Não seriam subsídios artificiais, já que os setores são, por definição, competitivos, mas um empurrão. Qual, o trabalho não detalha, mas poderia envolver, por exemplo, financiamento, tecnologia etc.
Como não existem dados além de 95, não é possível saber o quanto (e se) a competitividade dos manufaturados melhorou nos últimos anos. É muito provável que tenha avançado, já que houve ganhos de produtividade, reduções de custo e até alguma melhora cambial. No entanto, dado o quadro até 95, é quase certo que a situação relativa continua muito longe do necessário.
Fica claro, na análise comparativa, que só existe futuro sólido nas exportações para países que conseguem ser competitivos em muitos produtos na OCDE. O Brasil, nos anos recentes, tem ampliado as exportações de manufaturados em alguns poucos itens (especialmente autos) para o Mercosul e a América Latina. Não é o bastante.




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