São Paulo, Segunda-feira, 28 de Junho de 1999
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Documento a ser divulgado hoje confirma discussão para "liberalização comercial progressiva e recíproca", mas evita determinação de uma data por resistência dos países europeus

Europa e Mercosul acertam negociação

CLÓVIS ROSSI
enviado especial ao Rio

Os 15 países da UE (União Européia) e os quatro do Mercosul mais o Chile "concordaram em lançar negociações com vistas à liberalização comercial progressiva e recíproca, sem excluir nenhum setor e em concordância com as regras da OMC (Organização Mundial do Comércio)".
Será esse o teor do comunicado a ser difundido hoje, depois da reunião de cúpula (a primeira do gênero) entre 20 países, a reunião mais importante dentro da cúpula maior, esta entre 48 países latino-americanos, caribenhos e europeus, que começa hoje.
O comunicado UE-Mercosul, a que a Folha teve acesso, incorpora a expressão diplomática "single undertaking" (empreendimento único), o que significa que nenhum acordo entrará em vigor antes de acertados todos os pontos da vasta agenda de liberalização comercial a ser lançada hoje.
O documento final não contém menção a uma data nem para começar nem para terminar a negociação, ao contrário do que pretendia o governo brasileiro. O bloco europeu, em especial a França, opõe-se porque não quer ficar amarrado a uma data específica.
A questão da data pode acabar se tornar irrelevante a curto prazo, porque já está prevista para novembro uma reunião do Conselho Conjunto UE/Mercosul-Chile, criado em encontro em Madri há quatro anos. Caberá a essa reunião definir calendário e regras precisas de negociação, o que, eventualmente, incluirá definição de datas.
Com ou sem data, o horizonte com o qual trabalham ambas as partes é o de finalizar os trabalhos o mais perto possível do término da chamada Rodada do Milênio, uma abrangente negociação comercial a ser presumivelmente lançada pela OMC na sua 3ª Conferência Ministerial, também em novembro, em Seattle (EUA).
Espera-se que a Rodada do Milênio acabe em três anos (2003, portanto, no máximo 2004).
O lançamento de negociações entre os dois blocos significa que o Brasil mergulhará nos próximos meses em negociações em três âmbitos diferentes e que delas dependerá a inserção internacional do país e toda a sua (inexistente) política de desenvolvimento.
Além da UE, o Brasil estará negociando com os EUA, o eixo em torno do qual gira a Alca (Área de Livre Comércio das Américas, que pretende abranger os 34 países americanos, a exceção de Cuba), e com o planeta quase todo, na Rodada do Milênio da OMC.
É nesta última que o governo brasileiro espera conseguir as concessões básicas da UE na área agrícola. O bloco europeu dificilmente poderá resistir à pressão generalizada, principalmente dos EUA, para derrubar ao menos parte do protecionismo em torno de seus produtores agrícolas.
Obtidas tais concessões, o Brasil poderá pedir, nas negociações bilaterais com os europeus, um "plus", um adicional que não precisará valer para todos os países.
O raciocínio obtido pela Folha no Itamaraty compõe o seguinte teorema: 1) na Rodada do Milênio, sairá o grosso das concessões agrícolas européias; 2) a partir daí, o Brasil escolhe o tamanho do "plus" que pode conseguir na negociação direta; 3) mas o tamanho do "plus" a ser pedido depende, acima de tudo, de idêntico "plus" a ser dado aos europeus em matéria de abertura adicional do mercado brasileiro de bens industriais e também de serviços (leia texto abaixo).
Posto de outra forma: para esse conjunto de negociações, o Brasil terá que se apresentar com um projeto definido de desenvolvimento, de forma a saber o que abre e o que protege. O governo já criou um comitê interministerial para estudar tais questões. Falta, agora, incorporar empresários e trabalhadores às discussões.
Afinal não se trata de uma negociação diplomática, mas de empregos, de empresas nacionais e, até, dos limites à soberania do país.


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