São Paulo, quarta-feira, 28 de julho de 2004

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ALTA ESPIONAGEM

Daniel Dantas e Carla Cicco teriam contratado a Kroll para espionar a Telecom Italia

Banqueiro e executiva de tele vão ter de depor na PF

ANDRÉA MICHAEL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A Polícia Federal convocará para depor o banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity, e a presidente da Brasil Telecom, Carla Cicco. A executiva contratou a Kroll para espionar a Telecom Italia, empresa com a qual a Brasil Telecom, controlada por Dantas, trava disputas comerciais e judiciais.
Procurados pela Folha, Dantas e Cicco informaram, por intermédio de suas assessorias, que não iriam se pronunciar sobre o caso.
A data da convocação dependerá de uma negociação entre a PF e o Ministério Público Federal, com anuência da Justiça Federal em São Paulo, na qual tramita um inquérito cujo foco é a falência da Parmalat.
Conforme revelou a Folha na semana passada, ao investigar a indústria alimentícia, a PF descobriu a contratação da Kroll e, com base em monitoramento telefônico e telemático, foram levantados fortes indícios de que, ao investigar a Telecom Italia, a empresa praticou irregularidades e espionou autoridades brasileiras -como o ministro Luiz Gushiken (Comunicação de Governo) e o presidente do Banco do Brasil, Cássio Casseb.
Procurada, a Kroll disse, por meio de sua assessoria, que não iria comentar o assunto.

O nome do espião
Pelos dados coletados até o momento, os personagens mais ativos no trabalho da Kroll relacionado à Telecom Italia foram o português Tiago Verdial e o inglês William Goodall, o Bill, que é agente aposentado do serviço secreto britânico, o MI6, que ficou famoso nos cinemas por ser o órgão que abrigava o espião James Bond, o 007.
A Justiça já expedira mandados de prisão contra ambos. Mas os investigadores esperavam o melhor momento para executar as ordens judiciais, o que aconteceria assim que houvesse mais elementos sobre um ponto crucial da investigação: o grau de conhecimento que os contratantes tinham ou não sobre práticas ilegais que teriam sido cometidas pela contratada.
Diante da reportagem da Folha, optou-se por realizar a prisão de Tiago, executada no último sábado, no Rio de Janeiro. Não há informações sobre o paradeiro de Goodall.
A pista para a revelação da espionagem praticada pela Kroll no setor de telecomunicações surgiu, conforme a investigação, quando Verdial, em contato com uma testemunha oficial do caso Parmalat -Adelson Pugliese, que fora motorista da multinacional-, sugeriu pagá-lo por informações contra a empresa investigada, que seria de seu interesse, pois ele também as teria.
Monitorado, Verdial, em diálogos, troca de e-mail e, mais recentemente, em documentos e equipamentos apreendidos em sua residência e escritório no Rio de Janeiro, teria dado elementos que, segundo investigadores do caso, constituem indícios de que a Kroll atuava à margem da lei.
Em dois depoimentos prestados à PF, em Brasília, conforme a Folha apurou, a colaboração de Verdial foi limitada. São apurados indícios que imputam a ele prática de quebra de sigilo constitucional -recebeu por e-mail e repassou à Kroll declaração de renda do presidente do Banco do Brasil-, formação de quadrilha, exploração de prestígio -teria extraído informações reservadas usando de amizade com integrantes do governo- e corrupção ativa.
No dia 16 de julho, o vice-presidente de segurança da Telecom Italia, Angelo Janonne, entregou à PF dois relatórios -intitulados Projeto Tóquio- produzidos pela Kroll e destinados à Brasil Telecom. Os papéis, segundo Janonne, chegaram anonimamente à presidência da Telecom Italia.
Na ocasião, Janonne, além de informar às autoridades policiais sua disposição de tornar público o caso de espionagem, entregou à PF a gravação de uma entrevista que ele fez com Verdial, que havia se candidatado a uma vaga na Telecom Italia. No encontro, Verdial respondeu "sim" ao ser perguntado por Janonne se Dantas e Cicco haviam solicitado à Kroll a prática de atos ilícitos.
Verdial pode ser condenado a 12 anos de reclusão caso fique provado que ele corrompeu servidores para obter informações, uma das acusações feitas pela PF contra ele.
Essa é a pena máxima prevista para o crime de corrupção ativa, fixada pelo artigo 333 do Código Penal. Além da reclusão, pode haver pena de multa.


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