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REPERCUSSÃO
Projeto divide especialistas e ministros do Supremo
DA REPORTAGEM LOCAL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O projeto de lei que estabelece
punições mais duras para casos
de interceptação telefônica dividiu a opinião de especialistas, ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) e presidente da OAB
ouvidos pela Folha. Em geral, todos concordam com a necessidade de um controle maior das gravações clandestinas, mas divergem quanto o assunto atinge o
trabalho da imprensa.
Para o advogado constitucionalista e tributarista Ives Gandra
Martins, o projeto deveria prever
uma distinção. A punição severa,
diz o advogado, é bem-vinda para
coibir o "festival de gravações
clandestinas". No caso de um jornalista que divulgue uma gravação telefônica, cujo teor é considerado de relevância para a sociedade, isso é obrigação da profissão,
diz. "E o jornalista tem a garantia
de sigilo de fonte. Se a lei também
atinge os jornalistas, entendo que
a proposta é inconstitucional."
O diretor executivo da ONG
Transparência Brasil, Claudio
Weber Abramo, classificou a medida como "um cerceamento à liberdade de informação".
O presidente em exercício da
OAB (Ordem dos Advogados do
Brasil), Cezar Britto, também se
posicionou contra. "O governo
erra quando pune todo tipo de divulgação [de resultado de escuta],
até porque o silêncio pode beneficiar o próprio autor da infração. O
limite da divulgação deve ser o
que já está previsto na Lei de Imprensa: a condenação de quem
utiliza a informação fora dos parâmetros éticos e legais."
Já o presidente Conamp (Associação Nacional dos Membros do
Ministério Público), José Carlos
Cosenzo, defendeu a medida "por
garantir à pessoa alvo de um
grampo ilegal a preservação de
sua imagem".
As divergências sobre o tema
também vêm à tona no STF. Para
o ministro Carlos Velloso, a tentativa de disciplinar com maior rigor o tema é "razoável". "Se não
há uma ameaça de punição severa, há descumprimento da lei."
Outros dois ministros do Supremo falaram em caráter reservado,
alegando que, se for aprovada e
sancionada, a lei poderá ser contestada no tribunal, e a declaração
antecipada deles sobre o assunto
os tornaria impedidos de participar do julgamento. Ambos ressaltaram que especulavam, pois desconheciam o texto do projeto.
Para um deles, os jornais hoje
cometem excessos na divulgação
de conversas grampeadas, porque
essa prática não é punida. Se ela
for tratada como crime, a banalização hoje existente seria substituída pela cautela, com a publicação apenas de casos excepcionais.
O outro ministro afirmou que a
proposta poderá criar uma cultura de repressão, em que o Estado
recorreria à ameaça para obter o
silêncio. Disse que não tem sentido o governo se valer de seu aparato institucional para manipular
leis penais e instituir mecanismos
de limitação da liberdade de expressão e de pensamento.
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