São Paulo, domingo, 28 de agosto de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ ESTRATÉGIA DE DEFESA

Para tentar evitar cassação, ex-ministro dirá que não teve responsabilidade por atos do PT e acusará PSDB e PFL de também fazer caixa 2

Dirceu tenta se desvincular de Delúbio

CATIA SEABRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Dizendo-se disposto a escrever um livro sobre seus 30 meses de governo -dos quais, confessa, sente saudade -, o ex-chefe da Casa Civil José Dirceu volta à cena com apetite para briga, dentro ou fora do PT. A primeira delas é para defender sua biografia. Dirceu já avisou a petistas que não assumirá erros que atribui a pessoas que comandavam o partido enquanto estava no governo.
"Do Lula ao faxineiro do PT, todo mundo sabe: essa conta do Delúbio eu não vou pagar", afirma. Dirceu insiste que o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares e o ex-secretário do partido Silvio Pereira não eram de seu grupo político -apesar de serem freqüentes, até hoje, os contatos entre os três.
Oriundo do meio sindical, como o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Delúbio chegou ao comando do PT via CUT. Foi tesoureiro da entidade e, depois, assumiu a secretaria sindical do partido. Em 2002, viajou ao lado de Lula e do vice-presidente José Alencar pelo Nordeste antes da costura da aliança PT-PL. No governo, demonstrou proximidade com o presidente -viajou para a África na comitiva oficial e, em 2003, foi fotografado segurando uma cigarrilha que Lula fumava às escondidas numa audiência.
Além de negar vínculos com Delúbio e Pereira, Dirceu manifesta disposição para explicitar acusações contra o PSDB e o PFL de que também adotaram caixa dois nas campanhas de 1998 (Minas Gerais) e 2002 (nacional). Ele lamenta que o governo não tenha optado por um discurso mais agressivo e tem dito: "O PT não roubou. Não tem dinheiro de empresa, de estatal. Tem dinheiro emprestado no banco".
Embora não se mostre esperançoso quanto às chances de evitar sua cassação, ele retomou o velho ritmo de articulação: conversa freqüentemente com o comando do Congresso, a ponto de ter telefonado para os presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), da Câmara, Severino Cavalcati (PP-PE), e da CPI dos Correios, Delcídio Amaral (PT-MS), para protestar contra a convocação dos banqueiros Gustavo Marinho e Daniel Dantas. Segundo ele, a decisão abala a imagem do país no exterior.
Ainda segundo interlocutores, Dirceu fala constantemente com os ministros da Coordenação Política, Jaques Wagner, da Fazenda, Antonio Palocci, e da Justiça, Márcio Thomaz Bastos. Com Lula, "o mínimo necessário".
Ameaçado de perder o mandato, o ex-ministro partirá para o ataque contra o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), autor das acusações que o derrubaram, e também contra correligionários como o presidente do partido, Tarso Genro, e o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (SP), a quem aponta como arquiteto da campanha para retirada de seu nome da chapa do Campo Majoritário nas eleições internas de 19 de setembro.
Até ontem, Dirceu resistia a sair da chapa do Campo Majoritário para viabilizar a candidatura de Tarso à reeleição. Segundo ele, Tarso cometeu um suicídio ao impor sua saída como condição para manter-se na disputa. Nas conversas com petistas, ele avisa ainda que existe uma articulação para incluir Tarso e o prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel, entre os investigados pela comissão de ética do PT por terem sido supostamente beneficiados por dinheiro de caixa dois.
Quanto a Jefferson, avisa: "Ainda não falei publicamente de todas as nomeações que ele me pediu e eu não dei. O ódio dele por mim é esse".
Em toda conversa, Dirceu se esforça para rechaçar qualquer idéia de ressentimento em relação a Lula. "O presidente não me deve nada. Sei me defender sozinho. Ele tem que cuidar do governo."

Lealdade a Lula
A interlocutores, o ex-ministro afirma que pensou em deixar o governo já em outubro de 2004, após o fracasso de mais uma tentativa de reforma ministerial. "Outubro a julho, sem maioria na Câmara e no Senado, só poderia dar em crise. Se o Alckmin ficar três meses sem maioria na Assembléia, sai CPI e leva a impeachment."
Em março de 2005, também pensou em deixar o governo, mas ficou pelo que descreve como "uma mistura de cristianismo, judaísmo, stalinismo e lealdade a Lula". "Quando falei para ele [Lula] "não dá mais", ele disse "vamos acertar como você vai sair". Eu falei: amanhã [segunda-feira]. Ele me segurou até quarta e Roberto Jefferson fez aquilo comigo", lamenta, numa referência ao fato de o petebista ter dado um ultimato, pela televisão, para que ele deixasse o governo antes de "prejudicar um inocente" -o presidente.
Na nascente de sua insatisfação, a política econômica: "Talvez pudesse ter tido uma política de juros diferente. Em vez de 19,5%, 13%. Esse risco, Lula não quis correr. O Lula é muito conservador".


Texto Anterior: Outro lado: Ex-ministro e Silvio negam envolvimento
Próximo Texto: Escândalo do "mensalão"/Palocci na mira: Dá para provar propina a Palocci, diz Buratti
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.