São Paulo, quinta-feira, 28 de setembro de 2000

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ÍNDIOS
Justiça Eleitoral proíbe a prática, que pode provocar cassação e até prisão
Ticunas treinam voto em telefone

DA ENVIADA ESPECIAL A TABATINGA

O índio ticuna Darci Bibiano Maratu, que concorre ao terceiro mandato na Câmara Municipal de Tabatinga (fronteira com a Colômbia) pelo PMDB, usa teclados de telefone para ensinar eleitores índios a usar a urna eletrônica.
O expediente é ilegal, pois, segundo a Justiça Eleitoral de Tabatinga configura simulação de urna. O candidato, se apanhado em flagrante, é preso no ato e pode ter sua candidatura cassada.
"Alguns dizem que é proibido, mas como o ensino é feito nas aldeias, ninguém vê", afirma o vereador. Ele justifica o ato afirmando que quase todos os cerca de 3.400 eleitores ticunas são analfabetos e não entenderam o treinamento da Justiça Eleitoral.
Darci Maratu conta que conseguiu 30 telefones com teclados e teve a idéia de usá-los para ensinar os ticunas a votar, nas aldeias, das 17h às 20h30. "Eles fazem fila para treinarem teclar o meu número (15444). Como as aulas começaram há um mês, já devem ter aprendido direitinho." Os ticunas representam 26% dos eleitores de Tabatinga. "O voto indígena decide a eleição", afirma Maratu.
Nas aldeias, o voto é escolhido pelos líderes religiosos, que se dividem entre católicos, protestantes e a Ordem da Santa Cruz, uma seita liderada pelo peruano "Irmão Francisco". Segundo Maratu, as indicações de voto dos líderes religiosos são seguidas sem questionamento. Pelo menos um terço dos votos indígenas para a Câmara de Tabatinga, segundo ele, vem da Ordem de Santa Cruz.
Irmão Francisco teria compromisso com candidatos de toda a região do Alto Solimões. Em troca do apoio pede tijolos e telhas para construir um templo e uma pousada às margens de um igarapé, em São Paulo de Olivença.
O líder religioso teria se comprometido com o atual prefeito de Tabatinga, Raimundo Nonato Souza (PTB), o "Boi". O prefeito tenta a reeleição pela coligação Tabatinga Forte, a de Maratu.
Segundo o ticuna, o prefeito prometeu asfaltar cinco ruas na aldeia indígena de Belém de Solimões, com 1.310 eleitores. As máquinas estariam embarcando ontem para a comunidade.
Indagado se ele crê que na conclusão da obra, uma vez que os equipamentos serão entregues a poucos dias do primeiro turno, Maratu respondeu: "'Se ele perder a eleição, os índios vão prender as máquinas lá até o asfalto ser concluído". O prefeito não foi localizado pela Folha. (ELVIRA LOBATO)


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