|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Tarso critica consenso na Itália sobre Battisti
Segundo o ministro, se valesse ideia da uniformidade de opiniões, até nazismo poderia ser legitimado
LUCIANA COELHO
ENVIADA ESPECIAL A BERNA
O ministro Tarso Genro
(Justiça) minimiza o raro consenso da direita e da esquerda
italiana pela extradição do terrorista Cesare Battisti, dizendo
que ele não deve servir de parâmetro ou influir no julgamento
brasileiro do caso porque, se
consenso nacional sinalizasse
algo, "teríamos de legitimar o
nazismo ou o stalinismo".
"O consenso pode ser uma
questão histórica concreta do
país. Isso não pode ser a medida
para o julgador brasileiro dar
ou não uma extradição", afirmou o ministro em entrevista à
Folha, anteontem, em Berna.
"Se valesse essa ideia do consenso teríamos de legitimar o
nazismo ou o stalinismo."
Interpelado sobre a estranheza da comparação, posto
que na Itália não vigora regime
de supressão da liberdade, o
ministro disse que estava falando de consenso político.
Sobre a declaração do líder
de esquerda italiano Piero Fassino de que a "parte da esquerda brasileira que é contra a extradição não entendeu o caso",
Tarso recomendou ao deputado, a quem disse respeitar muito, que lesse o processo no Brasil. "O ponto de vista que defendi está abrigado por quatro ministros do Supremo, depois
cinco, e nos mais preparados
juristas brasileiros."
Para o ministro, direita e esquerda no país europeu buscam "dividendos políticos"
com o caso. "[Isso] é absolutamente natural e respeitável numa democracia", afirmou.
"[Porém] o Brasil não pode estar subordinado a esse jogo político interno."
O Supremo Tribunal Federal
votou há dez dias para extraditar Battisti, condenado na Itália por envolvimento em quatro
assassinatos nos anos 70, quando era membro do grupo radical PAC (Proletários Armados
pelo Comunismo) -ele alega
inocência. Mas votou também
para passar a questão às mãos
do presidente Lula, que só deve
se pronunciar em 2010.
Tarso, que concedeu refúgio
ao italiano no início do ano, voltou a apresentar seus argumentos sobre as condições do julgamento e disse que, caso Lula diga "sim" a Roma, ele não verá a
decisão como uma desautorização do seu parecer. "O presidente tem o direito de mudar
sua avaliação."
Dinheiro bloqueado
O ministro veio à Suíça junto
com o secretário Nacional de
Justiça, Romeu Tuma Júnior,
para discutir a repatriação de
"entre US$ 20 milhões e US$
30 milhões" em fundos desviados por quatro fiscais da Receita no chamado "propinoduto"
do Rio, descoberto em 2002 e
que culminou na condenação
de 22 pessoas. "Estamos revertendo o fluxo do duto", disse
Tuma Júnior.
Ontem, o Ministério da Justiça anunciou que conseguiu
repatriar os cerca de US$ 30
milhões. Ainda não há data para a Suíça liberar o montante,
mas as autoridades afirmaram
que isso deverá ser feito em
curto prazo. O dinheiro irá para
os cofres da União, com a possibilidade de parte dele ser repassada ao governo do Rio.
Tarso se reuniu com sua colega suíça, Eveline Widmer-Schlumpf, e com a chanceler
Micheline Calmy-Rey para tratar do tema. Não foi decidido
ainda dentro de qual arcabouço
legal o dinheiro retornará ao
país, mas o ministro espera que
seja pela Convenção de Mérida,
tratado internacional sobre
corrupção ao qual o país aderiu
em 2006.
Tarso disse que o governo em
Berna reconheceu o dinheiro
como produto de corrupção.
"Se não fosse o reconhecimento concreto que houve na sentença judicial aqui na Suíça de
que esses recursos saíram do
propinoduto, eles não estariam
obrigados a devolver, porque
não existe um invólucro jurídico contratual entre nós que
obrigasse eles a devolverem."
Ele colocou ainda o significado moral da repatriação, que
faz com que o Brasil "possa desmontar a imagem que tem de
impunidade". Também elogiou
o que definiu como mudança
de cultura política em países
europeus, que têm se mostrado
mais dispostos a colaborar em
investigações do tipo.
Colaborou a Sucursal de Brasília
Texto Anterior: Saiba mais: Cemitério foi criado durante regime militar Próximo Texto: Pará: Acusado de matar religiosa vai a júri popular pela terceira vez Índice
|