São Paulo, sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

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Procurador italiano critica omissão de países da Condor

Autor dos pedidos de extradição diz que autoridades não ajudaram na investigação

Giancarlo Capaldo quer que acusados sejam julgados na Itália; governo brasileiro diz não haver pedido de colaboração na apuração

MARCELO NINIO
DE GENEBRA

O procurador italiano Giancarlo Capaldo quer a colaboração do Brasil para que os brasileiros que tiveram o pedido de extradição decretado por crimes da ditadura possam ser julgados na Itália.
Capaldo, que investiga desde 1999 a tortura e o desaparecimento de cidadãos italianos na Operação Condor -plano de repressão conjunta de ditaduras sul-americanas contra opositores nos anos 70 e 80-, foi o autor dos pedidos de prisão expedidos na segunda, em Roma, pela juíza Luisanna Figliola.
Em entrevista à Folha, Capaldo confirmou que entre os 140 acusados citados no pedido de extradição há 11 brasileiros. Mas disse que não poderia revelar os nomes. Embora a Constituição não preveja a extradição de cidadãos brasileiros, como deixou claro o ministro da Justiça, Tarso Genro, Capaldo reiterou que o objetivo do pedido de prisão é interrogar e julgar na Itália os responsáveis pela Operação Condor. Ou, no mínimo, fazer com que sejam processados no Brasil. "Esperamos contar com a colaboração das autoridades brasileiras para que os acusados sejam julgados na Itália."
Pouco antes, em entrevista à agência de notícias espanhola Efe, ele se queixou da pouca ajuda recebida dos governos na investigação iniciada há 18 anos sobre o desaparecimento de 25 cidadãos italianos no Brasil, Chile, Argentina, Uruguai e Bolívia. "A falta de colaboração das autoridades desses países complicou muito as coisas", disse. "É dificílimo investigar em outro país sem a ajuda de suas autoridades."
O Itamaraty afirmou não ter encontrado, em "consulta rápida na área jurídica", nenhum registro desde 1998 de pedido relativo à Operação Condor, nem com o nome do procurador Capaldo. O Ministério da Justiça disse não haver "registros sobre qualquer solicitação feita pelo governo italiano sobre o caso Condor nesta gestão e em nenhuma outra".
A Embaixada do Brasil em Roma não recebeu até ontem nenhuma notificação das autoridades italianas. Diplomatas dos dois países esperam que o pedido de prisão seja feito pelo Ministério da Justiça italiano a seu equivalente no Brasil.
Este é o procedimento que costuma ser seguido por países que mantêm acordos de cooperação em matéria penal, como Brasil e Itália. Diplomatas prevêem que a notificação ao Ministério da Justiça brasileiro, contudo, poderá demorar semanas, já que a documentação precisa ser traduzida para os idiomas dos países dos acusados, espanhol e português.
O advogado Giancarlo Maniga, que defende na Itália parentes argentinos e chilenos de vítimas da Operação Condor, comemorou os pedidos de prisão. Para ele, a decisão tem grande importância simbólica, pois indica que os crimes são graves demais para ficar impunes, mesmo depois de tanto tempo.
Ele reconheceu, no entanto, que a execução dos pedidos não será tarefa fácil, diante da "extrema complexidade" dos processos. "O nível de cooperação judicial varia de país para país e as legislações domésticas também são diferentes em cada lugar", disse Maniga à Folha, de Roma. "É preciso examinar, por exemplo, como as leis de anistia se aplicam a cada caso."
Pelo que se sabe da investigação, os 11 brasileiros citados são acusados pelos desaparecimentos de Horacio Domingo Campiglia e Lorenzo Ismael Viñas. Ambos cidadãos ítalo-argentinos, foram vistos pela última vez em 1980, o primeiro no Rio e o segundo em Uruguaiana (RS). Seus casos não se enquadrariam na Lei da Anistia brasileira, que perdoou crimes políticos cometidos até agosto de 1979.
O pedido de extradição, feito na véspera do Natal, pegou de surpresa até os que acompanham o dia-a-dia do caso, como o advogado Maniga. Para ele, a decisão parece ter sido especialmente acelerada para surpreender Jorge Néstor Troccoli Fernandez , ex-agente da Marinha uruguaia acusado de seqüestros para fins de homicídio na época da ditadura, o único da lista que estava na Itália.
O uruguaio foi preso na segunda em Salerno, no sul do país, e ontem teve sua primeira audiência em Roma. À juíza Luisanna Figliola, Troccoli negou as acusações. Disse que era só um subtenente encarregado de recolher informações.


Com a Sucursal de Brasília


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