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CELSO PINTO
Cautela com o fim da crise
Washington - Na reunião
anual do FMI (Fundo Monetário
Internacional), em setembro passado, o centro da discussão era se
o mundo iria repetir uma depressão ao estilo dos anos 20. Nesta
"reunião da primavera" do FMI,
encerrada ontem em Washington,
o clima foi muito melhor, mas
houve cautela em declarar que o
pior já passou.
A prudência é uma boa conselheira para o FMI. Na reunião do
FMI de 97, em Hong Kong, o tom
dominante foi o de que o pior da
crise asiática já havia passado,
poucos meses antes de a crise assumir proporções catastróficas na
região. A Indonésia, até então
pouco atingida, foi saudada em
Hong Kong como exemplo de um
país que escapou da crise porque
foi mais longe na liberalização
dos fluxos de capitais. Entrou em
colapso logo em seguida, e seu PIB
caiu 14% em 98.
Economistas independentes endossam a cautela. O prestigiado
IEI (Instituto para a Economia
Internacional), de Washington, é
um deles. Morris Goldstein, do IEI
e ex-alto funcionário do FMI, sugere: "É bom manter, por enquanto, o champanhe na geladeira".
O principal receio é de um segundo mergulho da economia
mundial. Em vez de consolidar a
recuperação recente dos mercados e retomar o crescimento, o
medo é haver uma nova rodada
de problemas.
Goldstein disse à coluna que as
chances de haver uma nova rodada de problemas são equivalentes
às de o rumo melhorar de vez. Os
principais riscos, a seu ver, vêm de
três áreas: Japão, China e Europa.
O medo no Japão é o estímulo
fiscal não funcionar e a política
monetária acelerada fazer o iene
voltar à região de 150 ienes por
dólar. O medo na China é uma
desvalorização que leve a uma
nova rodada de desvalorizações
na Ásia. A China só manteve o
crescimento no ano passado graças a uma injeção de gastos públicos, mas as exportações estão
caindo neste ano, depois de ficarem estagnadas em 98.
A Europa também preocupa
porque está desacelerando. Como
a previsão é que os Estados Unidos tenham que reduzir o crescimento já neste ano, porque não
têm mais como sustentá-lo apenas pela demanda de consumo, a
Europa teria que ocupar seu lugar
como "locomotiva" da economia
mundial.
Se isso não acontecer, a recuperação esboçada nos preços das
matérias-primas vai reverter, e,
com isso, vai se complicar a situação de países emergentes que dependem de exportações desses
produtos.
Obviamente, o cenário positivo
de Goldstein é o oposto. O Japão e
a Europa se recuperam, os Estados Unidos aterrissam de forma
suave e os países emergentes continuam com suas reformas.
Goldstein está convencido, de
todo modo, que os mercados financeiros reagiram, por enquanto, de forma exagerada no lado
positivo. A recuperação não veio
puxada por melhoras significativas nos fundamentos dos países
emergentes, mas pela ambição de
assegurar ganhos de curto prazo.
De fato, os prêmios pagos por títulos de países emergentes caíram
rapidamente de mais de 900 pontos básicos de porcentagem acima
dos títulos do Tesouro americano
(ou mais de 1.000 no caso brasileiro) para a casa dos 500 pontos.
Em 96, na euforia anterior à crise
asiática, o prêmio ficou na casa
dos 300 pontos. Valorizações como essa significam oportunidades
de ganhos rápidos de capital não
disponíveis nos mercados desenvolvidos. A percepção é que nesses
países, especialmente na Bolsa
americana, os preços já estão altos demais.
O principal receio, diz Goldstein, é que a rapidez da recuperação financeira acabe tirando o fôlego para avançar nas reformas
necessárias na Ásia e no Brasil.
Houve progressos importantes
nos dois lugares, mas ainda sobram dúvidas.
O teste decisivo para o Brasil será mais para o final do ano, diz. A
economia e as exportações precisam reagir, e o governo precisa
mostrar progressos concretos na
área dos fundamentos da economia. Na Ásia, da mesma forma, o
progresso recente ainda é incipiente, e, se, por exemplo, a Coréia não mostrar vontade de continuar as reformas no setor produtivo, pode estar sujeita a uma
nova rodada de desconfiança.
Outra área de cuidados, observa, é a estrutura da dívida. Por
enquanto, ainda é cedo para rejeitar capitais de curto prazo, mas
é essencial que o Brasil não repita
os erros passados e se torne vulnerável a esses capitais.
Da mesma forma, é preciso colocar um limite na dependência de
capitais externos. No mundo pós-crise asiática e russa, "um país terá que ter uma história muito incomum para contar se quiser ter
um déficit em conta corrente de
4% ou 5% do PIB", sugere.
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