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JANIO DE FREITAS
O nome da crise
Crise política não resulta
de um só fator. Mas, entre os
elementos que a provocaram, há
sempre um principal, gerador da
maioria dos outros que se acumularam e conjugaram.
A derrota do governo na disputa pela CPI dos Correios, com a
conseqüente instalação de ares de
crise, é atribuída por Lula e José
Dirceu ao apoio de parlamentares do PT e do PC do B ao requerimento de inquérito, uns "nove"
que se recusaram a retirar a assinatura. Apesar de irrelevante,
uma vez que o requerimento
apresentou os apoios necessários,
o número de resistentes citado pelos governistas merece uma observação: tanto Dirceu e outros podem dizer que faltaram xis, como
se pode dizer que sua citação não
é verdadeira, porque nada indica
quantos, de fato, manteriam ou
mudariam de lado.
A aprovação da CPI não é, como tantos dão a entender, "a" crise. É o ponto atual, e por ora culminante, de um desarranjo que
vem de muitos meses, em uma seqüência de agravantes cuja culminância anterior foi a derrota
do governo para Severino Cavalcanti na disputa pela presidência
da Câmara.
Na seqüência do desarranjo, a
relevância pode variar, caso a caso, de uns para outros dos fatores.
Em todos, porém, um fator permanece entre os de maior influência: José Dirceu. Na útil definição que a gíria proporciona, o
trator José Dirceu.
Na derrota vexaminosa do comando governista em torno da
CPI, o papel determinante de José
Dirceu mostrou-se com clareza
total. Levado por sua truculência
permanente, precipitou um bate-boca com a oposição que a acirrou, agraciou-a com amplos espaços na mídia, obrigou-a a empenhar-se em uma disputa que de
início era só provocação retórica
-e José Dirceu nem ao menos sabia com que forças contava. A rigor, veria já tardiamente, não
contava, mas para isso tem a saída de outra truculência: culpa um
punhado de segundos e terceiros.
A percepção das circunstâncias
está nublada no governo, há muito tempo, pelo deslumbramento
de Lula (com o poder e, mais ainda, com ele mesmo) e pela truculência de José Dirceu. No caso da
CPI, José Dirceu nem ao menos se
deu conta de que havia um ingrediente muito forte, ausente, por
exemplo, na disputa perdida para
Severino Cavalcanti: a opinião
pública, ativada pela unanimidade da mídia. José Dirceu tomou o
comando da operação abafa e
partiu para cima das lideranças
partidárias e de muitos parlamentares, sem considerar que os
punha diante dessa escolha: o governo já enfraquecido e mais perturbado, além de velho descumpridor de acordos, e, de outra parte, o eleitorado com seu apoio para um gesto valorizador também
na tabela palaciana. Era hora de
sutileza, não de truculência.
As diferenças de intensidade
com que José Dirceu tem aplicado
o seu estilo atropelador não alteram a linha que, desde o início do
governo, caracteriza a sua ação
com o Congresso, com a mídia e
no âmbito governamental. Exceto na política econômica, e exceto
em termos, José Dirceu não reconhece limites políticos e administrativos à sua interferência autoritária. Se não convém fazê-lo por
via direta, interfere por via indireta, valendo-se, inclusive, de porta-vozes ocultos (mas nem tanto)
que tem em jornais. Nada na prática política do governo e de Lula
é alheio à sua influência incisiva.
Como tático do governo, Dirceu
não tem mostrado as habilidades
com que formulou a estratégia
para Lula. Não é responsável pela
"crise da CPI" por ter aprovado o
vigarista para os Correios, como o
acusa o senador Cristovam Buarque -ele próprio incapaz de dar,
em seus tantos pronunciamentos
recentes, explicação respeitável
para recusar apoio à investigação
parlamentar da corrupção. O nome da "crise política" é José Dirceu porque a crise é do governo, e
o dedo forte na política do governo, forte demais e certo de menos,
vê-se em José Dirceu.
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