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ENTREVISTA DA 2ª
Publicitário acha errado colocar o candidato "para chorar"
"Fiz o feijão-com-arroz", diz marqueteiro de Ciro
RENATA LO PRETE
DA REPORTAGEM LOCAL
Ao reduzir as chances de um segundo turno entre governo e PT,
dado como provável até semanas
atrás, o crescimento de Ciro Gomes (PPS) na disputa presidencial
ameaça cancelar o embate final
entre Nizan Guanaes e Duda
Mendonça, marqueteiros responsáveis, respectivamente, pelas
campanhas de José Serra (PSDB)
e Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Em escalas diferentes, os candidatos das duas estrelas do marketing político experimentam refluxo nas pesquisas.
Enquanto isso, opera na campanha de Ciro um publicitário de
perfil mais discreto. Einhart Jacome da Paz, 48, não se manifesta
publicamente sobre estratégia,
sua ou dos adversários.
Mas se permite uma estocada ao
dizer que não vai pôr "Ciro para
chorar ou fazer hino com todo
mundo cantando". E outra ao observar que, "quando marqueteiro
vira transformador do sério em
sorridente e do informal no bem
vestido, isso nada tem a ver com o
trabalho e nos dá péssima fama".
Casado com a única irmã de Ciro (o candidato tem ainda três irmãos), Paz começou a trabalhar
em política com alguns comerciais para as Diretas-Já.
Fez a primeira campanha de
Tasso Jereissati para o governo do
Ceará (1986) e as de Ciro para a
Prefeitura de Fortaleza (1988) e a
sucessão de Tasso (1990).
Trabalhou na primeira eleição
de FHC (1994). No ano passado,
conseguiu vitórias em duas campanhas para o PSD em Portugal.
Na entrevista abaixo, concedida
no início da noite de sexta-feira, o
publicitário afirma que os analistas superestimam o papel de Patrícia Pillar no movimento ascendente de Ciro, em detrimento de
qualidades do candidato.
E prevê insucesso aos que tentarem derrubá-lo por meio da associação com Fernando Collor de
Mello. Paz toma emprestado a saga de "Guerra nas Estrelas" para
pontuar diferenças entre os dois
políticos: na percepção do eleitor,
o ex-presidente teria as características de Darth Vader, e Ciro, de
Anakin Skywalker, o mesmo personagem quando jovem, antes de
ser tentado pelas "forças do mal".
Folha - Há pouco mais de um mês,
adversários e comentaristas diziam que os programas de TV de Ciro não tinham a qualidade técnica
dos de Lula e Serra. À luz do que indicam agora as pesquisas, como o
sr. analisa essas críticas?
Einhart Jacome da Paz - Campanha política deve visar eficiência,
não pirotecnia. Fiz o feijão-com-arroz. Procurei transmitir, de forma simples e até um tanto repetitiva, a biografia do Ciro.
Sabíamos que o eleitor se lembrava dele, mas desconhecia sua
trajetória ou havia se esquecido
dela. Então os programas tinham
de contar, sem mirabolâncias, onde ele nasceu, onde se criou, o que
já fez e o que pretende fazer.
Não vou colocá-lo para chorar,
não vou fazer hino com todo
mundo cantando. Meu objetivo é
comunicar que ele tem capacidade para ser presidente da República. E essa idéia é crível.
Folha - Ciro, como os demais antes dele, subiu por causa da TV?
Paz - No primeiro momento,
sim. Só que os programas partidários terminaram há um mês, e a
curva dele permanece ascendente. Isso ocorre porque a informação era boa, não tinha penduricalho para ficar mais bonitinha.
Folha - Olhando em retrospecto,
o empenho dos tucanos para tirar
Ciro do ar e a consequente entrada
em cena de Patrícia Pillar foram benéficos à campanha?
Paz - É difícil avaliar. Em pesquisa feita muito antes dos programas, entrevistados, especialmente mulheres, diziam que achavam
bonito o fato de o Ciro ter se afastado da campanha, no final do
ano passado, para cuidar da Patrícia quando ela esteve doente. Outros reclamavam, achando que ele
não estava suficientemente interessado na eleição.
Acho que a aparição da Patrícia
pode ter significado, para muita
gente, algo como "olha, ele esteve
fora por minha causa, mas eu o
estou entregando aqui de volta, e
nós vamos ganhar juntos". O casamento do Ciro com a Patrícia
não é uma estratégia de marketing. É um caso de amor.
Folha - Essa análise não lhe parece insuficiente para explicar o valor
agregado de uma mulher com as características e a história pessoal de
Patrícia Pillar?
Paz - Tivemos 40 minutos de comerciais em junho. Ela usou 15.
Então não sei se esse foi o fator
principal. Acho que o gesto bonito dela, permitido pelo medo do
PSDB, sem dúvida teve um efeito.
Folha - Quinze minutos de Patrícia não seriam mais eficientes do
que 25 de Ciro e de políticos do PTB
exibidos nos programas?
Paz - Pode ser verdade, como
pode não ser. De todo modo,
sempre acredito que a eficiência
está em um conjunto de ações. E,
se o Ciro não fosse quem é, não ia
adiantar a Patrícia. Basta ver qual
foi o máximo crescimento pós-televisão de cada candidato. Ele superou todos. E superou também
na duração do efeito.
Folha - Para isso não contribuiu o
fato de ele ter aproveitado a última
janela dos horários partidários? Esse calendário foi calculado?
Paz - Foi uma estratégia e uma
necessidade, porque o Ciro só poderia usar o espaço dos partidos
aliados -ainda assim com todas
as dificuldades que tivemos- depois da convenção da Frente Trabalhista. O PTB e o PDT concordaram que valia a pena esperar.
Dizem que o Ciro é estourado,
mas foi preciso frieza para chegar
a 9% e segurar a aliança contra os
rumores que a imprensa divulgava o tempo todo: "O PTB está
saindo", "o Brizola não vai mais".
Folha - Dentro dessa lógica, não
teria sido melhor crescer um pouco
mais tarde, evitando o custo de virar vidraça semanas antes do horário eleitoral gratuito?
Paz - Aí entramos no terreno do
incontrolável. Eleição não se ganha na pesquisa, só na urna. Portanto, o momento ideal para ultrapassar o Lula seria na véspera
da votação. Mas isso não é possível calcular. O Ciro subiu. Então a
campanha que trate de criar
apoios para segurá-lo.
Folha - Como o sr. vê a afirmação
tucana de que tudo mudará no horário gratuito, já que o tempo disponível para Serra será muito superior ao dos adversários?
Paz - Para o bem deles, seria
bom que estivessem certos. Para o
nosso, espero que estejam errados. Mas isso é futuro, e eu não falo sobre o futuro. Seria errado falar até porque eu posso propor estratégias, mas as decisões políticas
ficam acima de mim.
Folha - O sr. costuma dizer que o
fator Collor não vai derrubar Ciro.
De onde vem sua convicção?
Paz - Há 10% de eleitores que
não votariam no Ciro de jeito nenhum. Esses o acham parecido
com o Collor. Isso é ruim, mas
não quer dizer que a conversa faça
sentido para o restante do eleitorado. Com esses 10% ninguém vai
conseguir ganhar a eleição.
Outro dia me ocorreu o seguinte. O Collor, quando foi eleito, representava a "força". Mas, na percepção das pessoas, acabou aceitando o "lado negro", como uma
espécie de Darth Vader.
Mas do "lado bom", representado pelo Anakin Skywalker, as pessoas gostam. Cabe ao Ciro mostrar que ele não vai passar para o
"lado de lá", que ele é diferente.
Folha - As equipes de Lula e Serra
ignoraram o potencial de Ciro?
Paz - Não vou dizer que foi um
erro, porque isso nos ajudou. Mas
aconteceu. Agiram o tempo todo
como se estivesse decidido o seu
encontro no segundo turno, como se fosse possível ignorar um
candidato bom de TV e que tem a
menor taxa de rejeição. Mas, assim como não falo sobre as minhas estratégias, não quero analisar as dos outros.
Folha - Com a subida nas pesquisas, não pára de entrar gente na
campanha, inclusive na sua área.
Isso ajuda ou atrapalha?
Paz - Nossa equipe não tende a
crescer muito. Gente batendo cabeça, sem ter o que fazer, só gera
intriga. Se a equipe for enxuta e
todos tiverem trabalho, ninguém
fica pensando em fazer bobagem.
Folha - Há quem diga que o crescimento de Ciro coloca em xeque
um modelo, em tese representado
pelas campanhas de Lula e Serra,
que daria excessiva importância
aos marqueteiros. O sr. concorda?
Paz - Para mim, o bom homem
de marketing é um tradutor de
meios. Auxiliado por analistas, faz
a informação chegar ao maior número possível de pessoas. Quando ele vira cirurgião plástico, alfaiate, produtor de eventos, transformador do sério em sorridente
e do informal no bem vestido, isso
nada tem a ver com o trabalho e
nos dá péssima fama.
Como se o marqueteiro pudesse
chegar e fazer acontecer. "Vou
transformar você e você vai ganhar." Mentira. Eu me recuso a
dizer isso a qualquer cliente. Faço
um trabalho sério. Agora, não vou
dizer que meu trabalho é mais importante que o do sujeito que vai
pedir voto na rua, porque não é.
Folha - É mais complicado trabalhar para o cunhado?
Paz - Sim e não. Sim porque é alguém da família. Eu me dou muito bem com a família da minha
mulher, mas também sou capaz
de levantar da mesa e ir embora se
o candidato não acreditar no que
faço. Com uma família unida como a do Ciro, isso não é fácil.
O lado fácil é que, pelo menos eu
imagino, ele confia mais em mim,
porque sabe que eu não teria por
que fazer algo contra ele.
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