São Paulo, sexta, 30 de janeiro de 1998

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VIAGEM À SUÍÇA
FHC nega que atual política de juros seja uma 'bomba-relógio'
Presidente critica governos estaduais por 'maus gastos'

IRINEU MACHADO
enviado especial a Berna


O presidente Fernando Henrique Cardoso disse ontem que os Estados que usam os recursos provenientes das privatizações em gastos correntes, como obras de infra-estrutura, cometem um "erro grave", já que o país faz esforço fiscal "para levar para a frente o processo de crescimento".
FHC disse que, por razões constitucionais, não tem poder para limitar as decisões dos governos estaduais e apelou às oposições e à sociedade para reagirem contra o descontrole das contas.
"As oposições, os partidos do grupo do governo e os demais e a sociedade nos Estados devem discutir essa questão e reagir contra o que seria eventualmente um erro de gastos", disse. "Sou radicalmente contrário à utilização desses recursos (da privatização) em gastos correntes."
Bomba-relógio
As declarações foram feitas em entrevista coletiva em Berna, depois do encontro de FHC com o presidente do Conselho Federal da Suíça, Flavio Cotti. O presidente está na Suíça em visita oficial.
FHC negou que a taxa de juros do Brasil, uma das maiores do mundo, tenha o efeito de uma "bomba-relógio" nas contas públicas do próximo mandato, seja dele ou não.
"O governo não prepararia uma bomba de retardo para matar a si próprio, pelas suas mãos. Imaginando que eu seja candidato, que eu precise de eleitores, que eu ganhe, seria demais. Seria ridículo se eu fizesse isso. O que o governo fez foi tomar as medidas necessárias para evitar que houvesse um agravamento da crise", afirmou.
Ele atribuiu ao que chamou de "fracassomania" a existência dessa análise sobre a taxa de juros.
FHC negou que haja uma "articulação" para a renúncia em massa de ministros em março. "Os ministros que estão lá são de minha confiança. Não vão sair. Vi nos jornais que haveria alguma articulação. Se há, não é necessária. Se for o caso, eu converso com cada ministro", disse.
No encontro reservado entre FHC e Cotti, os dois conversaram sobre semelhanças de pensamento de ambos os governos, futebol e o relacionamento comercial dos países (a Suíça é o quinto maior investidor internacional no Brasil).
Leia a seguir trechos abordados durante a entrevista coletiva.

TAXA DE JUROS - "Todas as pessoas de bom senso sabem que ou o governo fazia isso (aumentar a taxa) ou teria uma desvalorização e em seguida subiriam as taxas de juros. Só que o governo tomou uma medida necessária, uma decisão de emergência. Não tem nada a ver com o propósito de criar uma bomba de retardo, até porque isso seria inconsistente. A população entendeu e aplaudiu. Diante das circunstâncias, olhando o ambiente mundial, nós vamos baixando as taxas de juros."
REFORMA FISCAL - "Não estou dizendo que o governo está fazendo esforço fiscal para atrair investidores. Não é isso. Estamos fazendo um esforço fiscal para levar à frente um processo de crescimento no país. Nossa preocupação primeira não é com os investidores. É com o país, com a economia."
GASTOS DOS ESTADOS - "Dentro dos limites das nossas possibilidades, quando fazemos negociações das dívidas dos Estados, tomamos medidas que restringem a possibilidade de os Estados voltarem a ter comportamentos abusivos."
ISENÇÕES FISCAIS - Questionado sobre a efetividade dos esforços do governo federal no ajuste fiscal diante de Estados que abrem mão de receita para atrair investimentos, especificamente sobre o Paraná e a Renault, o presidente disse: "O caso mencionado é um pouco diferente. Tem a ver com o que se chama no Brasil de guerra fiscal. Alguns Estados estão implantando condições de investimento em competição com outros. A base racional disso é a seguinte: eles imaginam que sem isso eles não teriam os investimentos e, portanto, não teriam sequer os recursos que estão sendo doados sob forma de isenção. Estão dizendo: se colocarem 1.000, eu abro mão de 500, mas eu ainda fico com 500. Mas esses 500 que eu fico são empregos. É a rearticulação da economia. É uma técnica de desenvolvimento do Estado. O governo tem muitas dúvidas quanto à utilidade desses mecanismos de guerra fiscal. O governo federal é favorável a uma reforma tributária que implique a transformação do ICMS em imposto do valor agregado, que diminuiria esses ímpetos".
REELEIÇÃO - Negando que esteja demonstrando na Suíça um otimismo sobre a reeleição maior do que no Brasil: "A impressão, talvez, que eu tenha dado é a seguinte: às vezes, me perguntam se, no caso de eu perder a eleição, a política econômica vai mudar. Prefiro dizer que é melhor não levantar essa hipótese porque não quero que se levante a hipótese de mudar a política econômica".



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