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ELIO GASPARI
Propina sem empresário é praia sem sol
Uma pesquisa da PricewaterhouseCoopers mostrou
que 96% dos 79 presidentes de
empresas que faturam mais de
US$ 100 milhões consideram a
corrupção o principal problema
brasileiro. Esse resultado fica de
outro tamanho se um (basta um)
desses 79 senhores disser publicamente o que acha de seus similares do Banco Rural e da Usiminas, empresas apanhadas na malha valeriana.
A idéia de que os políticos e servidores corruptos passam os dias
dando e tomando dinheiro deles
mesmos é ingênua e matematicamente neutra.
Sem empresários, a corrupção é
uma praia sem sol. Bem ou mal, o
Congresso e a administração pública expõem e punem seus corruptos. O mundo dos negócios
melhoraria se, além de reclamar
da corrupção dos outros, os grandes empresários repelissem os
malfeitores com quem convivem
felizes. Nunca é demais lembrar
que a Fiesp divulgou uma nota de
solidariedade à butique Daslu
quando ela foi varejada pela polícia. Recordar é viver. A Poderosa
disse o seguinte: "Fatos notórios
recentes, vivenciados pela sociedade, revelam situação de anormalidade (...). Não há como se
manter alheio ou indiferente a essa realidade". A anormalidade,
para a guilda, estaria na ação da
polícia.
Uma história inútil, mas inesquecível
Saiu um livro para pessoas cansadas de ler coisa séria. É "O Imperador do Olfato", de Chandler
Burr. Conta a história do biólogo
italiano Luca Turin, com seu
mundo de perfumes e uma teoria
(provavelmente errada) para explicar o funcionamento do misterioso sentido do olfato. É difícil
aparecer um livro capaz de ensinar tantas coisas inúteis e inesquecíveis. Quem vai esquecer que
a amostra nš 5 de um perfume encomendado por Coco Chanel
continha uma mistura desandada? Ou que o "Ma Griffe", de Carven, foi criado pela memória de
um perfumista que tinha perdido
o olfato?
Luca Turin é um personagem
do século 19 com a cabeça no 21.
Caça perfumes extintos. Achou
num antiquário de Moscou um
exemplar do "Le Parfum Idéal",
do mestre Houbigant. Foi esse
aroma que denunciou Maria Antonieta quando ela tentava fugir
da França, em 1791. A fórmula
perdera-se. Turin foi enfeitiçado
pelas grandes criações de Guerlain, Chanel, Dior e Patou. Queixa-se da diluição das fragrâncias,
acha que já passou a moda de perfumes "bulímicos" ("Poison"),
mas entrou-se numa fase "anoréxica" ("Eau d'Issey"). Parece brincadeira, mas a griffe de Miyake
teria encomendado uma molécula com cheiro de água. Serviço:
os perfumes precisam de tempo
para acordar. O "Chamade",
de Guerlain, por exemplo, pede
duas horas.
O mercado dos aromas mexe
com US$ 20 bilhões a cada ano
e todos os cheiros industriais,
do último Ralph Lauren ao detergente da pia, são criados por apenas sete companhias. Produzem
algo como duas mil novas moléculas por ano e aproveitam três
ou quatro. Nesses laboratórios,
o toque de limão dos Calvin Klein
chama-se hidromircenol e o segredo do Chanel nš 5 (repetido no
nš 22) está no predomínio de aldeídos pares.
Chandler acreditava que Turin
ganharia o Prêmio Nobel de Medicina. O mistério do olfato está
na dificuldade de se explicar como o nariz recebe uma molécula
de oxano (oxigênio com enxofre)
e o cérebro registra que há uma
manga por perto. Desde o início
do século passado há duas teorias
em choque. Uma crê que cada
molécula tem uma forma, captada por um receptor do sistema
nervoso. Outra, endossada por
Turin, entende que o segredo está
na vibração dos elétrons dos átomos de cada molécula. 840 vibrações? É papaia. Comprovada na
linha de produção, essa teoria
destruiria o atual mercado de produção de aromas.
"O Imperador do Olfato" saiu
em 2002 e tudo ia muito bem para
a tese da vibração, até que, no final
do ano passado, o Prêmio Nobel
de Medicina foi para dois professores que descobriram a estrutura
dos receptores do olfato, adeptos
da teoria da forma, bastante maltratados por Burr no livro. Turin
parece ser muito melhor que sua
teoria.
Valério 0.2
Marcos Valério poderá reaparecer no noticiário. Tudo
depende de suas conversas
com o Ministério Público. O
irmão-provedor do PT se
equilibra entre a preservação
de sua liberdade pessoal e a
defesa de seu patrimônio.
Uma coisa é certa: a versão
0.2 de Valério tem um vírus
para os programas tucanos.
9x1 e 1x9
Um dos notáveis que participaram da reunião de empresários e figuras do andar de
grife com Geraldo Alckmin
em Comandatuba fez uma
rápida pesquisa eleitoral. O
tucano bate Lula por 9x1. O
mesmo curioso tentou medir a tendência da criadagem
que serviu comes e bebes aos
maganos. Deu o contrário.
Filas culturais
O presidente do INSS,
Valdyr Moysés Simão, está
certo. Há uma "questão cultural" em cima das filas da
madrugada nos postos do
INSS. Ele acredita que a turma do andar de baixo, por
néscia, acorda no meio da
noite para buscar serviços e
benefícios pelos quais pagou. Esse pedaço da "questão cultural" vai por conta da
nomeação de demófobos
para funções relevantes na
administração pública. Gente que atribui a própria incompetência à cultura do
povo que lhes paga os salários. A verdadeira "questão
cultural" é outra. Freqüentemente, os governantes brasileiros, por leviandade derivada da ignorância e/ou da
preferência pela empulhação, prometem mentiras.
Em outubro do ano passado,
"nosso guia" disse o seguinte: "A ordem é acabar com as
filas dando dignidade ao cidadão. A partir de março,
começo de abril, podem me
cobrar".
De olho na Viúva
Em campanha, "nosso guia"
diz que legalizou as centrais
sindicais. Falso. Ele abriu
o caminho para que a bolsa
da Viúva dê mais dinheiro
para sustentar essas organizações.
Lula começou sua carreira
defendendo a liberdade sindical. Tendo chegado à chave do cofre, aprofunda as
tungas que herdou. Os sindicalistas brasileiros defendem todas as liberdades,
menos a do trabalhador decidir se deve ou não pagar
pela máquina que, em tese,
defende seus interesses.
Candidato legível
Cesar Benjamin será candidato a vice-presidente da
República na chapa do
PSOL. Anunciou isso numa
carta onde diz que a esquerda brasileira "corre o risco
de sair da história" por
conta de "um processo inédito, a dissolução de dentro
para fora".
Numa campanha em que
prevalecerão o messianismo
e a banalidade, ele traz a
oportunidade da reflexão,
inclusive para aqueles que
não concordam com uma só
palavra do que diz.
Faz tempo que os seu textos
parecem exagerados quando aparecem e se revelam
proféticos dois ou três anos
depois. Em 1995, ele foi-se
embora do PT que fundara,
quando sentiu o cheiro de
queimado no sistema de arrecadação guiado por Lula.
Em 2002, avisou que a cobiça se espalhara e anteviu a
regência de uma quadrilha-companheira que levaria a
esquerda ao mausoléu das
roubalheiras. No sítio www.contrapontoeditora.com.br, que é o nome de sua editora e não de um de seus
livros, como saiu aqui, há
20 textos do candidato.
Quem quiser conferir, pode
tirar proveito.
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