São Paulo, domingo, 30 de julho de 2006

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Governo agora quer alterar regra de emendas

Na esteira do escândalo dos sanguessugas, proposta a ser enviada ao Congresso prevê mudanças na execução orçamentária

A idéia é que deputados e senadores possam apenas apresentar emendas para políticas públicas desenvolvidas pela União

MALU DELGADO
DA REPORTAGEM LOCAL

A gravidade do escândalo da máfia dos sanguessugas, que desviou recursos de emendas parlamentares para a compra de ambulâncias, levou o governo federal a apressar o debate sobre mudanças na execução orçamentária, embora há alguns anos deputados e senadores que integraram a CPI dos Anões do Orçamento, em 1993, alertassem que era necessário rever as regras para se evitar outro esquema de corrupção semelhante ao da era Collor.
Será enviada ao Congresso, em novembro, uma proposta de alteração da lei que estabelece regras para elaboração e fiscalização dos orçamentos da União, Estados e municípios. Entre os pontos centrais da mudança estão a obrigatoriedade de prestação de contas on-line para todas as esferas do Executivo e a redefinição sobre o destino das emendas parlamentares individuais.
"Vamos ser sinceros: esse escândalo dos sanguessugas mostra que estamos no fundo do poço. Não tem mais como manter isso", disse à Folha o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, que coordena as ações no governo para aprovar as mudanças. Em 2005, como presidente da Comissão Mista de Orçamento, ele pregava a necessidade de mudanças.
A idéia, polêmica, é que deputados e senadores passem a ter direito de apresentar emendas somente para políticas públicas desenvolvidas pela União. Seria vedada a possibilidade de apresentarem emendas para gastos dos Estados e municípios. A prática seria substituída pelo compromisso da União em destinar verbas diretamente às prefeituras e governos estaduais.
"Para o que é de competência da União, caberia emendas. Não tem mais cabimento fazer emendas para o que é competência de Estados e municípios", explica o ministro.
Questionado sobre a forte resistência dos parlamentares à mudança, já que os deputados usam as emendas para seduzir seus redutos eleitorais, Bernardo é categórico: "Se querem esse tipo de emenda, que sejam vereadores. Não dá para jogar dinheiro fora. O que não pode é você descobrir que teve um monte de emendas para ambulâncias e parte foi roubada".
O ministro disse que a proposta está pronta, mas o governo aguardará o fim da eleição e retomada dos trabalhos do Congresso para enviá-la. A lei hoje em vigor (nš 4.320) é de 17 de março de 1964, aprovada no governo João Goulart.
Em seu artigo 33, a velha lei estabelece os casos para os quais não se admitirão emendas. É nesse vespeiro que o governo quer mexer. Para agilizar o debate, pretende pegar carona num projeto de lei complementar em tramitação, de autoria do ex-ministro pefelista Waldeck Ornelas. Na linguagem legislativa, seria oferecido um "substitutivo" ao projeto.

Orçamento impositivo
A mudança na cultura orçamentária exigiria um compromisso público do governo com o chamado orçamento impositivo. Pela primeira vez, como ministro, Paulo Bernardo defende abertamente a proposta que ajudou a elaborar quando era deputado. "Devemos trabalhar com o conceito de orçamento impositivo. Sou a favor, mas acho que precisa haver implantação gradativa. O orçamento impositivo poderia ser feito em quatro ou seis anos."
Tramita no Senado a proposta de emenda constitucional para tornar o orçamento impositivo. Atualmente, o orçamento é autorizativo, ou seja, depende do Executivo o fluxo de liberação de recursos. É a União que decide qual o ritmo de liberação das emendas dos parlamentares, por exemplo, o que acaba fazendo das emendas uma moeda de troca.
O orçamento impositivo torna a execução orçamentária obrigatória. As verbas têm que ser de fato liberadas. Se isso não ocorrer, o governo é acusado de crime de responsabilidade.
Admitindo-se assustado com a dimensão da máfia dos sanguessugas, Bernardo afirma que não basta mudar a lei orçamentária. "Deveríamos ter uma mudança no instituto da imunidade parlamentar. Não tem que ter foro privilegiado", diz. O ministro não vê "a menor possibilidade" de o Congresso votar processos de cassações de mais de cem parlamentares. Acha que tudo deveria ser julgado pela Justiça comum.


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