São Paulo, terça-feira, 31 de janeiro de 2006

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Ação política sobre Petrobras é criticada

LUCIANA BRAFMAN
DA SUCURSAL DO RIO

Uma eventual interferência política em decisões técnicas da Petrobras é algo que preocupa e divide especialistas, muito mais do que o uso dos resultados da empresa como propaganda de realizações do governo de Luiz Inácio Lula da Silva.
Como a Folha informou ontem, o presidente pretende usar o alcance da auto-suficiência do país em produção de petróleo como argumento eleitoral.
Para especialistas ouvidos pela Folha, decisões estratégicas da Petrobras, como a definição dos preços da gasolina ou acordos firmados com a estatal venezuelana de petróleo, a PDVSA, foram tomadas em função de interesses políticos do governo.
"Trabalhei 33 anos na Petrobras. Sempre houve interferência política nas decisões da empresa. Os gerentes técnicos sofrem de um trauma: não sabem se são empresa ou governo. Mas no governo Lula, isso aumentou muito. Estamos retornando aos velhos tempos do controle estatal. É um retrocesso", afirma Giuseppe Bacoccoli, professor da UFRJ/Coppe, que já foi gerente de exploração da estatal e saiu de lá em 1997.
A recente decisão da Petrobras de escolher Santos como local da unidade de negócios que vai gerenciar a produção da Bacia de Santos também gerou polêmica. Para alguns especialistas, o determinante da escolha foi a variável política, devido a pressão de entidades de classe paulistas. A Petrobras, dirigida pelo petista José Sérgio Gabrielli, teria optado por Santos como forma de fortalecer Lula e o PT em São Paulo.
A interferência política foi admitida pelo próprio Lula em 16 de dezembro. Em solenidade que marcou o início da construção de uma nova refinaria da Petrobras, Lula afirmou que inicialmente não havia o interesse em construí-la, mas que interferiu no assunto: "Eu disse ao meu companheiro José Eduardo Dutra [ex-presidente da Petrobras], antes do José Sérgio Gabrielli chegar: a Petrobras é uma empresa que tem ações no mercado, tem sócios e, portanto, não é uma empresa em que o governo tenha o direito de dizer o que ela vai fazer a cada momento. Mas a Petrobras é tão importante para o Brasil, é tão significativa para o Brasil, que um projeto dessa magnitude não pode ser uma decisão apenas do interesse econômico-financeiro da Petrobras, mas uma decisão estratégica e política dos interesses e do desenvolvimento do Estado brasileiro".
O discurso foi feito na cerimônia de lançamento da pedra fundamental da refinaria de Pernambuco, um dos projetos mais criticados por especialistas como exemplo de predominância de estratégia política sobre decisões técnicas, de mercado.
A maioria dos acordos feitos entre as companhias brasileira e venezuelana é vista dessa forma. Isso porque a PDVSA é uma concorrente direta da Petrobras, produzindo o mesmo tipo de óleo para o mesmo mercado. "Empresarialmente, a refinaria de Pernambuco com a PDVSA não faz qualquer sentido", diz Adriano Pires, diretor do CBIE. "O interesse é apenas político."
Pires vê interferência política também nos preços dos derivados. Segundo ele, os de uso popular têm preços controlados ou menos voláteis. "O GLP [o gás de cozinha] nunca aumentou desde que Lula tomou posse. A gasolina e o diesel aumentaram sem seguir a lógica do mercado internacional. Já os derivados sem apelo popular, como querosene de aviação e nafta, tiveram altas periódicas."

Outro lado
O presidente da Petrobras disse à Folha, por e-mail, que não há interferência do governo nas decisões da companhia.
Gabrielli também defendeu as decisões sobre a política de preços, os acordos com a estatal venezuelana e a escolha da cidade de Santos como base para as atividades na Bacia de Santos.
" O acerto da política de preços da companhia pode ser avaliado pelos excelentes resultados financeiros obtidos", completou.
Em relação aos acordos com a PDVSA, Gabrielli afirmou que apresentam vantagem para a Petrobras e também para o Brasil.
Já sobre a escolha de Santos como base da bacia, apresentou razões técnicas, como a logística, pois o município se localiza geograficamente no meio da bacia.
A Secretaria de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica afirma que os resultados da empresa "têm relação direta com a supervisão ministerial da pasta competente".


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